Seis anos na estrada: casal viaja da Argentina ao Alasca de Kombi
Sair da cidade argentina de Ushuaia, considerada o 'fim do mundo', e ir até o Alasca é o grande objetivo de muitos viajantes que têm um motorhome.
Trata-se, afinal, de uma rota que conecta dois pontos extremos das Américas, cruzando dezenas de milhares de quilômetros e passando pelos mais diversos tipos de paisagens, das montanhas nevadas dos Andes a zonas desérticas do Peru, de regiões de selva da América Central a grandes cidades dos Estados Unidos.
No final de 2022, o casal brasileiro Roana Petri Celeste e Anderson Diego Strutz conseguiu completar, com um motorhome e na companhia de seu cachorrinho Zed, esse longo e desafiador percurso.
"Fizemos um intercâmbio em 2011 e isso abriu nossa mente para outras possibilidades de viagem", conta Roana. "Alguns anos após o intercâmbio, já com o Zed em nossas vidas, decidimos que um carro seria a melhor opção para viajar por aí".
Kombi transformada
O casal, então, transformou, com suas próprias mãos, uma Kombi de 1990 em um motorhome. Instalou no veículo cama, pia, fogão, geladeira, caixa d'água e espaços para guardar suas roupas e outros pertences.
"No primeiro momento, nosso objetivo era conhecer a América do Sul. Nunca tínhamos adotado esse estilo de vida e não sabíamos como iria ser. Se não fosse o que queríamos, a gente poderia fazer só países sul-americanos e depois voltar para casa", diz Roana.
Ela conta que começaram a viagem no dia 9 de janeiro de 2017 e levaram três meses para chegar a Ushuaia [no extremo sul da América do Sul]. "De lá decidimos continuar viajando. Foi aí que surgiu a ideia de ir até o Alasca".
Nesses seis anos de jornada, os brasileiros rodaram quase 100.000 km, chegando ao Alasca no final de 2022 —e atravessando, no caminho, Chile, Bolívia, Colômbia, Costa Rica, Nicarágua, El Salvador, Guatemala e México.
Durante todo esse tempo, viveram uma sequência de grandes experiências na estrada.
Paisagens incríveis, noites gratuitas
Durante a viagem, Roana e Diego ficaram encantados com a grandiosidade das paisagens naturais das Américas. Eles atravessaram a Patagônia, visitaram praias e vulcões na América Central e se viram imersos no Grand Canyon, nos Estados Unidos.
Uma das experiências mais marcantes para nós foi subir o vulcão Acatenango, na Guatemala. Também conseguimos dormir de frente para o vulcão. Outro momento surreal ocorreu neste ano, no Alasca, quando vimos a aurora boreal. Foi algo emocionante.
Roana Petri
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Quero receberCom o motorhome, o casal e seu cachorrinho Zed conseguiram ter um dia a dia econômico e com contato muito próximo com as belezas da rota.
"Desde o começo, buscamos lugares gratuitos para dormir, evitando campings, que seriam um custo alto para uma viagem tão longa", explica Diego. "Dormimos sempre dentro do nosso veículo, estacionados na frente da casa de pessoas conhecidas, em praças, em ruas residenciais, em postos de combustíveis e estacionamentos de supermercados. E, sempre que possível, passamos a noite no meio da natureza. Já dormimos na beira de lagos, perto de cachoeiras e ao lado de praias".
Motorhome foi de contêiner
A viagem pelas Américas, no entanto, apresentou muitos desafios. A travessia entre a Colômbia e o Panamá, por exemplo, não pôde ser feita pela estrada —pois existe, na área, uma região de selva perigosa e impenetrável para carros, chamada Tapón del Darién.
Nesta parte do percurso, o casal teve que colocar seu motorhome em um contêiner para mandá-lo da Colômbia ao Panamá com uma embarcação, o que envolveu muita burocracia e muitos gastos. Além disso, os brasileiros enfrentaram períodos de frio intenso no trajeto.
"Com a Kombi, passamos por temperaturas de menos 10°C. Não tínhamos aquecedor, nossa caixa d'água congelava e tínhamos que passar a noite dentro de sacos de dormir", relata Roana.
Como toda viagem longa, eles também relatam ter enfrentado desafios diários, como mudanças súbitas de roteiro por causa de uma estrada fechada, carro quebrado e dificuldade para encontrar a peça necessária para o reparo, mudanças drásticas de clima.
E nem sempre é fácil conciliar a melhor época do ano para conhecer cada local e achar lugares seguros para dormir na rua todas as noites. E isso sem falar na saudade da nossa família.
Roana Petri
A perda de dois amigos
Em 2022, já nos Estados Unidos, Roana e Diego decidiram mudar de casa e comprar um novo motorhome. Queriam um veículo com mais espaço e conforto, com a possibilidade de trocar de roupa em pé, cozinhar em pé e ter um chuveiro dentro.
"Na Kombi, o chuveiro era fora. E chegamos a tomar banho em temperaturas negativas, então compramos um ônibus escolar americano e montamos nossa casa dentro dele", conta Diego. "Viajamos dois meses com o ônibus, mas vimos que ele era muito grande para nós, em abril deste ano decidimos comprar uma van. E ela segue sendo nossa casa nos dias de hoje".
Pouco tempo depois, porém, o casal viveu o momento mais difícil da viagem (e um dos momentos mais difíceis de suas vidas). Em maio deste ano, os dois estavam a poucos metros do viajante e influenciador brasileiro Jesse Koz e seu cachorro Shurastey quando ambos morreram em um acidente com seu carro (um Fusca convertido em motorhome) em uma rodovia do Oregon, nos Estados Unidos.
Roana e Diego eram amigos de Jesse e Shurastey, tinham se encontrado com eles nos Estados Unidos e estavam viajando juntos rumo ao Alasca.
Ainda é muito difícil falar sobre a partida do Jesse e do Shurastey. A gente tinha uma amizade muito bonita, o luto ainda está aqui, assim como a saudade e a tristeza. Jesse sempre foi muito positivo, verdadeiro, sempre vibrou com as nossas conquistas. E o Shurastey era um cão maravilhoso.
Roana Petri
Mesmo abalado com a morte de seus amigos, o casal decidiu seguir viagem, inclusive para a honrar a memória de Jesse, que sonhava em chegar ao Alasca com seu Fusca. "Decidimos seguir na estrada por eles e por nós também. Vivendo um dia de cada vez, respeitando nosso tempo e honrando a memória deles e tudo que vivemos juntos."
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