Como é visitar a escada usada por Jesus, em Roma: 'Encontrei meu amor'
Rosa María, 45, subiu as escadas de joelhos e com os olhos marejados. A cada degrau, pausava por alguns instantes, inclinava a cabeça e beijava o piso com devoção. Não era uma escadaria qualquer: segundo a tradição católica, Jesus Cristo teria percorrido o mesmo caminho no dia em que foi condenado à morte.
A chamada "Scala Sancta" (Escada Santa) é um ponto turístico menos conhecido em Roma, mas atrai centenas de milhares de peregrinos todos os anos. Acredita-se que Jesus subiu os degraus de mármore para seu julgamento perante o governador romano Pôncio Pilatos.
A escadaria fica perto da Basílica de São João de Latrão, a mais antiga basílica do ocidente. De acordo com a tradição, os 28 degraus foram transportados de Jerusalém para Roma em 326 d.C, a pedido de Santa Helena, mãe do imperador romano Constantino, depois de ela ter se convertido ao cristianismo.
Encontrar essa escada em Roma é como encontrar um pedacinho da terra onde Jesus viveu, diz Rosa María, que visitou o local pela primeira vez no último dia 29 de março.
Rosa fazia parte de um grupo de 90 peregrinos mexicanos que aguardavam pacientemente a longa fila para subir as escadas naquela sexta-feira da Paixão. "Um dos países que estavam no nosso plano de peregrinação era Jerusalém, mas a viagem foi cancelada por causa da guerra", diz ela. "Então, encontrar essa escada é muito especial".
A escalada de joelhos é uma devoção muito popular entre fiéis e já foi realizada por diversos papas. "É uma forma concreta de experimentar o contato com o sagrado e sentir o que Jesus sentiu em seu coração enquanto subia para ser julgado por Pôncio Pilatos", diz reitor do santuário, Marco Staffolani. A entrada é gratuita.
Sangue de Jesus, moedas e ex-capela papal: o que há na escada santa
Os 28 andares da escada santa são de mármore, mas estão cobertos de madeira nogueira desde 1723, quando o Papa Inocêncio 13 ordenou que a escadaria fosse protegida dos danos causados pelos visitantes.
O reitor do local descreve o mármore como uma "pedra macia": quanto mais você coloca seus joelhos ou a ponta dos sapatos no mármore original, a pedra vai ficando menos plana e pode encurvar.
Quem visitou a escadaria entre 17 de abril e 9 de junho de 2019, porém, encontrou os degraus sem proteção pela primeira vez em quase três séculos. Naquele período, a escada de mármore foi exposta temporariamente depois de passar por limpeza e restauração.
"Tivemos que remover a cobertura de madeira para limpar a escada, porque as pessoas costumavam colocar coisas no vão entre o mármore e a madeira", conta o reitor.
Além de sujeira, foram encontrados milhares de objetos, incluindo moedas, fotos, orações escritas à mão, rosários "e muitas outras coisas", diz ele.
Afrescos do século 16 no teto e nas paredes também foram restaurados. As imagens ilustram passagens bíblicas sobre a vida de Jesus e seu calvário.
Segundo a tradição, há quatro gotas do sangue de Cristo na escadaria: três estão cobertas de uma cruz (uma de pórfiro vermelho e duas de bronze), e a quarta é protegida por uma grade de metal —área desgastada até um buraco profundo, porque milhares de fiéis tocaram naquele ponto.
É difícil de enxergar, mas acredita-se que estes 'red spots' (pontos vermelhos, em tradução literal) sejam gotas do sangue de Jesus que caíram ao longo de sua subida, afirma o padre.
No topo da escada, há ainda uma pequena igreja. Durante a Idade Média, ela era conhecida como a capela papal, ou seja, o lugar onde os papas se dirigiam para rezar. Atualmente, o local não é mais exclusivo dos pontífices, mas fica fechado em dias de muito movimento, como na Semana Santa. É aberto para visitação em dias comuns.
Encontrar um amor, fim da guerra: o que pedem os peregrinos
"Vim aqui pela primeira vez à espera de um milagre", conta Bella, 43, poucos minutos depois de ter subido a Escada Santa de joelhos pela 4ª vez em sua vida.
A filipina mora em Roma há 12 anos, e conta que sobe a escadaria desde 2020 toda Sexta-feira da Paixão. Ela é formada em Turismo, mas atua como funcionária da limpeza em um estabelecimento próximo ao santuário.
Enquanto subo os degraus, sempre peço a Deus por minha família e futuro, mas costumava pedir especialmente pela minha vida amorosa, diz ela.
Faz quatro anos que Bella se casou com quem descreve ser o "amor de sua vida". Para ela, o encontro não foi mera coincidência: tem relação com sua fé —especialmente com o pedido que fez durante as peregrinações na Escada Santa. "Um grande amor não é algo fácil de se encontrar".
A prece de Regina Vasques, 18, também tem relação com o amor, mas é de uma natureza diferente: "Quero pedir que aumente o meu desejo de receber a Eucaristia e sentir mais amor a Jesus", diz a mexicana, enquanto aguarda na fila para conhecer o santuário.
Elena Spinoza, 28, está no mesmo grupo de peregrinos de Regina, mas diz que não sabe exatamente o que vai pedir.
Acho que não vim tanto com o pensamento de pedir coisas, mas, sim, para agradecer a Deus.
É a segunda vez que Marta Imelda, 65, vem à escadaria. "Desta vez, venho especialmente para pedir paz para o mundo e pelo fim das guerras", afirma ela, sendo ressoada por seu marido, Marcos: "É o suficiente para mim".
Alguns cientistas ainda têm dúvidas se a escada é mesmo a de Jerusalém da época de Jesus, mas isso não abala a fé dos peregrinos: segundo Staffolani, em dias comuns, a Escada Santa recebe de 2.000 a 3.000 pessoas. Já na semana Santa, o número sobe pra 10 mil visitantes por dia.