Ele fundou a Flórida, e Miami quase teve seu nome: conheça Henry Flagler
O estado da Flórida (EUA) que conhecemos hoje não existiria se não fosse por um homem ambicioso e com faro para os negócios: Henry Flagler. Discreto, pouco se ouve falar em seu nome, mas suas ideias fizeram toda a diferença para a região.
Nascido em uma família pobre, em 1830, filho de um pequeno fazendeiro, Henry Flagler saiu de casa aos 14 anos para não dar mais despesas para a sua família - algo comum na época. Ele trocou o interior de Nova York, onde vivia com os pais, para o estado de Ohio, para morar e trabalhar com seus avós.
Seus avós eram lojistas e tinham uma vendinha, onde comercializavam um pouco de tudo. Seu salário era de cinco dólares por mês, mas seu espírito empreendedor o fazia pensar bem na maneira em que investiria esse dinheiro, sempre em busca de novos negócios.
Com 30 anos, ele era um vendedor de grãos e foi trabalhar com John D. Rockefeller, um nome muito mais conhecido na história dos Estados Unidos. Por 10 anos, eles venderam grãos pelo país em parceria, antes de criarem uma empresa que mudaria para sempre suas vidas.
Investimento nos lugares certos
Em janeiro de 1870, John D. Rockefeller fundou a Standard Oil, a maior empresa de petróleo da história. Flagler era um de seus sócios nessa empreitada. Os estados de Ohio e Pensilvânia estavam cheios de petróleo e apesar de naquele momento o produto não ter tanta utilidade - já que era usado essencialmente para fazer querosene para as luminárias - eles investiram no mercado.
A empreitada deu certo. Em 10 anos, John D. Rockefeller foi considerado o homem mais rico do mundo. Flagler ocupava o quinto lugar na lista. E como os Estados Unidos estavam enfrentando as mudanças causadas pela Revolução Industrial, criou-se diversos novos usos para os derivados do petróleo.
Com 50 anos e multimilionário, Flagler resolve se "aposentar" pelo bem da saúde de sua primeira esposa: ele se afastaria dos negócios da Standard Oil e se mudaria para a Flórida. Com suspeita de tuberculose, os médicos pediram que ela passasse os invernos em locais mais quentes.
Flagler nunca tinha visitado a Flórida. Sua primeira visita foi a uma cidade localizada ao norte do estado, Saint Augustine, o local habitado mais antigo da América. Ele adorou o clima, mas ficou muito decepcionado com a qualidade dos hoteis e com as estradas.
Infelizmente, sua primeira esposa faleceu rapidamente. Nem mesmo o calor da Flórida conseguiu proteger seus pulmões. Mas sua paixão pelo estado permaneceu.
Mudando a história da Flórida
Dois anos depois, ele se casa novamente e retorna à Flórida, determinado a construir o hotel que gostaria de ficar e melhorar as estradas do lugar. Flagler começa essa empreitada em Saint Augustine e, aos poucos, compra pedaços de estrada e as melhora até a parte mais ao sul do estado.
Em 1896, construiu seu primeiro hotel, o Royal Ponce Hotel, em Palm Beach. Ele era considerado o maior hotel e edifício de madeira do mundo. Mas Flagler ainda não tinha chegado ao sul do estado e tinham empresários interessados em que suas estradas crescessem ainda mais.
A empreendedora Julia DeForest Tuttle o convidou a levar as rodovias mais modernas até suas terras, chamada Fort Dallas. Foram necessárias muitas tentativas para convencê-lo - de cartas até visitas presenciais. Ela ofereceu metade do que tinha, em busca de melhorar seus negócios, para que ele aumentasse a rodovia. Ele topou.
Gratos pela decisão de Flagler, moradores do local ofereceram mudar o nome da cidade e chamá-la de "Flagler City". Discreto, ele recusou. Decidiu nomeá-la Miami.
A loucura de Flagler
Em 1907, o governo americano decidiu que constituiria o Canal do Panamá. Ligado na oportunidade de negócio, Flagler resolveu estender sua rodovia até Key West - ponto mais próximo do canal. O que causou uma grande polêmica.
Seria necessário construir uma ponte em cima do mar, o que todos acreditavam ser uma loucura. Por isso, esse projeto ficou conhecido como "O erro de Flagler". Ninguém acreditava que daria certo.
Entre 1905 e 1912 cerca de 4 mil trabalhadores deram sua força e suor para construir a Overseas Railroad. Mais de 100 deles morreram por conta de furacões que atingiram o local na época da construção. Mas deu certo! Flagler inaugurou sua estrada em uma festa para milhares de pessoas, em busca de calar todos aqueles que o criticaram.
A vida em família
A segunda esposa de Flagler, Mary Lily, pediu de presente de casamento uma pequena casa branca que recebesse uma brisa do mar. Mas ele, contudo, construiu uma mansão, em apenas um ano e meio.
Flagler contratou dois jovens arquitetos, John Carrère e Thomas Hastings, os mesmos que fizeram os designs de seu hotel, para desenvolver o projeto de sua nova casa. Ele trouxe o mármore da Itália, os lustres da França e usaram algumas técnicas para que a construção ficasse pronta rápido: em vez de madeira esculpida, por exemplo, foram usados moldes de plástico pintados, que davam a impressão de que foram feitos por artistas.
Flagler e Mary se mudaram em 1902. Como surpresa, ele construiu uma sala de música para a esposa, que era uma ótima pianista. E mais: contratou um especialista em órgão, Russell Joy, para trabalhar e morar com eles. Sua função: tocar sempre que Mary quisesse ouvir.
A relação dos dois durou um pouco mais de uma década, já que em 1913, aos 83 anos, Henry Flagler morreu. Mary Lily viveu mais quatro anos, e voltou a casa em Palm Beach apenas uma vez antes de falecer em 1917. Sem filhos, a herança ficou para sua sobrinha, Louise Clisby Wise Lewis.
Louise cuidou da casa até 1924, quando os custos ficaram muito altos para mantê-la. Por isso, vendeu a propriedade para empreendedores de Miami, que a transformaram em um hotel, construindo um pedaço a mais nos fundos do terreno.
O WhiteHall Hotel funcionou de 1925 a 1959. Tinha 300 quartos e recebeu diversas celebridades, como Walt Disney e presidentes. Na década 1960, os negócios começaram a ficar fracos, já que as pessoas que tinham dinheiro estavam construindo as suas próprias casas na Flórida. Não precisavam mais de hoteis.
Para sempre na família
Mary e Flagler nunca tiveram filhos, mas isso não quer dizer que o milionário não tinha herdeiros. Harry Flagler foi fruto de seu primeiro casamento. Ele chegou a trabalhar nas empresas do pai, mas não gostava da Flórida. Achava um lugar sem cultura. Então abandonou tudo e ficou sem falar com o pai por 30 anos. Henry morreu sem sequer conhecer sua neta, Jean Flagler Matthews.
Ela morava em Palm Beach quando os negócios do hotel começaram a dar errado. Com medo que a casa e o legado do avô que nunca conheceu fosse demolido, ela comprou o WhiteHall Hotel por US$ 2.5 milhões de dólares e criou a organização privada que mantém, até hoje, o Museu Henry Flagler.
Jean cuidou da empresa por 20 anos, até seu falecimento. E é por conta da tenacidade e amor pela história da família que ela tinha que até hoje tantos detalhes sobre a criação da Flórida são preservados.
O museu existe até hoje e fica em Palm Beach. Ele preserva a casa principal de Henry e Mary e a mantém quase exatamente como era quando foi construída. Quem trabalha lá, costuma brincar que, se um dia Flagler passar novamente pela porta ficará orgulhoso de saber que pouco mudou.
Se estiver pela região, a visita é indispensável.
*A reportagem viajou a convite da Discover The Palm Beaches