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OPINIÃO

Arroz com ovo e frango com farofa: como é o menu do D.O.M de Alex Atala

Os snacks do menu de 25 anos do D.O.M Imagem: Sergio Coimbra/Studio SC

Editora de Nossa

14/09/2024 12h00

Celebrado no Brasil e fora dele, o restaurante D.O.M é sinônimo de Alex Atala e ninguém tasca. Porém, em comemoração aos 25 anos da casa, o "chefão" lança seu novo menu com um papel diferente.

"Não fiz esse menu. Eu ouvi esse menu", conta Alex, que conta que seu time revelou as ideias logo após a reabertura do D.O.M depois da pandemia, em que os rumos do futuro do restaurante estavam pouco claros até mesmo para ele.

Na apresentação à imprensa dos novos pratos e da narrativa gastronômica - as "Façanhas de um Festim Prateado" - inspirada no sertão e na vida, obra e movimento de Ariano Suassuna, se destacam nordestinos e fiéis escudeiros de Alex: o subchefs Geovane Carneiro e o sommelier Luciano Freitas.

Romário Rodrigues, de Trancoso, outro braço-direito de Alex na cozinha, estava em férias na ocasião, mas tem presença inegável na elaboração do menu emocionado e foi citado por Atala como um possível sucessor em entrevista do chef a Nossa.

Geovane Carneiro e Romário Rodrigues, subchefs do D.O.M Imagem: André Lessa

Menos acostumados com os holofotes que o chefe, eles revelam, quase sem querer, os bastidores dessa viagem ao sertão que, apesar de já bastante explorado na gastronomia brasileira, ainda encontra surpresas no dois estrelas Michelin.

Cordel funk

Um dos bons sustos está no abre-alas. Uma ode ao caju é iniciada com a bala Cajuína Amiga, que explode na boca, deitada sobre castanha de caju assada e Aluá, uma espécie de refrigerante natural - receita nada fácil, apesar da simplicidade, dizem.

Bala Cajuína Amiga, do menu de 25 anos do D.O.M Imagem: Sergio Coimbra/Studio SC

Nos snacks, releituras saborosas do livro culinário de Ana Rita, prima de Ariano, ao lado de batata-doce e queijo coalho, manjuba com fubá e carne de fumeiro e mandioca, chama muito a atenção a galinha de comboeiro. Para melar as mãos, é o pó comestível de ouro que "enfarofa" a carne tenra.

Mas não está somente no prato a importância do petisco. Feita bem à moda das marmitas de desbravadores do sertão, gente da lida e migrantes nordestinos, ela resgata memórias timidamente relatadas por Geovane e harmonizadas com desenvoltura por Ceará.

Afinal, essa é a história dos dois.

Geovane Carneiro, subchef do D.O.M Imagem: André Lessa

Aos 49 anos, mais de 30 deles em São Paulo, Geovane deixa quase sumir a voz de emoção ao lembrar de pratos e ingredientes da infância em tempos menos fartos. Nascido em Conceição do Coité, a 110 km de Feira de Santana, ele fugiu de seca intensa na Bahia e está no D.O.M desde o começo, em 1999.

Já Luciano, há apenas quatro anos como titular dos vinhos na casa e com 36 anos, é falante, ligeiro e conquista com a agilidade de um repentista. Foi essa destreza evidente, aliás, que o levou a uma ascensão meteórica: em SP chegou como faxineiro, conquistou os salões e, já no D.O.M, ficou atento às lições de Gabriela Montaleone até decorar os rótulos.

Luciano Freitas, sommelier do D.O.M Imagem: André Lessa

Formado sommelier não se destaca somente com suas escolhas, mas também como as apresenta.

Felizmente, a sisudez esperada de um estrelado Michelin não se encontra mais à mesa - nem nos banheiros, onde ecoa a voz de Ariano, o "muso inspirador", em discursos e até musicada em funk.

Arribações de vinho fresco

Arroz com ovo do menu de 25 anos do D.O.M Imagem: Sergio Coimbra/Studio SC

Saem a elegante pasta de jabá com jerimum e o "raiz" arroz com ovo, que no D.O.M. ganha os grãos vermelhos do Vale do Piancó (Paraíba), creme de queijo sertão, cubos de queijo manteiga, cebola frita crocante e gema cremosa.

Vem o feijão andu e mocotó (outra lembrança emotiva de Geovane cochichada entre os comensais), feito para "chuchar" com beiju de mandioca e trufa do sertão - a nossa rapadura - devidamente ralada por Alex e que ganha harmonização do Pinot Noir NV, da gaúcha Valparaíso.

Este, aliás, é um dos vinhos exclusivos para o aniversário do restaurante ao lado do Gran Cata Alvarinho 2022 da catarinense Cata Terroirs e do Chardonnay 2022, da Vinhas do Tempo, da Serra Gaúcha.

Luciano Freitas, sommelier do D.O.M Imagem: André Lessa

A seleção é de responsabilidade de Ceará, que para o aniversário de 25 anos, enfatiza a prioridade para os bons vinhos gaúchos - além dos dois já citados ainda entram Blanc de Noir 2023, da Vivente de Colinas, como um carinho às vinhas que viram tragédia de enchentes no começo do ano.

Mas como se olha para Brasil e só Brasil, também cabem as produções brilhantes vindas do Vale do São Francisco (Tropical Moscatel, da Terranova), Chapada Diamantina (Cordel 2020, da Uvva) e São Roque (Soleira Niágara 10 Anos, da Bellaquinta).

Piraburu do menu de 25 anos do D.O.M Imagem: Sergio Coimbra/Studio SC

O menu segue com pirarubu de peixe - técnica kayapó de preparo de proteína em fogo alto envolvida na folha de bananeira e segue com mais lembranças do nordeste - devidamente "sapecado" por Atala à mesa.

Na etapa seguinte, mais um motivo para arregalar o olhar. Na ausência das aves de arribação (aves migratórias tradicionalmente caçadas, secas e armazenadas pelos sertanejos) - como a avoante descrita pela chef Irina Cordeiro, que também provava o menu, de Ceará e do ainda emocionado Geovane -, Alex optou pela codorna com o tradicional flocão de milho.

Em seguida, fatias de couve, desinteressante para muitos, como enfatiza Alex, se entremeia e envolve finas fatias de lardo e recebe um banho de caldo de carne de cabrito, numa inversão de papeis - o vegetal protagoniza.

Acabou o sal, que venha o doce

Para limpar o paladar - mas nada coadjuvante -, doce de feijão de corda com gelado de melão e picles de maxixe, que simboliza um mergulho no São Francisco e a fertilidade do vale do "rio que nunca seca". "Sabia que importamos o melhor melão do mundo?", contam.

A sobremesa Mata Branca (a tradução de Caatinga), quer lembrar o arroz doce, mas com bacuri e coco verde e uma espécie de show de fumaça branca, supera o doce afetivo de muitos brasileiros. Este também é o caso do pudim de tapioca com cajá, que surge em pratinhos com cara de casa de vó.

Pudim de tapioca com cajá, do D.O.M Imagem: Juliana Simon/UOL

O cafezinho coado, servido em taças (com a nobreza que exige, convenhamos), é acompanhado de uma seleção de bolos nordestinos dispostos em folhas secas enormes do jardim da casa de Alex: biscoito de bolo de rolo, bolo de noiva e o Souza Leão.

Seleção de bolos (um deles com formiga), do D.O.M Imagem: Juliana Simon/UOL

Um deles, sempre alternados entre os entes da mesa, com uma gorda formiga "de comer", como as mesas ansiosas do salão recém-reformado aguardam - "seja para experimentar, rejeitar ou espiar o do outro e pedir também", como descreve Alex.

Ambiente do D.O.M Imagem: André Lessa

Para quem quiser conhecer a versão sertaneja do D.O.M, os preços vão de R$ 760 o menu-degustação à versão dele com caviar e harmonização a R$ 1.450.

Serviço

D.O.M
Rua Barão de Capanema, 549, Jardins
Tel.: (11) 3088-0761
Segunda a sexta, das 12h às 15h e das 19h às 21h
Sábado, das 19h às 21h

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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