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'Jesus é Deus': mosaico de templo cristão mais antigo é exposto pela 1ª vez

Mosaico de Megido, achado do mais antigo templo cristão de que se tem notícia, em Israel Imagem: Reprodução/Museum of the Bible

Colaboração para Nossa

25/12/2024 05h30

O Mosaico de Megido, mais antiga relíquia de um templo cristão, finalmente deixou Israel pela primeira vez para ser exposto ao público.

Após muita polêmica, a peça se encontra no Museum of the Bible (Museu da Bíblia, em tradução livre) na capital americana, Washington, até 6 de julho de 2025, quando deve retornar para as mãos dos estudiosos da Autoridade de Antiguidades de Israel (IAA, na sigla original).

O achado e sua ligação com o fim dos tempos

O mosaico foi encontrado por arqueólogos da IAA em 2005, durante uma escavação preventiva em Megido, em Israel, para determinar se não havia nenhum material histórico na área que impedia a ampliação de uma prisão.

Estudiosos estimam que a obra tenha sido criada no século 3 ou 4 depois de Cristo para a mais antiga sala de oração dedicada à fé cristã de que se tem notícia.

Na época, a região do Vale de Jezrael — onde fica o Monte Megido — era ocupada pelos romanos e alguns destes oficiais teriam encomendado a construção, provavelmente de maneira clandestina, o que oferece pistas sobre como o cristianismo foi professado no seu início.

Mosaico de Megido em perspectiva Imagem: Reprodução/Museum of the Bible

Outros materiais foram descobertos no sítio arqueológico, como cerâmicas e moedas. Por isso, a IAA estimou à época do achado que a igreja tivesse sido construída no ano 230.

No entanto, o local pode ter sido abandonado por volta do ano 305, no século seguinte, quando o mosaico deve ter sido coberto — esta linha do tempo é consistente com a perseguição imposta aos cristãos pelo imperador romano Diocleciano.

O vale é significativo ainda por uma outra razão, presente no livro do Apocalipse. É ali que acontecerá a Batalha do Juízo Final, de acordo com o capítulo 16.

Vi sair da boca do Dragão, da boca da Fera e da boca do falso profeta três espíritos imundos semelhantes a rãs; são os espíritos de demônios que realizam prodígios, e vão ter com os reis de toda a terra, a fim de reuni-los para a batalha do Grande Dia do Deus Dominador. (Eis que venho como um ladrão! Feliz aquele que vigia e guarda as suas vestes para que não ande nu, ostentando a sua vergonha!). Eles os reuniram num lugar chamado em hebraico Har-Magedon.

Apocalipse 16:13-16

A origem da palavra Armagedom, que se tem hoje como sinônimo de fim dos tempos, é justamente esta: a expressão hebraica Har Meggido, ou "sobre o Monte Megido", cuja grafia foi modificada ao longo dos séculos.

Admissão preciosa para os cristãos

O mosaico, contudo, apresenta uma confissão — ou profissão de fé — ainda mais preciosa para os cristãos. É nesta imagem que está o mais antigo reconhecimento de Jesus como Deus encarnado, através de um peixe, o primeiro símbolo cristão — já que historiadores acreditam que a veneração da cruz e do crucifixo só tenha sido institucionalizada a partir da conversão dos romanos em 313 d.C. por Constantino.

O peixe, na verdade, era uma espécie de código, um acrônimo ou sigla para "Iesous Christos Theou Yios Soter" ou "Jesus Cristo, Filho de Deus, Salvador".

A imagem também é uma forte referência à passagem do Evangelho de São Lucas (9:16) em que Jesus alimenta cinco mil pessoas com dois peixes e cinco pães que ele multiplica para atender à multidão. Eles estão dispostos sobre uma mesa, que pode reverenciar a Última Ceia.

Sobre o ícone, é possível ainda ler inscrições que dão conta da autoria do mosaico:

Gaianus, também chamado Porfírio, centurião, nosso irmão, fez este mosaico às suas próprias custas como um ato de generosidade. Brutius conduziu o trabalho.

Segundo os curadores da mostra no Museu da Bíblia, o uso apenas do primeiro nome em latim e do nome de origem do centurião não só indica sua origem nas províncias orientais, como o fato de que ele encomendou a arte em caráter pessoal — possivelmente devido à sua própria fé, e não em serviço de autoridades romanas.

Apesar do uso da palavra "irmão", forma de tratamento utilizada pelos cristãos há milênios, pesquisadores não garantem que Gaianus tenha sido definitivamente um cristão.

Já Brutius teria sido o artista a quem o centurião encomendou a peça e, dado que ele assinou o mosaico — raramente os romanos o faziam — é possível que ele tivesse sido um "tessellarius" altamente habilidoso, tipo de mosaicista que finalizava o trabalho.

"Amante de Deus"

A amante de Deus Akeptous ofereceu doar a mesa a Deus Jesus Cristo como memorial.

No centro do mosaico encontra-se uma antiga mesa e outra mensagem é clara: uma mulher de fé chamada Akeptous doou a peça que pode ter sido usada para as primeiras celebrações da Eucaristia, como católicos (romanos ou ortodoxos) e alguns protestantes como os anglicanos ainda o fazem até hoje.

É possível que ela tenha sido uma mulher de boa condição financeira e/ou posição social.

Detalhe do agradecimento pelo Mosaico de Megido a uma rica mulher da comunidade Imagem: Reprodução/Museum of the Bible

Lembrem-se de Primilla e Cyriaca e Dorothea e, por último, Chreste.

Em vez de pedir que Deus se lembre destas quatro mulheres, o pedido no mosaico é feito à comunidade. No entanto, não há nenhuma outra menção a elas e não se sabe se elas teriam sido patronas ou mártires, por exemplo.

A polêmica ida aos EUA

Quando a possibilidade de que o Mosaico de Megido fosse emprestado aos EUA se tornou pública em agosto, estudiosos passaram a apontar preocupações e críticas na imprensa local.

Uma reportagem da agência Associated Press apontou que as autoridades israelenses pudessem ter interesse em estreitar laços com os cristãos evangélicos americanos para manter apoio político do país e o fluxo de dólares do turismo.

A escolha do museu também foi questionada, já que o Museu da Bíblia de Washington tem um controverso histórico de aquisições de obras. O jornal britânico Daily Mail já reportou que, desde 2017, o museu foi forçado a devolver milhares de artefatos (como uma tabuleta mesopotâmia) que haviam sido saqueados do Iraque.

O museu também já teve que admitir em 2020 que diversos de seus fragmentos de seus manuscritos do Mar Morto eram falsificações modernas. Na ocasião, o diretor do museu, Harry Hargrave, disse à imprensa que eles é que eram "vítimas de uma fraude".

O símbolo cristão do peixe, no centro do mosaico em destaque Imagem: Reprodução/Museum of the Bible

Cavan Concannon, professor de religião da Universidade do Sul da Califórnia, acusou o museu de agir como uma "máquina da Bíblia para a extrema-direita cristã e nacionalista" com ligações a "outras instituições que promovem formas de sionismo cristão e o nacionalismo cristão-evangélico e branco".

"Minha preocupação é que este mosaico perca o seu verdadeiro contexto histórico e receba um contexto ideológico que continue a ajudar o museu a contar sua própria história", lamentou.

Já Matthew Adams, diretor do The Center for the Mediterranean World (Centro para o Mundo Mediterrâneo), um instituto de pesquisa arqueológica sem fins lucrativos que está envolvida em escavações em Megido e no adjacente campo legionário romano de Legio, considerou "seriamente prematuro mover este mosaico".

Para ele, a remoção só poderia ser feita depois que toda a pesquisa acadêmica fosse concluída.

Mesmo assim, o Mosaico de Megido chegou aos EUA para a mostra "O Mosaico de Megido: Fundações da Fé" em setembro. Interessados em visitá-lo devem desembolsar US$ 29.99 (R$ 184) ou US$ 19.99 (R$ 122) para aqueles que têm entre 5 e 17 anos, menores até 4 anos não pagam. Mais informações estão disponíveis no museumofthebible.org.

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