Brasileiros reclamam de longas caminhadas e isolamento ao desembarcar na Alemanha
Basta colocar os pés na Alemanha, ao descer do avião, para sentir a diferença em relação aos desembarques no Brasil. O país não tem tanto rigor com as máscaras nas ruas e já começa a reabrir as escolas, mas adota medidas severas dentro do Aeroporto Internacional de Frankfurt. Os passageiros que chegam a esse que é o maior aeroporto da Alemanha percorrem uma rota onde não se esbarram facilmente com pessoas vindas de outros lugares. Na hora de recolher a bagagem, apenas uma esteira fica disponível para cada voo.
Tudo isso pode até passar despercebido para alguns, mas quem utiliza esse aeroporto com frequência, ou chegou do Brasil nos últimos dias, notou logo diferenças com o novo procedimento.
"Andei muito, mas muito mais do que o normal. Será que é por que viemos do Brasil?", questionou à comissária de bordo uma brasileira-alemã recém chegada de um voo de São Paulo. A passageira, moradora de uma cidade ao sul de Frankfurt, precisou passar pela capital financeira do euro após terminar um tratamento de saúde no Brasil. No longo percurso que fez dentro do prédio, comentários e reclamações semelhantes também eram realizados por outras pessoas, suadas de tanto caminharem.
"Pode parecer um absurdo fazer uma comparação, mas me lembra muito o período vivido pela Alemanha num passado muito recente e hoje retratado nos livros", comentou uma família vinda do Chile, com bebê no colo, após fazer escala em São Paulo antes de chegar a Frankfurt.
A reportagem da RFI também atestou o fato no local, em dois dias diferentes nas duas últimas semanas. Voos vindos do Brasil ficam em áreas sem passageiros. O recolhimento de bagagem também foi isolado com alternando as esteiras em funcionamento.
Os viajantes são separados por voo até o recolhimento de bagagens dentro dos terminais para diminuir o risco de contaminação por coronavírus. Testes que normalmente custam 170 euros são gratuitos para passageiros comprovadamente vindos em menos de 48 horas de locais considerados de alto risco, entre eles o Brasil.
Além do distanciamento e da necessidade de maior deslocamento dentro do prédio, a passageira, que pediu para não ser identificada, disse que o passaporte brasileiro não foi aceito no check-in em São Paulo, onde foi longo o questionário feito sobre como seria o percurso dela na Alemanha até alcançar seu destino final.
Ao chegar em Frankfurt, ela também passou por um protocolo mais longo que o normal, mesmo apresentando o passaporte alemão. Com o hábito de usar constantemente o terminal ainda no início da pandemia, a brasileira-alemã percebeu a diferença tão logo ao desembarcar, tendo que percorrer a pé uma grande distância entre a aeronave e o local de recolhimento de bagagens.
A diferença de tratamento valeria para todos devido à pandemia, segundo o Aeroporto de Frankfurt. A administração negou qualquer alteração que diferencie o protocolo apenas para brasileiros. Mas frisou as novas formas de conduta para quem chega de países considerados de altíssimo risco, como a medição de temperatura.
De acordo com Christian Engel, porta-voz de Infraestrutura do Aeroporto de Frankfurt, a logística de chegada dos passageiros foi otimizada de tal forma que, na melhor das hipóteses, os aviões podem estacionar diretamente no prédio onde vai ocorrer o desembarque.
"Devido a iniciativas como esta, a mistura de passageiros pode ser evitada", completa o porta voz. Ele ainda aponta que, para que as medidas tenham efeito, é importante que os viajantes ajam também por conta própria e respeitem as medidas para se proteger contra as infecções.
Controle rigoroso de documentos
A Alemanha está com novas medidas para entrada de brasileiros, mas a tendência é que as regras sejam revisadas a cada duas semanas. Só entram os cidadãos do Brasil que também tenham passaporte europeu, residência ou em casos especiais de urgência e trabalho.
"Eu já havia me munido dos documentos necessários antes de comprar a passagem e notei um maior controle já antes de embarcar no Brasil, fazendo o primeiro check-in. Demorei cerca de uma hora e meia, para algo que normalmente leva 10 minutos e quase tive minha viagem cancelada devido a tanto tempo no balcão antes de despachar as malas", desabafa um brasileiro que precisava viajar a Dresden, no leste da Alemanha, mas também teve Frankfurt como o aeroporto de chegada à Alemanha.
"Fui logo mostrando minha documentação que estava toda em alemão e explicando o motivo da viagem que era para meu casamento na Alemanha", completou.
A reportagem da RFI presenciou no local algumas diferenças também no tratamento: mais e novas perguntas direcionadas aos brasileiros sobre se destino na Alemanha, por exemplo. De fato, o Brasil não consta da lista de países dos quais é possível entrar sem restrições na Alemanha. Além da proibição de entrada para viajantes brasileiros, há uma série de controles.
A engenheira de produto para indústria do vestuário, Carla Carvalho Costa, vivenciou outro aspecto, passando pelo aeroporto de Frankfurt durante a pandemia. Carioca, também moradora de Berlim, ela detalha que as filas eram longas devido ao distanciamento de dois metros entre as pessoas e o terminal contava com um grande número de pessoas, pelos desembarques estarem concentrados apenas em um prédio.
"Na hora do controle, o policial federal viu os meus documentos, deu um telefonema, esperei um tempo e só depois fui liberada. Algo que jamais havia acontecido comigo", conta a brasileira, que tem cidadania europeia.
Apenas um dos complexos de terminais têm funcionado, já que o aeroporto vem trabalhando para evitar aglomerações. Somente uma esteira de bagagem é usada por voo, por exemplo.
"Isso ajuda a evitar a mistura de passageiros de outros voos. E para aeronaves que não param diretamente no prédio do terminal, os ônibus de transferência não são totalmente ocupados. Os aviões têm estacionado o mais próximo possível do terminal", exemplificou Engel.
Há uma semana, passageiros que entrarem na Alemanha, provenientes do país da América do Sul ou que tenham permanecido no Brasil nos 14 dias que antecederam a viagem, devem apresentar um teste negativo de SARS-CoV-2 na entrada ou fazer um exame ao chegarem. Entretanto, vale ressaltar que os diagnósticos realizados por farmácias ou institutos brasileiros não são reconhecidos na Alemanha. Na medida do possível, os passageiros que chegarem do Brasil deverão fazer o teste no respectivo ponto de entrada.
Falhas experimentadas por passageiros do Brasil
Brasileiros e outros passageiros provenientes do Brasil apontaram falta de esclarecimento sobre os exames de SARS-CoV-2, como a indicação do local onde podem ser realizados.
Para pessoas que desembarcam de países de risco, o teste é gratuito se realizado dentro de 48 horas depois da chegada. Entretanto, ainda que seja apontada como exemplo no combate à doença, a Alemanha apresenta falhas no gerenciamento de passageiros.
Brasileiros são considerados de altíssimo risco para o país. No entanto, os exames são realizados diariamente até às 15h. Os passageiros que chegam no voo vindo de São Paulo e que pousa diariamente às 17h em Frankfurt não são testados imediatamente. Eles precisam voltar no dia seguinte ao local para ter o diagnóstico realizado.
"Não havia informação clara, nem pessoas para informar onde buscar as malas, por exemplo. Então me deram um formulário para eu registrar a minha chegada e eu cumpri quarentena de 14 dias em casa", explica Carvalho Costa. Para ela, o voo foi até melhor porque a movimentação de pessoas na aeronave é reduzida e ocorre principalmente na hora das refeições.
Além disso, cada região da Alemanha tem regras diferentes para quarentena. O procedimento padrão é fazer o teste nas primeiras 48 horas após a chegada ao país, consultar um médico com atestado de boa saúde e fazer contatar autoridades locais responsáveis pelo gerenciamento da epidemia por e-mail ou telefone.
Qualquer pessoa que tenha estado no Brasil nos 14 dias que antecedem a entrada na Alemanha deve se registrar junto à autoridade sanitária local e informar o seu endereço de estadia. Cabe aos passageiros obter informações sobre o regulamento de quarentena a ser seguido de acordo com a região da Alemanha onde estiverem.
No destino final, ao terem que realizar o isolamento de 14 dias, os brasileiros contam com boa vontade de amigos e vizinhos. Carla diz que colou um bilhete na porta de entrada de seu apartamento pedindo que os vizinhos fizessem a gentileza de descer seu lixo, já que a recomendação do setor de saúde era para não sair de casa sob nenhum motivo.
"Depois da tensão da viagem, atitude das pessoas mais próximas valeram todo o trajeto feito e as horas intermináveis de voo. O estresse dentro do aeroporto é algo muito grande", conta um brasileiro que, ao chegar em casa, encontrou um pacote de legumes e frutas comprado por amigos para os primeiros dias da quarentena.
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