Mais caro e em crise de vendas, champanhe francês vê 'concorrentes' da Itália e Espanha crescerem
A inflação alta não poupou as vendas de champanhe em 2023, inclusive dentro da própria França, país que produz e exporta a bebida para o resto do mundo. O balanço revelado pelo Comitê Interprofissional do Vinho de Champagne apontou uma queda de 8,2% das vendas no ano passado, impactadas também pelo aumento do consumo de outros tipos de espumantes, fabricados no país ou em vizinhos europeus.
O espumante mais famoso do planeta, associado a momentos festivos e comemorações, ainda enfrenta os contratempos gerados pela pandemia de covid-19. Em 2020, o lockdown levou as vendas a despencarem 18%, mas retomaram com uma força igualmente anormal nos dois anos seguintes, com alta de 25% em 2021 e o recorde de 326 milhões de garrafas vendidas em 2022.
Após esses dois picos, o contexto inflacionário gerado pela guerra na Ucrânia levava o setor a já esperar um recuo na desempenho em 2023. O diagnóstico apontou para uma queda ainda maior que a projetada, conforme a nota divulgada pela principal entidade representante do setor. Foram 299 milhões de garrafas vendidas.
"Depois de três anos anormais, o champanhe volta ao nível de vendas de antes da crise sanitária. O mercado nacional sofre mais do que os mercados de exportação com os efeitos da inflação, que pressionaram o orçamento das famílias durante todo o ano", diz o comunicado. "A exportação de 172 milhões de garrafas ultrapassou o seu nível de 2019 (156 milhões de garrafas) e agora garante 57% do total de vendas, contra 45% há 10 anos."
Por que o champanhe é mais caro?
O setor festeja, entretanto, que o faturamento tenha se mantido estável, acima de 6 bilhões de euros - um efeito do aumento do preço das garrafas, que passaram de uma média de 20 euros a unidade para 23 euros.
"O champanhe tem custos de produção que são bastante elevados. Tem vários fatores que explicam, inclusive o preço do hectare de terra em Champagne, que é muito cara: 1 hectare de vinhedos custa cerca de 1 milhão de euros, enquanto no sul da França, em Languedoc, por exemplo, custa entre 20 e 30 mil euros", explica a sommelière brasileira Ana Carolina Dani, que atua na França e integra a Associação de Sommeliers de Paris.
"A colheita precisa ser obrigatoriamente manual, o que aumenta mais o custo. E neste contexto de alta dos preços, é um vinho que foi particularmente afetado: o processo de vinificação do champanhe é complexo e o uso de energia para resfriar as cubas de fermentação, por exemplo, é muito intenso - e a energia aumentou muito na França", complementa.
O preço ainda maior levou os consumidores mais atingidos pela inflação a experimentar alternativas ao champanhe, inclusive em momentos emblemáticos como o Natal. Assim, espumantes como o crémant de Alsácia ou da Borgonha, considerados os "primos pobres" do champanhe, ganharam um espaço de mercado francês.
Prosecco ganha espaço
Da mesma forma, o prosecco italiano - na esteira do sucesso do coquetel Spritz, que leva a bebida - e a cava espanhola também seduzem os consumidores, com seus preços no mínimo três vezes inferiores aos do champanhe.
"A diferença é muito alta. Para uma família de classe média francesa, num contexto de alta geral de preços, foi preciso apertar os cintos e optar por produtos mais essenciais. O consumidor acabou indo procurar opções mais baratas", salienta Dani.
"A Itália conseguiu fazer um marketing mundial do prosecco graças ao Spritz e o hoje este espumante está muito mais presente na mesa dos franceses do que há um ou dois anos atrás. E os espumantes nacionais também têm ganhado muito espaço. Muita gente hoje prefere beber um bom espumante do que um champanhe ruim."
As vendas de crémant da Alsácia registravam alta de 4,2% no período de um ano encerrado em outubro - e apesar do aumento do preço das garrafas nas prateleiras de supermercados e adegas.
Os dados de exportação do champanhe devem ser divulgados em março. Com pouco mais de 700 mil garrafas compradas em 2022, o Brasil não é um mercado importante para o setor, embora registre crescimento na última década. Na América latina, é o México que mais importa a bebida, com 3 milhões de garrafas.
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