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A vida em quatro quitinetes que esbanjam identidade no Edifício Copan, cartão-postal de São Paulo

Carol Scolforo Colaboração para Nossa Tuca Vieira/Folha Imagem

Pelas portarias do edifício mais famoso de São Paulo ouvem-se mais de 5 mil bom-dias todas as manhãs. São os donos de generosos apês de 210 m², mas também de quitinetes com enxutos 25 m². Decidimos abrir as portas de quatro dessas valentes que esbanjam identidade.

O cheiro de café foi irrecusável em nossa chegada. No térreo do edifício, a cafeteria famosa parecia um bom lugar para entrar no espírito do condomínio. Uma xícara, em pé mesmo, Copan-raiz. Depois do primeiro gole é que a gente vê a placa "Não aceitamos cartões", ri e comecei o dia indo ao banco sacar dinheiro. 1 x 0, Copan.

O restante do percurso por entre suas 72 lojas é sinuoso, instigante. Niemeyer foi mesmo genial ao traçar suas célebres "curvas livres e sensuais" para os 32 andares do Copan. Ainda hoje é o maior prédio residencial de concreto erguido no Brasil. Um gigante simpático. Até demais.

No sobe-e-desce de elevadores a gente entende a dimensão de morar nesse caleidoscópio vivo que concentra os estilos de vida de 5 mil pessoas em 1160 apartamentos. São famílias inteiras. Gente nova ou das antigas, que chegou logo na entrega, em 1966, e viu tudo. O glamour do começo, a decadência em 1980 e a retomada - dizem que o síndico usou até espingarda para despejar traficantes.

Após o caos, o Copan voltou à glória. É o endereço de famosos - veja Walério Araújo passar, diga olá à chef Janaína Rueda, do Dona Onça, no térreo - mas também de jovens seduzidos pelas linhas modernistas. Nesse caso, o endereço é certo: Bloco B. Concentram-se nele as quitinetes de 25 m² a 45 m², dependendo da curva do prédio. Vamos a elas.

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Floresta + cimento pink

Na vista dos janelões, o cinza-cinzento de São Paulo. Perto dos olhos, dentro dessa quitinete, uma florestinha particular dá boas-vindas. Mais adiante, a cozinha millenial pink: não, não estamos no Pinterest, mas no universo de 45 m² da Micha D'Angelo, arquiteta de 28 anos.

Para esse resultado, ela levou duas semanas de obra e mão na massa, ao lado do arquiteto e designer Paulo Biacchi. Ele é o mestre das boas soluções que otimizaram a quitinete com criatividade. Rendeu um tour divertido para mostrar as ideias baratas - repare no móvel da TV feito com blocos de concreto e concorde agora.

"Quando entrei, a luz foi o que vi de mais especial aqui. A claridade e o silêncio. Tudo isso me acalma", conta. O plano inicial era seguir com o apê branco mesmo. Mas cores e estampas encontraram seu caminho. Verde menta no banheiro. No quarto, a parede da cabeceira tem um recente desenho dela, com tons terrosos.

No home office, o papel de parede de poás trouxe graça. "As tonalidades têm a ver com meu humor. É bem subjetivo, mas é meu ânimo transposto. Pintei e fiquei tranquila", ri. A cozinha de 2m x 1,40m foi tomada por rosa. Nela cabe tudo, graças às prateleiras finas.

O artesanato aparece e dá força à urban jungle. É, afinal, um apê com toque brasileiro, lembra Micha. "Tinha muita vontade de ter uma conexão com plantas. Elas dão um respiro ao ar bruto da cidade. Vê-las crescer, dar flor, me enche de orgulho".

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Para shipar na kit da Micha

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Meia parede

Tente fazer meia-parede antes de pintar completamente um ambiente. Aqui, o cimento queimado rosa ganhou metade da parede e aumentou a sensação de pé-direito alto.

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Detalhes importam

Mesmo em metragens reduzidas, aposte em itens de conforto. Luminária de piso, tapete, espelhos e quadros nos mesmos tons do apê dão o toque acolhedor aos ambientes, segundo Paulo Biacchi.

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Maior é melhor

Móveis maiores em espaços pequenos funcionam melhor. Se possível, eles devem ter pouca profundidade e ir do piso ao teto, aproveitando a altura para guardar itens menos usados.

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Sete vidas para viver

Há pouco mais de dois anos, o designer de produto Gabriel Freitas, de 28, abria as portas dessa quitinete de 36 m², de queixo caído. "As janelas enormes me convenceram. Fiquei". Mas ele e a gata Lisbeth queriam algo diferente para estrear no Copan. Preto foi a cor escolhida para as paredes. "Para mim, é como branco. Acredito no preto como o tom da matéria bruta", conclui.

Entre as fotografias, as coleções, as bebidas de um equipado bar e "uns temas como a sensualidade", encontre bancos da coleção Experimentos, feitos por ele. Ao lado da cama, nada de guarda-roupa: uma arara deixa as camisas à mão, para economizar tempo.

A geladeira foi camuflada, usando a mesma tonalidade das paredes. São obras dele também as prateleiras e as fitas de LED que mudam de cor, compradas na Santa Iphigênia. Enquanto faz um drinque para a foto, Gabriel fala das coisas boas do endereço. "Aqui estão os lugares aos quais eu mais gosto de ir - galerias de arte, museu, cinemas... Nossa, ficou cult demais [risos]. Eu também vou aos bloquinhos, tá?"

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Repare nessa kit

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Misturado e junto

Tem uma coleção? Coloque já na parede, de forma organizada. Os objetos ganham mais sentido tanto para quem vê quanto para quem exibe as histórias.

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O truque da arara

Nada de guarda-roupa com portas: Gabriel preferiu deixar numa arara suas roupas para evitar mais um volume. Ótimo truque para dar profundidade ao quarto.

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Dupla utilidade

Ter vários banquinhos é uma dica versátil para espaços compactos: durante o dia eles acomodam plantas e quando vêm os amigos eles vão à mesa de jantar.

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A incrível vista dos fundos

Ao fim de um dia como qualquer outro, Judson Sales entrou no elevador, apertou o botão e a porta fechou. Era seu primeiro ano no Copan. Naquela época, o Brasil vivia frequentes apagões de energia elétrica. Aquele seria mais um, mas muito curioso: "Quando olhei, ao meu lado tinha uma criança de 8 anos, uma moça trans bem alta e uma senhora toda aristocrática. Isso me marcou, mostrou toda a diversidade do Copan e como convivemos bem, mesmo tão diferentes. É muito peculiar".

Hoje, aos 35 anos, o diretor de carnaval da Tom Maior põe a digital na porta para mostrar sua disputada quitinete de 28 m². Queridinha entre as locações do Airbnb, ela vive de agenda disputada. A vista é um espetáculo - a mesma que encantou Judson, 13 anos atrás, quando chegou ali apenas para agradar um amigo que estava de saída e sublocaria para ele por R$ 500. A visita rendeu. "Muita gente tinha preconceito com o Copan nessa época. Quando vi todo o esquema de segurança e organização, foi paixão imediata".

O apego à kit foi tanto que ele não quis vender. Transformou em negócio. "Estava no começo do Airbnb e eu recebia gente de fora. Gostei". Judson sozinho adaptou o apê: tijolinhos e revestimentos práticos, chuveiro relaxante e cozinha aberta, para tomar vinho vendo o skyline de São Paulo.

"Não existe isso de apartamento pequeno ou grande. O que existe é estabelecer uma boa relação com o lugar que você ocupa. Se está tudo organizado, você se sente mais livre", diz ele, que comprou outra kit para o mesmo fim. Atualmente, mora em um apê de 79 m², o terceiro no mesmo Copan. Se ele pensa em mudança? "Só se for para um maior aqui dentro".

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Boas apostas rendem estrelas

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Vibe industrial

A laje exposta é um charme. Deixar de rebaixar o teto com gesso vale a pena para ganhar boa acústica e sensação de amplitude.

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Cooktop ou não?

A cozinha com cooktop e ilha é linda, mas a ideia só é funcional se você cozinhar pouco. Afinal, os cheiros podem atrapalhar bastante.

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Relax garantido

Um banheiro aconchegante faz a diferença. Judson cedeu espaço para que esse ambiente fosse maior, ao incorporar a cozinha ao quarto.

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"É um lugar sempre vivo"

Assim a servidora pública e dramaturga Camilla Rollemberg, de 31 anos, define o edifício. Dona de 36 m² desse universo que é o Copan, ela é fascinada pela arquitetura. A saída do elevador é um exemplo: se você vai ao 13º ou ao 14º andar, vai parar entre eles e pegar a rampa acima ou abaixo. "Acho o máximo essa ideia", ela diz.

Mas curioso mesmo é "construir uma intimidade dentro de uma multidão", como explica a moça. Por isso, figuras femininas fortes estão à vista em seu apê, dividindo território com elementos do teatro - uma paixão -, e outras 347 miudezas de viagens pelo mundo. "Importante é olhar ao redor e me encontrar. Casa tem que ter identidade, luminosidade e ventilação". Essa tem.

As únicas paredes nos 36 m² dividem o banheiro e a cozinha. Por isso, veio da prancheta do arquiteto Fábio Souza a boa estante que divide sala e quarto, embute estação de trabalho e a geladeira. As cores são dela: roxo, verde e azuis.

A geografia é propícia para chegar ao trabalho em cinco minutos. Camilla almoça em casa e vivencia o centro no estilo "morar em família": há o espaço privado e o café na padaria com amigos. Faltou açúcar? Só pedir pelas redes sociais copânicas. A luminária caiu do teto no fim da reportagem. Em poucos minutos o moço estava à porta para fazer o reparo. Mais um ponto para o Copan.

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O que dá match na kit de Camilla

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Luzes práticas

A iluminação de spots é um recurso barato para quem quer estilo. No apartamento de Camilla, eles estão dispostos em uma canaleta aparente.

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Móvel multifunção

A estante divide ambientes com funcionalidade: acomoda livros, objetos e serve como bancada de trabalho. Um recurso versátil e estético, que dá leveza ao apê.

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Espaço extra

Uma prateleira suspensa sobre a cozinha guarda os livros e outros itens menos utilizados sem interferir no décor: ótimo truque pra ganhar espaço extra!

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Divulgação

Dedo no Copan e gritaria

"Sempre gostei de gente e de história, por isso me conectei tanto com o Copan", diz a publicitária PollyMariah, praticamente uma guia virtual do prédio. Há quase 9 anos ela chegava ao térreo, emocionada: desde pequena, quando vinha de Atibaia, onde morava, dizia que era no Copan que ela viveria um dia.

Quando esse dia chegou, eram inúmeras as perguntas dos amigos ...e sempre parecidas. "Abri o Instagram @thecopan e com o tempo passei a responder a eles 'segue o insta'", ri. Polly faz dessa plataforma sua válvula de escape para contar as boas histórias que ficariam abafadas nas curvas dos corredores. "Amo fomentar o centro. Criei até um projeto para movimentar a comunidade de vizinhos, o Cercanias". Uma ideia para melhorar o prédio? "Ocupar melhor nossa rua de trás".

Quer saber como é a relação entre vizinhos no Copan? Ouça esse podcast da Polly.

Eduardo Knapp/Folhapress Eduardo Knapp/Folhapress

É curioso no Copan

  • O nome

    A abreviação de Companhia Pan-Americana de Hotéis deu origem ao nome Copan.

    Imagem: Eduardo Knapp/Folhapress
  • O hall

    No térreo, entre as várias lojas distribuídas em salas e stands, há até locadora de vídeos VHS e uma igreja.

    Imagem: Tuca Vieira/Folhapress
  • O arquiteto

    Em 1953, esse gigante de 32 andares ganhava corpo no centro da cidade. Poucos sabem, mas o arquiteto Oscar Niemeyer, seu famoso autor, desanimou ao ver a lentidão da obra e o direcionou a outro arquiteto, Carlos Lemos (foto), que deu continuidade ao projeto.

    Imagem: Eduardo Knapp/Folhapress
  • O síndico

    Há 26 anos, Seu Affonso Prazeres é o síndico do Copan. "Nunca saiu do cargo e foi o homem que revitalizou o edifício. Chegou a andar de colete à prova de bala quando assumiu o cargo, para tirar os traficantes do prédio", conta Polly Mariah, do @thecopan.

    Imagem: Eduardo Knapp/Folhapress
  • A fachada

    A fachada está atualmente coberta por uma fina tela azul, para evitar que caiam as pastilhas que revestem a fachada de brises, enquanto não sai a aprovação da empresa que vai restaurar o edifício, que é patrimônio histórico.

    Imagem: Joel Silva/Folhapress
  • Os brises

    É proibido colocar objetos e sentar nos brises, gera multa. Mas é supercomum ver gente fazendo ensaios fotográficos neles e arriscando a vida, afinal, entre o brise e a janela há um vão livre.

    Imagem: Tuca Vieira/Folhapress
  • O terraço

    O terraço do edifício abria esporadicamente para visita e meditação. Atualmente, está fechado por precaução.

    Imagem: Thays Bittar/Folhapress
Tuca Vieira/Folhapress Tuca Vieira/Folhapress

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