Pelas águas do Danúbio
Embarcamos em um cruzeiro fluvial de luxo que viaja por três países da Europa
Por Natália Manczyk, colaboração para Nossa, de Budapeste
Embarcamos em um cruzeiro fluvial de luxo que viaja por três países da Europa
Por Natália Manczyk, colaboração para Nossa, de Budapeste
Quando lá no século 1 os romanos construíram pontes e portos ao longo do Rio Danúbio, não imaginavam que, 2000 anos e muitas fronteiras redesenhadas depois, aquelas águas passariam de alvo de disputas para alvo de desejo. Vilas medievais, montanhas cobertas de videiras, castelos e pontes de pedras são os grandes responsáveis.
Na alta temporada, as águas do Danúbio chegam a receber 30 barcos em um dia. Tem quem saia de Viena e faça um passeio de 1h45 pelo Wachau Valley, o trecho austríaco que é Patrimônio Mundial da Unesco graças aos mosteiros e castelos intactos, às plantações de vinhas que cobrem os morros e às vilas bem preservadas nascidas no século 11.
Mas exclusivo mesmo — e melhor aproveitado — é passar oito dias a bordo de um hotel-butique flutuante vendo, do convés do navio, as paisagens "deslizarem" à sua frente da Alemanha à Hungria, passando pela Áustria. E não é só pelas capitais.
O roteiro vai de Nurembergue a Budapeste (ou vice-versa), atravessando três dos dez países banhados pelo Danúbio. As paradas estão no mapa, mas as cidades percorridas são incontáveis. Isso porque as margens são pontuadas por vilarejos e mais vilarejos.
Fui recebida com uma taça de champanhe em um lobby com piso de mármore e lustre de cristais murano no navio S.S Beatrice, da empresa Uniworld. A decisão passou a ser entre terminar a champanhe, fazer a massagem oferecida aos hóspedes na chegada ou ir para o salão do chá da tarde. É que em pouco tempo ali seriam apresentadas as opções de passeios.
Um drinque de gin com lavanda me inspiraria para mais uma decisão difícil: selecionar os tours, todos fora do comum. Eu conheceria um nobre em seu castelo austríaco, conversaria com artesãos alemães em Passau, provaria doces vienenses em um passeio pelo lado B da cidade e me aprofundaria na história judaica em Regensburg.
Se Viena e Budapeste já são velhas conhecidas, são as cidades pequenas que mais surpreendem e que causam aquela alegria silenciosa vinda do privilégio de conhecer o que poucos conhecem. Passau é um bom exemplo. É uma das mais bonitas cidades alemãs (e olha que são muitas na competição).
Na fronteira com a Áustria, ela é conhecida como a Cidade dos Três Rios. As águas verdes do rio Inn, que chegam dos Alpes, se misturam com as do Danúbio e do Elz no Triângulo das Águas, avistado do alto do antigo castelo e mosteiro. Como se isso não bastasse, os prédios, a praça e a catedral têm um quê de italianos. Foram reconstruídos com a ajuda da Itália depois de 1662, quando um grande incêndio destruiu Passau.
Tudo está incluído no cruzeiro. De bufê com inúmeras estações no café da manhã a almoço, jantar em três etapas, coquetéis, vinhos e os tours. Salmão marinado com caviar e crème fraîche para a entrada, entrecôte com polenta de blue cheese como prato principal e strüdel formavam o menu de um dia como outro qualquer.
Para quem quer ir além, é só investir na Masterpiece Collection. A exclusividade é proporcional ao nome. Um concerto privativo em um mosteiro em Viena com músicas de Beethoven e Mozart e uma visita ao Palácio Schönbrunn antes de ser aberto ao público são algumas das opções. Nesse caso, por um custo extra: ? 120 o primeiro e ? 100 o segundo.
"Às 9 horas virá a multidão. Mas tudo bem porque essa é a hora que estaremos indo embora", convence a tripulante responsável por apresentar os passeios.
Atravessei o corredor com obras de Pablo Picasso, Alexander Calder e Pino Signoretto para chegar à minha suíte. Diferentemente dos cruzeiros marítimos, que podem levar até 7600 pessoas, os cruzeiros fluviais são pequenos e intimistas. A capacidade é de 152 passageiros e 58 pessoas do staff. Praticamente um funcionário para cada duas pessoas.
A suíte não chega a ser opulenta. Banheiro todo de mármore, cobertor para apoiar a mala, roupões e um bom armário formam os confortos. Já a TV nem precisa ligar. Afinal, não tem imagem melhor do que ver o parlamento de Budapeste se aproximando na janela e as vilas medievais todo o tempo enfeitando a suíte.
O time dos que ficam enjoados em mar pode enfim ficar em paz. Está aí a maior e melhor diferença dos cruzeiros marítimos para os fluviais. Não dá nem para dizer que o navio balança pouco. O balanço é zero. Você só descobrirá que está navegando se olhar pela janela.
Mais uma diferença. Enquanto no cruzeiro marítimo os passageiros vivem horas ou dias sem ver nada além do mar, no rio isso não acontece. É o tempo todo vendo casas românticas, pontes, igrejas ou mesmo castelos. Seja com uma xícara de café nas mãos, um drinque ou em um descanso no quarto. É um treino para a concentração.
É comum na Europa que os principais atrativos não estejam longe do rio. Isso significa que os hóspedes praticamente têm um hotel flutuante logo ali. É rotina perambular por conta própria pelas cidades, tomar um bom chope alemão ou caminhar até um castelo entre idas e vindas do navio.
O preço varia conforme a época do ano e, claro, a categoria de suíte escolhida. Quem desembolsa partir de US$ 4.800 tem direito a comidas com ingredientes locais à vontade, as melhores bebidas e drinks, passeios culturais e nível zero de preocupação. Tudo enquanto flutua pelo rio que inspirou de Johan Strauss a Júlio Verne. É fácil entender.
Reportagem: Natália Manczyk
Edição: Eduardo Burckhardt
Imagens: Natália Manczyk, Getty Images e divulgação