Monstros marinhos povoam Ostia Antica, atração pouco conhecida de Roma
Os italianos costumam dizer que, para conhecer Roma, “uma vida não basta”. Surpreende saber, portanto, que a estadia dos turistas brasileiros na Cidade Eterna dura, em média, menos de quatro dias.
A cerca de 50 minutos do Coliseu e da Fontana de Trevi existe uma atração que pode fazer com que uma visita ao antigo lar dos Césares se prolongue um pouco mais. E esse lugar está intrinsicamente ligado à história da cidade que um dia foi chamada de “caput mundi” (capital do mundo).
Colado ao ponto em que o rio Tibre desemboca no mar Tirreno, a apenas 25 km do centro de Roma, Ostia Antica foi uma das principais áreas portuárias da República e do Império Romano, um ponto de conexão fundamental entre a metrópole e seus domínios ao redor do Mediterrâneo. Hoje, é considerado um dos maiores parques arqueológicos da Europa, recheado de monumentos com milhares de anos de história.
Alguns historiadores afirmam que as primeiras construções do que viria a ser Ostia Antica foram levantadas pelo quarto rei de Roma, Anco Marzio, por volta de 620 a.C., para defender a entrada do rio Tibre (e um campo de extração de sal que existia na área) de inimigos que navegavam pelo mar Mediterrâneo. “Ostium”, em latim, significa foz, e designava o local em que o Tibre, o curso d’água que alimentou a civilização romana durante séculos, se encontrava com o oceano.
Ostia Antica fica a 25 km do centro de Roma
Hoje, os restos de uma fortaleza (também chamada de "castrum") do século 4 a.C. são os resquícios mais antigos que podem ser observados no sítio arqueológico. Mas, a partir desse período, surgem no local monumentos que se encontram em excelente estado de conservação, como um teatro de 3.000 lugares que começou a ser erguido pelo imperador Augusto e pelo general Marcus Agrippa, uma área de banhos termais com mosaicos perfeitamente preservados e até uma antiga peixaria, decorada com figuras de monstros marinhos.
“Este é um dos mais completos parques arqueológicos da Europa, mas que ainda não foi descoberto por muitos turistas”, avalia Monica Valeri, delegada da secretaria de turismo de Ostia, que está dentro da jurisdição da cidade de Roma. “Poderíamos ter a mesma fama de Pompeia [cidade que foi devastada por uma erupção vulcânica em 79 d.C. e hoje é um destino extremamente popular na Itália], mas não temos nenhuma história de catástrofe para contar”.
Com uma média de 250 mil visitantes por ano (número considerado baixo, visto que Roma recebe cerca de 30 milhões de turistas anualmente), Ostia Antica teria sido abandonada por seus habitantes no decorrer do século 5 d.C., quando tornou-se, por ocasião do declínio do Império Romano, um lugar fácil de ser atacado por piratas (uma epidemia de malária também teria empurrado a população nativa para outras paragens). Reestruturado por arqueólogos a partir do começo do século 20, o lugar requer pelo menos a metade de um dia para ser desbravado.
Morte e arte
Ao entrar em Ostica Antica, nos arredores das ruínas da Porta Romana (aquela que abria o caminho para Roma), o turista se depara com uma relva verdejante pontuada por lápides, que marcam túmulos abertos entre os séculos 2 a.C. e 4 d.C. “Esta é a necrópole de Ostia Antica”, explica o guia Roberto Anconetani. “A entrada do sítio arqueológico fica em uma área periférica da antiga cidade, que é onde se enterravam os mortos, por estar longe da zona comercial e residencial”.
Ostia Antica teria sido abandonada por seus habitantes no decorrer do século 5 d.C., quando tornou-se, durante o declínio do Império Romano, um lugar fácil de ser atacado por piratas
O visitante ingressa então na via Decumanus Maximus, uma das principais artérias de Ostia Antica e que se encontra cercada por imensas árvores e diversas construções onde funcionavam centros de águas termais, uma das paixões romanas (existiam 20 complexos de banhos termais no local).
É em Decumanus Maximus que estão as “Terme dei Cisiarii” e as “Terme di Nettuno”, esta última construída durante o império de Adriano (117 a 138 d.C.) e que exibe sobre seu solo, em ótimo estado de conservação, um lindo complexo de mosaicos que mostram sereias, monstros do mar e Netuno em uma biga puxada por cavalos-marinhos. Outro mosaico mostra homens engajados em algum tipo de luta -- atividade também amada pelos comandantes do antigo império.
Na época de Adriano, Ostia Antica torna-se uma cidade grande: calcula-se que, na segunda metade do século 2 d.C., o lugar abrigava mais de 50 mil habitantes e, além de posto de defesa militar, funcionava como um movimentado entreposto comercial para produtos que circulavam entre Roma e os confins do Império.
“Os romanos eram navegadores práticos”, conta o guia Roberto Anconetani . “Eles estavam mais preocupados em proteger e interligar seus territórios nas bordas do Mediterrâneo do que em descobrir novas terras”.
O dom romano para erguer obras monumentais, porém, ainda reverbera nos dias de hoje: perto das “Terme di Nettuno” existe um teatro que irá encantar os amantes de arquitetura. Erguido a mando do general Marcus Agrippa (63 a.C. – 12 a.C.), o local chegou a ter capacidade para receber mais de 3.000 espectadores. As arcadas de sua fachada estão em excelente estado de conservação e suas arquibancadas podem ser escaladas pelos visitantes.
Na época do imperador romano Adriano, Ostia Antica chegou a ter 50 mil habitantes
Boa parte do plano urbanístico de Ostia Antica começou a ser desenvolvida durante o império de Augusto (31 a.C. a 14 d.C.), mas diversos de seus sucessores deixaram marcas no local. Ao final do século 1 d.C., Dominiziano teria encomendado ao genial arquiteto Apollodoro di Damasco a construção de diversas moradias para a então crescente população local.
E as diversas estátuas de simetria perfeita que ainda adornam as ruas da cidade provam que, em Ostia Antica, a arte era tão importante quanto o comércio. A cidade também devia ser cosmopolita: nas ruínas foram encontrados restos de uma sinagoga e construções de estilo oriental.
Vale lembrar que, apesar de ter nascido como um assentamento portuário, Ostia Antica não está mais perto da água: com seu curso alterado no decorrer dos séculos, o rio Tibre se afastou do sítio arqueológico, e até o oceano recuou e se separou do antigo porto: hoje, as águas do mar Tirreno estão a cerca de 4 km de Ostia Antica.
Com tanta história para observar, porém, o turista pouco se chateará ao não enxergar nenhuma praia por perto.
COMO CHEGAR DESDE O CENTRO DE ROMA
Da estação Porta San Paolo: pegar a linha de trem Roma-Lido e descer na estação Ostia Antica, que fica a uma caminhada de cinco minutos das ruínas. É também possível pegar a linha B do trem na Estação Termini (o principal terminal ferroviário de Roma), descer na estação Porta San Paolo e, de lá, pegar a linha Roma-Lido até Ostia Antica. Endereço: Viale dei Romagnoli, 717 – Ostia Antica – Roma
HORÁRIOS DE FUNCIONAMENTO (Abertura e fechamento da entrada)
Do último domingo de outubro até o dia 15 de fevereiro: Das 8h30 às 15h30.
De 16 de fevereiro a 15 de março: das 8h30 às 16h.
De 16 de março ao último sábado de março: das 8h30 às 16h30.
Do último domingo de março ao dia 31 de agosto: das 8h30 às 18h15.
De 1º a 30 de setembro: das 8h30 às 18h.
De 1º de outubro ao último domingo de outubro: das 8h30 às 17h30.
Fechados todas as segundas-feiras e nos dias 25/12 e 1/1.
Preço do ingresso: 8 euros
*O repórter Marcel Vincenti viajou à Itália a convite da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio, Indústria e Agricultura.
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