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Econômica e encantadora, capital de Montenegro se destaca pela cultura

Tim Neville

New York Times Syndicate

15/12/2013 08h00

Durante mais de dez anos depois da dissolução da Iugoslávia, Montenegro, a menor das seis repúblicas do país, parecia não ter outro papel para o turismo a não ser o de ser coadjuvante da Sérvia. Independente desde 2006, espremida entre Croácia, Bósnia e Herzegovina e Albânia, essa nação no Adriático hoje atrai cada vez mais ocidentais com a promessa de combinar história, beleza e cultura e, para muitos, continua sendo um tesouro não descoberto - mais ou menos como a Croácia antes de virar moda.

Sem dúvida, ela tem muito a oferecer: uma costa de 288 quilômetros pontilhada de portos espetaculares, como as cidades muradas de Budva e Kotor; vales profundos e rios caudalosos sombreados por castanheiras d'água. Poucos esticam a estadia em Podgorica, talvez porque a expressão "não há muito que fazer" viva aparecendo nas resenhas. Entretanto, durante as duas visitas que fiz no último ano, achei a minúscula capital extremamente agradável e charmosa, com cafés movimentados e bairros interessantes.

A conexão que peguei em Paris aterrissou em uma tarde ensolarada, em outubro passado, no Aeródromo Podgorica, cujo código, TGD, é um lembrete dos dias de comunismo da Iugoslávia, quando seu nome ainda era Titogrado. Lá de cima, tive que proteger os olhos do reflexo do sol no Lago Skadar, em um parque nacional, para absorver a beleza dos picos das Montanhas Prokletije, a 2.400 metros, na fronteira com a Albânia.

Montenegro, ou Crna Gora em montenegrino, significa "montanha negra" e a rusticidade e aridez da paisagem tornam óbvia a escolha do nome. Em contraste, todo o resto abaixo dela era absurdamente verde, com retalhos de plantações ligados por riachos e rios. Parecia que tinham transplantado Montana para os Bálcãs.

Podgorica não é Bozeman, mas não deixa de ser um lugar impulsionado pelo progresso. A OTAN bombardeou as áreas ao redor do aeroporto em 1999, quando os sérvios a usaram como espaço de reagrupamento depois dos ataques a Kosovo, ali ao lado. Montenegro escapou da ira da organização só porque Milo Djukanovic, então presidente, fez questão de se distanciar dos sérvios durante a guerra. Em 2006, a maioria da população votou pela separação definitiva da Sérvia e a independência ocorreu pacificamente.

"Parecia um casamento que não estava dando certo", diz Ninoslav Markovic, que estudou Turismo em Kotor, considerada Patrimônio da Humanidade. "Havia ressentimento, mas não houve briga feia."

Tentei encontrar sinais do conflito no caminho para a cidade, mas só vi BMWs e Mercedes novinhas na estrada bem cuidada que passava por rotatórias, lojas de móveis e mecânicas. Muitos prédios, conjuntos habitacionais cuja única vida parecia vir das cores fortes das roupas penduradas nos varais sobre as sacadas. Um burrico passou puxando um carrinho.

  • Djamila Grossman/The New York Times

    Pessoas se refrescam no rio Moraca, em Podgorica, capital de Montenegro

Em busca de um lugar para ficar descobri o Hotel Crna Gora, construído em 1953, que já foi o mais elegante de Podgorica e, nos áureos tempos, chegou a receber a elite do Partido Comunista. Olhando para ele hoje, não vejo nada além de um cubo de concreto apagado, mas logo percebo que não deixa de ter algo especial, como o saguão bem iluminado e corredores meio escuros reavivados pelo vermelho do carpete. Ao longo dos anos, ele também se tornou um minidepósito de pinturas de artistas montenegrinos e iugoslavos como Petar Lubarda e Milo Milunovic. Meu quarto tinha uma cama confortável, apesar dos rangidos, ao lado de um rádio antigo que não estava ali por ser antiguidade.

O local vai se tornar um Hilton e, desde a minha visita, os operários já demoliram quase todo o original como parte do projeto de US$56 milhões. O novo Hilton Podgorica Crna Gora deve ser inaugurado em maio de 2015 e terá 200 quartos, um spa e sete salas de conferência. As obras de arte e parte da fachada serão preservadas - pelo menos foi o que me garantiu Zarko Buric, dono do novo hotel, por e-mail. "Ele vai manter o espírito do antigo Crna Gora", escreveu, mas não pude deixar de me sentir meio melancólico. Hilton tem em todo lugar. Lembranças do comunismo como essa, mesmo que sejam um "lixo stalinista" como descrito por um usuário do TripAdvisor, estão desaparecendo rapidamente.

Algumas coisas, porém continuam iguais. Podgorica é um bom lugar para caminhadas, pois é compacta - tem cerca de 185 mil habitantes - com calçadas arborizadas e inúmeros cafés onde é possível se sentar e ver o povo passar. Eu deixei minhas malas no quarto e saí, passando pela loja Fancy Shop que oferecia um sapato de salto de 46 euros em promoção e pelas miniminissaias penduradas feito bandeirolas na vitrine da Butik Diva.

Seguindo pela Slobode - rua fechada ao trânsito, à noite, quando famílias inteiras saem para tomar sorvete e verdadeiros bandos de adolescentes desfilam destilando uma nuvem de perfume -, o passeio pode levá-lo à confluência dos rios Ribnica e Moraca, às ruínas de um antigo forte turco e ao lado de uma praia de pedras. Passei uma manhã inteira vagando pelos labirintos silenciosos de Stara Varos, ou Cidade Velha, onde homens bebendo conhaque, sentados ao lado de bandos de pombos, sorriram e acenaram para mim. O secretário da minoria muçulmana de Podgorica, muito simpático, me recebeu quando cheguei, sem avisar, a uma mesquita do século 18.

Impérios se ergueram e desapareceram nos Bálcãs ao longo dos séculos, cada um deixando sua marca na região. Descobri strudlas austríacas e baklava gregas; comi pizza em um centro espiritual ortodoxo sérvio que também funciona como restaurante sob o olhar severo de São Simão, que me espiava de cima de um muro de pedras. Os turcos otomanos governaram os Bálcãs por 500 anos e deixaram marcas indeléveis na culinária local. Eu me empanturrei até quase entrar em coma de carnes assadas e linguiça cevapcici no Pod Volat, restaurante decorado com arcos de pedra próximo a uma torre otomana do século 17. Durante toda a refeição, feita na área de não fumantes, meu garçom ficou de pé, a seis metros da mesa, com um cigarro na mão. A cena era tão absurda que só consegui rir.

Quem riu também foi a minha carteira: gastei a fortuna de US$25 no Pod Volat! A pizza deliciosa com vinho e café? US$3,79. As diárias dos hotéis ficam por volta de US$75. Não se paga mais que US$1 por um café.

Quase na reta final da minha viagem, conheci Fetah Mahmutovic em seu estabelecimento, em Zabjelo, bairro na região sul da colina chamada Gorica que dá nome à cidade. Aos 28 anos, ele tem uma banda chamada Fetah Vibration, que alega ser o primeiro e único grupo de reggae de Montenegro. Perfeitamente aceitável em uma terra em que o turbo-folk era muito mais popular.

"Turbo-folk me dá vontade de vomitar", ele disse.

Quando a Iugoslávia estava se dissolvendo, Mahmutovic declarou a independência de Zabjelo e brincou que sua padaria, especializada em burek, era mais ou menos como a Casa Branca. É claro que é gozação, mas a casa, a Burekdzinica Zabjelo, sem dúvida é a campeã indiscutível de iguarias (uma massa frita com queijo e outros recheios, muito parecida com o pastel), cuja receita vem sendo transmitida há quatro gerações. Conversamos durante mais de uma hora sobre música e Montenegro enquanto bati um burek de espinafre e outro, polvilhado de chocolate. Um copo de iogurte para beber foi o acompanhamento perfeito.

De repente senti uma necessidade de caminhar com mais vigor, talvez pelo que andava comendo; por isso, no meu último dia, parti rumo ao norte, na Slobode, com a ideia de andar vários quilômetros e subir ao topo da Gorica. É lá que os mais bem dispostos e em forma correm nas trilhas ao redor dos pinheirais que dão para os prédios logo abaixo. Demorei, mas cheguei ao cume, onde sentei para admirar o sol se pondo por trás das montanhas que se descortinavam no horizonte.

Eu, porém, estava distraído. Notei ao pé da colina uma capela escondida entre as oliveiras e os ciprestes: era a Igreja de São Jorge, construída no século 16 e a mais antiga e sombria da cidade, com um cemitério nos fundos. Os túmulos, há muito vandalizados e esquecidos, hoje eram cobertos por uma grossa camada de musgo.

Lá dentro, olhei para as imagens de São João Batista, São Jorge e Petar de Cetinje. Para quem não acredita, o lugar não tem nada de mágico; não havia música no órgão nem abóbadas para serem admiradas. Sem o incensário, o ar parecia parado. Éramos só eu e um homem varrendo o chão.

  • Djamila Grossman/The New York Times

    Lojinha de uma das capelas de Podgorica, capital de Montenegro

"Gostaria de ver alguma coisa?" perguntou o guardião da igreja, Radovan Mitrovic, quando notou meu interesse nos santos. Pôs a vassoura de lado e puxou a proteção de tela da imagem para me mostrar os restos dos afrescos originais em tons de vermelho e azul marinho. Uma testa. Um halo. Eram muito antigos, disse ele, talvez os mais velhos dos Bálcãs. Não quis checar, mas me satisfiz em aceitá-los pelo que eram. Talvez essa mesma postura tenha me ajudado a gostar tanto de Podgorica.

Comprei uma imagem pequena de São Nicolau na modesta loja da capela e estava pronto para continuar o passeio.

"Espera aí!", gritou Mitrovic, correndo atrás de mim. "Toma, um presente para você", completou, me entregando uma estatueta de São Basílio, um dos santos mais populares do país. "Talvez ele faça você voltar."
 

 

Se você for

Acomodação
O Hotel Ambasador (Vaka Djurovica 5; 382-20-272-233; hotel-ambasador-podgorica.montenegro365.com) tem nove quartos e um restaurante cujo terraço dá para o rio Moraca. Fica pertinho do centro, da Igreja São Jorge e do Parque Gorica. Diárias de quartos duplos a partir de 90 euros.

O Hotel M Nikic (Kralja Nikole; 382-20-220-292; hotelmnikic.com), inaugurado no início de 2013 às margens do rio Ribnica, oferece decoração contemporânea e 71 quartos, banheiros espaçosos e janelas azuis espelhadas. Diárias duplas a partir de 84 euros.

Onde comer
Basta uma volta pelas ruas Bokeska e Njegoseva, perto da praça principal, a Trg Republike, para ver inúmeras opções de cafés e casas noturnas populares, onde é possível se divertir a qualquer hora do dia.

O Mojito Cocktail Bar (Bokeska 6; 382-69-222-579) serve diversas variações da bebida que lhe dá nome, assim como vários tipos de cafés.

Pode Volat. (Trig. Vojvode Becir Bega Osmaagica 1; 382-69-618-633).

Burekdzinica Zabjelo (Vaka Djurovica; 382-67-881-269).

Spiritual Center (Duhovni Centar in Serbian, Njegoseva 27; 382-20-665-519).