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Descubra segredos da história de Ouro Preto e Mariana embaixo da terra

Daniel Ribeiro

Do UOL, em Minas Gerais

28/02/2014 08h00

Os encantos de Ouro Preto e Mariana são bastante conhecidos, mas há diversas formas de se conhecer esses lugares. As duas cidades são fruto da febre do ouro no século 17, e por isso mesmo sua verdadeira história aconteceu embaixo da terra, dentro das montanhas, nas minas de ouro.

Embora Ouro Preto tenha sido habitada por cerca de 40 mil pessoas, no século 18, é difícil precisar a população, já que em muitas estatísticas da época os negros não eram contados. Muitos reis e rainhas da África chegaram aqui escravizados, assim como seus súditos e nativos de outros lugares da África.

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Uma dessas histórias pode ser revisitada na Mina do Chico Rei, a poucos metros da Igreja de Nossa Senhora da Conceição (onde Aleijadinho está enterrado). A mina leva o nome do negro que chegou à cidade como escravo, mas foi logo reconhecido rei. Escravos de diversas etnias e nacionalidades se uniram com o objetivo de libertar Chico Rei. Cada escravo roubava uma pequena quantia de ouro para contribuir na compra da carta de alforria dele.

Não se sabe dizer quanto tempo levou, mas a carta foi comprada e Chico Rei libertado. Com medo de uma rebelião depois de observar tamanha organização dos escravos para alforriar o seu líder, as autoridade permitiram que ele fosse coroado na Igreja Nossa Senhora do Rosário. A festa da coroação de Chico Rei deu origem à congada, conforme conta a lenda. Centenas de escravos seguiram o nobre até a igreja cantando e tocando instrumentos de percussão. A história é emocionante, mas somente depois de entrar nos corredores da mina de ouro que chegou a pertencer a Chico Rei, é que se pode ter ideia do sofrimento de tantas pessoas.

  • Daniel Ribeiro/UOL

    Lago natural dentro da Mina da Passagem, em Mariana, Minas Gerais

Há corredores com apenas 60 centímetros de altura, onde é preciso passar se arrastando no chão lamacento. As escavações montanha adentro eram feitas apenas com ferramentas manuais seguindo o veio de quartzo, rocha perto de onde o ouro se deposita. Quando um grande bloco de quartzo era encontrado, os escravos eram orientados a escavar seu entorno, já que o metal precioso estava sempre em cima ou embaixo do material.

Este mesmo padrão de escavação pode ser visto na mina de Jeje Nagô. Todos os negros da região da costa noroeste da África eram chamados de Nagô, e Jeje era a nação dos habitantes do reino de Daomé. A entrada nessa mina é acompanhada de um guia que explica as histórias e as lendas em torno da exploração de ouro no Brasil Colonial. Ali, o turista observa entradas na rocha da montanha que descem 60 metros abaixo do nível da rua. Em uma grande galeria central, onde se vê um grande bloco de quartzo, uma rachadura no teto faz o visitante sentir uma parcela do medo enfrentado diariamente ali pelos trabalhadores.

Os passeios nas minas escavadas por escravos dão um foco diferente para a história que conhecemos e são recheados de adrenalina. Ter a sensação de estar no coração de uma montanha por um caminho feito à mão é uma experiência recompensadora, talvez tanto quanto escalar a mesma montanha.

Para ter um contraponto e compreender os benefícios, e malefícios, dos avanços tecnológicos, o turista deve visitar também a Mina da Passagem, em Mariana. Ao contrário das de Ouro Preto, esta foi explorada comercialmente por ingleses no século 19, com a ajuda de máquinas, apesar da presença minoritária de escravos.

Mina da Passagem
O ônibus que vai de Ouro Preto para Mariana passa a cada 30 minutos no ponto da rua Conselheiro Quintiliano, ao lado da Praça Tiradentes, e para ao lado da mina. Às segundas e terças das 9h às 17h, e de quarta a domingo, das 9h às 17h30. Tel: (31) 3557-5000. www.minasdapassagem.com.br
Mina do Chico Rei
Rua Dom Silvério, 108 - Ouro Preto. Diariamente, das 8h às 18h. Entrada paga.
Mina Jeje Nagô
Rua Santa Rita, 108 - Ouro Preto. Diariamente, das 8h às 18h. Entrada paga.
Taberna Xagrillé
Praça Tiradentes, 64 - Ouro Preto. Terça a quinta, a partir das 18h. Sexta, sábado e domingo das 12h às 16h e a partir das 19h.
Café Cultural Ouro Preto
Rua Claudio Manoel, 15 - Ouro Preto. Diariamente, das 9h às 19h. (31) 3551-1361.

Ainda no pátio da mina, máquinas e tratores dão um clima de quase terror ao lugar que parece abandonado. Um pequeno museu exibe peças utilizadas na época de atividade, peças de ouro e documentos. Há também uma loja com artesanato de pedra sabão, típico daquela região, e bijuterias em pedras brasileiras.

A entrada na mina é feita por um carrinho de trilho puxado por um cabo de aço, que desce por um corredor de 315 metros de extensão e 120 metros de profundidade. As galerias são amplas e, caminhando poucos metros, o turista chega a um lago natural com pontos de oito metros de profundidade, onde mergulhadores habilitados podem praticar a atividade.

A presença de escravos é notada ali por um altar construído para Santa Bárbara, que para os negros é Iansã, esposa de Xangô, o rei das pedreiras. Para eles, se agradassem a Iansã, Xangô não se zangaria e não derrubaria a pedreira sobre eles.

A visitação de todas as minas é paga e varia entre R$ 10 e R$ 30 reais. Segundo os guias, existem mais de duas mil minas em Ouro Preto, mas poucas estão autorizadas a receber turistas por motivos de segurança. Conhecer as cidades históricas por dentro, com certeza mudará a perspectiva com que o viajante olha a história do Brasil.

Ouro Preto oferece ainda outras atrações subterrâneas que exigem um espírito bem menos aventureiro. A Taberna Xagrillé oferece uma opção de cardápio diferente dos tradicionais restaurantes mineiros: ali a especialidade são os grelhados, servidos em um porão do século 18 completamente preservado. O Café Cultural Ouro Preto, embaixo do Centro Cultural e Turístico do Sesi, serve uma grande variedade de cervejas em um ambiente "decorado" com um fragmento de muro preservado há mais de três séculos.

 

* O jornalista Daniel Ribeiro viajou a Minas Gerais a convite da TAM (www.tam.com.br)