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Barcelona gastronômica tem mercados de rua, vinhos, cervejas e comilança

Rafael Mosna

Do UOL, em Barcelona (Espanha)*

10/07/2015 17h40

Comida é levada a sério na Catalunha, região autônoma da Espanha cuja capital é Barcelona. São vários, por exemplo, os mercados de rua espalhados pelos bairros da cidade.

Uma tradição que ainda persiste entre os locais faz referência a uma bebida, o vermute. "Anar a fer el vermut" (“ir para o vermute”, em tradução livre do catalão para o português) é um ato que antecede a refeição e pode envolver, além do dito cujo, também cerveja, vinho e licores para abrir o apetite. Não podem faltar aperitivos como azeitona, batatas chips e o conhecido jamón (presunto cru) aliados ao encontro entre amigos.

O UOL Viagem preparou um roteiro para ajudar quem planeja fazer de Barcelona o seu próximo destino gastronômico. Prepare o seu apetite.

Mercados locais
Em meio à enxurrada de turistas que circula pelos corredores, há também vários catalães que vão a La Boqueria para fazer compras. Basicamente, as mais de 300 barracas estão divididas em quatro setores: peixes e mariscos, muitos ali ainda vivos - ou moribundos; frutas regionais e importadas, com ofertas de vitaminas e sucos vendidos em copos; embutidos, como o jamón; e carnes em geral. Não faltam guloseimas, geleias, conservas, trufas brancas e negras – nas quais os espanhóis parecem ser vidrados.

As origens da Boqueria estão na antiga cidade medieval de Barcelona. Ela se localizava na área externa às muralhas, para fugir da cobrança de impostos aplicados ao comércio vigente na região interna. Era um mercado aberto, que, no século 19, se trasladou "temporariamente" para o terreno onde está fixado hoje, próximo à rambla, em uma área de mais de 2.500 m². O local, a partir do século 16, abrigava o convento das carmelitas descalças, mas foi incendiado por revolucionários em julho de 1835.

Frutas à venda na Morilla Fruites, barraca no mercado La Boqueria, em Barcelona - Rafael Mosna/UOL - Rafael Mosna/UOL
Frutas à venda na Morilla Fruites, barraca no mercado La Boqueria, em Barcelona
Imagem: Rafael Mosna/UOL

Mais intimista, o Mercado de Santa Catarina está situado na região da Riviera, próximo ao bairro gótico, e também foi erguido em um terreno que pertencia ao convento de mesmo nome. Primeiro mercado barcelonês coberto, seu novo teto foi remodelado em 2005 e é todo colorido e decorado com pedaços irregulares de cerâmica (como as conhecidas obras do arquiteto catalão Antoni Gaudí).

O local vende quase todos os tipos de produto da Boqueria, incluindo os itens frescos, mas em menor número. Uma barraca especializada em ovos comercializa o "ovo trufado". Estocado junto a trufas, os poros da sua casca absorvem o inconfundível aroma. Se conseguir armazená-lo (ou consumi-lo) durante a viagem, pague para ver. Ou melhor, para provar.

Separada por uma porta automática de vidro, uma pequena área com um jardim vertical é destinada a restaurantes servirem refeições.

Pequenos produtores
Minibarracas ao ar livre vendem mel, queijo (produzidos a partir de leite de vaca, ovelha e cabra, a partir de 4 euros o pedaço; cerca de R$ 14**), balas, bolos e tortas, geleias, ervas, vinhos, chocolates, cogumelos, frutas secas. Tudo proveniente de 12 produtores do interior da Catalunha. Alguns comercializam ao consumidor final somente no local, já que, fora dali, seus clientes são apenas restaurantes.

Eles ficam na praça em frente à igreja Santa Maria del Pi (“pi”, de “pinheiro”, em catalão) das 11h às 14h30 e das 17h às 21h30 somente alguns dias do mês.

Na base do leite
Imagine a seguinte cena: sentada, sem pressa, uma senhora desfruta, às colheradas, uma pratada de chantilly. Puro e em quantidade de creme suficiente para a cobertura de um bolo. Na saída, pede um pouco mais para viagem. Pode parecer inusitado, mas a história tal qual descrita aconteceu na visita deste repórter à Granja M Viader (granjaviader.cat.mialias.net). "Granja", vale explicar, é um estabelecimento onde tradicionalmente vendem leite e seus derivados.

Separada por uma porta automática de vidro, uma pequena área do Mercado de Santa Catarina possui jardim vertical, restaurantes e mesas - Rafael Mosna/UOL - Rafael Mosna/UOL
Área do Mercado de Santa Catarina possui jardim vertical, restaurantes e mesas
Imagem: Rafael Mosna/UOL

Com certo ar vintage, está situada em uma ruela (carrer xuclà, 7) próxima à rambla. Para levar ou comer ali mesmo, há iogurte feito com leite de cabra, crema catalana (sobremesa similar ao francês crème brûlée) e mató (queijo fresco típico catalão, de origem medieval, feito com leite de cabra ou ovelha; sem sal, é geralmente servido com mel, então chamado “mel i mató”).

Tem destaque na prateleira o cacaolat, leite com chocolate vendido tradicionalmente em uma garrafinha de vidro. Criado por Marc Viader, faz parte da memória afetiva dos catalães.

Os comes e bebes, atualmente, não ficam restritos aos derivados de leite. Há também doces e embutidos de porco, entre outras iguarias.

Palácio medieval
O bairro gótico de Barcelona guarda construções que remontam à Idade Média. Em uma delas está localizado o restaurante Neri (www.hotelneri.com), cujo salão está ambientado em meio a um muro de pedras que data do século 12. Para comer, espere por criações inventivas em um ambiente tranquilo.

Repare nas pedras negras em exposição logo na entrada. São sais indianos Kala Namak, cujo sabor é bastante próximo ao do ovo frito.

A apresentação delicada de pratos como o carpaccio de alcachofra com romesco (molho típico) e secallona (embutido de porco) ganha pequenas flores de cebolinha, bem notadas à boca (o sabor é similar ao da planta).

Apesar de fazer parte da cadeia luxuosa Relais & Châteaux, a experiência gastronômica na casa está longe dos altos preços praticados por locais similares em São Paulo e no Rio. De segunda a sexta, um almoço com entrada, prato principal, sobremesa e uma bebida (água, suco ou taça de vinho) sai a 22 euros (cerca de R$ 78**). Aos sábados e domingos, o valor é 25 euros (cerca de R$ 90**) e exclui bebidas. Para o jantar, de domingo a quinta, o menu requer um investimento maior. Com aperitivos e outras cinco (ou, com sorte, seis) etapas, sai a 37 euros (R$ 132**).

Loja "gourmet" da Vila Viniteca tem seleção de 300 a 500 queijos, além de itens como chocolates, embutidos e conservas - Rafael Mosna/UOL - Rafael Mosna/UOL
Loja "gourmet" da Vila Viniteca tem seleção de queijos, chocolates e conservas
Imagem: Rafael Mosna/UOL

À sombra de um estrelado
Se a ideia é se dar ao luxo de uma experiência gastronômica mais pomposa e em um local charmoso, o Blanc Brasserie & Gastrobar (www.mandarinoriental.com/barcelona/fine-dining/blanc) pode ser visitado tanto para um chá da tarde quanto para uma refeição completa. Está localizado em pleno Passeig de Gràcia, região barcelonesa que abriga lojas de luxo e atrações turísticas famosas como a Casa Batlló e a La Pedrera (Casa Milà), consideradas obras-primas de Gaudí. Fica no interior do hotel Mandarin Oriental, também casa do restaurante Moments, duas estrelas no guia Michelin.

Com pratos e serviços impecáveis, não espere por pechinchas. Tampouco serão encontrados preços estratosféricos. Entrada, prato principal, sobremesa e café podem custar 33 euros (R$ 118**) bem investidos. Nesse caso, podem chegar à mesa releituras de clássicos da culinária mediterrânea, como os três tipos de melão servidos com jamón, cujo preparo utiliza técnicas contemporâneas.

Até mesmo o hambúrguer não é um simples sanduíche. Ele é feito com carne dry-age (maturada a seco, sob temperatura controlada em câmera de ventilação) e é servido com cebola, cheddar e batatas fritas (18 euros; R$ 65**).

Dos vinhos...
São de sete a oito mil rótulos à venda, entre vinhos e destilados. Na Vila Viniteca (www.vilaviniteca.es), as garrafas custam entre 3 euros (cerca de R$ 11**) e 15 mil euros (mais de R$ 53,5 mil**). O local trabalha com todas as denominações de origem controladas da Espanha, incluindo as 11 catalães e cava (espumante). A entrega no hotel é gratuita a partir de 12 garrafas ou 120 euros gastos (R$ 428**).

Além das bebidas, há uma “loja gourmet” com venda de azeites, embutidos, chocolates, conservas e uma seleção de 300 a 500 queijos, dependendo da temporada, entre outros itens. Poucas mesas estão disponíveis para o consumo ali mesmo.

A Vila Viniteca possui de sete a oito mil rótulos, entre vinhos e destilados, à venda. Garrafas custam a partir de 3 euros (cerca de R$ 11*) e podem chegar a 15 mil euros (mais de R$ 53,5 mil*). *Os preços podem sofrer alteração sem aviso prévio. Valores convertidos de euros para reais no dia 09/07/2015 - Rafael Mosna/UOL - Rafael Mosna/UOL
A Vila Viniteca possui de sete a oito mil rótulos, entre vinhos e destilados
Imagem: Rafael Mosna/UOL

Para os mais aficionados, é possível organizar uma degustação particular, em sala privativa e um sommelier à disposição. O tema varia de acordo com o perfil e a vontade de cada cliente. Cinco rótulos, para um casal, por exemplo, pode custar 40 euros (R$ 143**) por pessoa.

...E das cervejas
Outra marca queridinha dos catalães é a cerveja Moritz (www.moritz.com). Fundada em 1856, a bebida acabou ficando fora do circuito, mas voltou recentemente com força total. Sua antiga fábrica foi restaurada pela família e hoje abriga uma microcervejaria, um restaurante e um bar de vinhos. A cerveja servida e produzida ali é feita em pequena escala. Não sofre pasteurização e, por isso, sai da torneira ainda fresca, com validade limitada.

Para provar outras variedades de cervejas catalãs, vá a La Cerveteca (www.lacerveteca.com), bar com opções de chopes e garrafas. Para comprar, a BeerStore (www.beerstore.pi3.es), próxima à Sagrada Família, e a Rosses i Torrades (www.rossesitorrades.com) comercializam uma boa quantidade de rótulos regionais que não chegam ao Brasil, assim como outras opções espanholas e internacionais.

Confeitaria de artista
Também na rambla, a Pastisseria Escribà (www.escriba.es) é comandada por Christian Escribà, quarta geração de chefs-pâtissier bastante famosa na Catalunha. A pequena loja por si só já vale a visita, com decoração modernista, cheia de mosaicos e esculturas.

Dentro, bolos personalizados e miniesculturas de doces estão ao lado de receitas clássicas como croissant e crema catalana.

Mestres ‘tostadores’
“Hoje em dia, você aperta um botão e tem um resultado uniforme. Uma amêndoa pode ser torrada em duas horas nesses fornos modernos. Aqui, podemos levar até cinco dias”, explica com paixão Igor Ramos, que trabalha há três anos na Casa Gispert (www.casagispert.com), loja especializada em torras de frutas oleaginosas, como castanhas, nozes, amêndoas e avelãs, desde 1851. O sabor é único e remete bastante à lenha utilizada na fabricação.

A reportagem, não identificada como imprensa, esteve em uma pequena visita feita com clientes tradicionais e Igor continuava contando sua rotina, entusiasmado e falando em um castelhano ultrarrápido. Mostrou as cicatrizes em seu braço, resultado de queimaduras ao provar algo do forno centenário ainda em funcionamento. “Não gosto dessa aparelhagem nova, com tanta tecnologia em que tudo sai com o sabor igual.”

Quando e como ir
Barcelona tem um verão bastante quente e um inverno considerado frio para os padrões brasileiros, com temperatura média de 9°C. Bastante turística, espere mais visitantes durantes os meses mais quentes (julho e agosto). Turistas brasileiros não precisam de visto antecipado.

*O jornalista visitou Barcelona com o apoio do BarcelonaTurisme (www.barcelonaturisme.com)
** Os preços apresentados podem sofrer alterações. Valores convertidos de euros para reais em 09/07/2015