Na Jamaica, pegue a estrada: costa norte tem Caribe de 007 e montanhas
O carro percorre o interior da ilha ao som de uma versão jamaicana de um hit americano dos anos 80. Enquanto o motorista cantarola, pela janela vão passando pequenos restaurantes de “jerk chicken”, barracas de frutas, bares de rum e salões de beleza com fachadas coloridas.
Estamos no norte da Jamaica, região de florestas, lagos, cachoeiras e praias bem ao estilo caribenho. Um lugar onde dá para se encantar muitas vezes, e não só com a natureza. Dos penteados elaborados que as mulheres usam até os cartazes de shows que revelam a cultura gráfica local, tudo na ilha tem muito estilo.
Talvez mais lembrada pelos brasileiros pelo reggae e pelo cenário urbano de Kingston do que pelas praias, a Jamaica tem, além de uma capital caótica e uma rica produção musical que a tornou conhecida no mundo todo, mais de mil quilômetros de costa voltada ao mar do Caribe, cercando suas cordilheiras - o país é super montanhoso.
Chamada por seus primeiros habitantes de terra da madeira e da água (“Xaymaca”, em Arawak), surpreende pela quantidade de rios e cascatas espalhados por um território razoavelmente pequeno: 11 mil km² de extensão - o tamanho da cidade de Manaus. Espanta ainda mais saber que em muitas regiões mais pobres falta, justamente, água.
Nos últimos cinco anos, a parte norte mudou bastante, contam os jamaicanos, o que tem a ver com investimentos no turismo. Hoje, o setor é um dos motores da economia da ilha. Em toda a costa há ampla infraestrutura de hotéis e resorts luxuosos, muitos deles novos. Mas ainda há também pousadas e hostels, além de muitas casas para locação temporária.
A atração pela região não vem de agora. Há mais de cinco décadas, turistas se hospedam ali em busca de um pedacinho de paraíso à beira-mar. Rodado na ilha, o primeiro filme de James Bond, “007 Contra o Satânico Dr. No” (1962), ajudou a alimentar este imaginário.
Tanto aos interessados neste circuito mais oficial quanto aos que querem escapar dele, viajar pelo norte vale a pena. Além das belezas naturais, um passeio pelas montanhas, onde vive boa parte da população, revela muito da personalidade da ilha: as festas de dancehall invadindo as ruas numa sexta à noite, homens jogando dominó na beira da estrada e construções de madeira com referências à cultura rastafári que se intercalam com casarões de arquitetura inglesa.
Para conhecer um pouco desta parte do país, reunimos abaixo alguns destinos e passeios. Dica: reserve ao menos quatro dias por ali e não deixe de conversar com quem vive na região.
Praias, museu e frango apimentado em Mo’Bay
Montego Bay é onde fica o segundo aeroporto do país e porta de entrada de boa parte dos viajantes. A cidade, que sedia o megafestival Reggae Sumfest, está a três horas de carro da capital Kingston - considerada menos turística, mas fundamental para quem gosta da cultura local. Não é preciso ficar indeciso: dá para ir de uma a outra por terra ou em voos de meia hora.
Na Sam Sharpe Square, faça uma parada no recém-aberto centro cultural, com exposições interessantes (quando a reportagem do UOL visitou a ilha, havia uma sobre rastafarianismo e outra sobre mulheres artistas), além de observar a vida que corre em volta da praça: estudantes saindo das aulas, confusão de carros - o trânsito jamaicano é caótico - e comércio de rua. A uma distância caminhável está o Scotchies, clássico ponto de jerk chicken, o mais famoso prato local: galeto assado lentamente sobre troncos de pimento, árvore típica da ilha.
Também perto dali está a Doctor’s Cave, praia cuja lenda diz que as águas são terapêuticas. Como infelizmente ocorre com outras praias badaladas da região, há uma taxa para acessá-la, por volta de US$ 5**. Para fugir disso, procure praias como a Dead End.
Cachoeira de James Bond e montanha mística
Uma hora e meia a leste de Mo’Bay, Ocho Ríos é uma cidade portuária que virou meca do turismo. De um lado há resorts à beira-mar que atraem famílias americanas e canadenses. Do outro, um centrinho onde redes de fast-food se misturam a comércios mais autênticos que resistem, como uma loja de discos de reggae ou uma ital shop (de comida vegetariana).
Na região, a Dunn’s River Falls é uma queda d’água de 183m que desemboca no mar, famosa por ser um dos cenários do filme de James Bond. É bonita, mas totalmente lotada, então a dica é chegar cedo. A entrada custa US$ 20** para turistas. No caminho, vale parar para uma refeição no Ocho Ríos Village Jerk Centre, que tem comida simples e deliciosa.
Perto dali, a Blue Hole é uma lagoa bem mais tranquila, com águas de um azul-piscina intenso, devido a presença de pedra calcária. Guias levam viajantes pelas trilhas até lagoas e quedas mais afastadas por cerca de US$ 10** (é comum aceitarem tanto dólares americanos quanto jamaicanos em pontos turísticos). Se você for no começo da manhã, pode dar um mergulho sozinho.
Na Mystic Mountain um teleférico sobe por dentro de uma densa floresta com árvores de pimento e ackee (fruto da ilha), levando a um parque com mirante, circuitos de tirolesa, bobsled (o carrinho do filme “Jamaica Abaixo de Zero” adaptado para o clima tropical), restaurante e um centro cultural que conta um pouco da história da ilha e mostra ícones locais - Bob Marley e o corredor Usain Bolt obviamente são destaque. Os preços das atividades no parque, no entanto, são meio salgados, começando em US$ 20** (para crianças) e chegando a US$ 140**.
Rumo oeste: clima de vilarejo praiano e pôr-do-sol
Uma hora e meia a oeste de Montego Bay, Negril tem atmosfera de vilarejo praiano, com ateliês de escultores de portas abertas, chão de terra, pequenos bares e restaurantes. Por conta do turismo tradicional que avança na costa da ilha, a cidade não é mais toda assim, mas ainda há ali um clima rústico que a difere de outras áreas ao norte.
Sua extensa praia combina grandes falésias, recifes de corais e mar azul. Chamada de Seven-Mile Beach, tem partes monopolizadas por hotéis e outras públicas, de fato.
Nos finais de tarde, do alto de uma enorme pedra onde fica o bar Rick’s Cafe é possível saltar de 10m de altura para o mar ou apenas tomar uma cerveja vendo o pôr-do-sol. O local é bem clichê turístico, mas a vista é bonita. Conhecida pela vida noturna, a região tem casas onde rolam shows e discotecagens de nomes da música jamaicana - Roots Bamboo, De Buss e Mi Yard são exemplos onde a frequência é mais local.
Como ir?
Para fazer os trajetos acima você pode alugar um carro, mas precisa encarar a mão inglesa, vigente na ilha. Dá também para contratar tours (neste site), usar táxi (os percursos descritos saem entre US$ 60** e US$ 90**) ou ônibus (que fica bem mais barato: entre US$ 13** e US$ 15**). Para se informar sobre transporte público intermunicipal, visite o site.
MAIS SOBRE A ILHA
Origens, política e maconha
Originalmente habitada pelos índios Tainos, o país teve duas colonizações: espanhola e britânica. A diáspora africana é marcante na Jamaica, como em todo o Caribe: após os indígenas terem sido praticamente dizimados pelos colonizadores, povos que viviam onde hoje são Nigéria e Gana foram trazidos escravizados a ilha. Atualmente, a população é formada em sua imensa maioria (cerca de 90%) por afrodescendentes, o que reflete na música, gastronomia e no idioma - o patois, língua crioula falada no país, tem palavras de origem africana. Já no pós-abolicionismo, chineses e indianos vieram trabalhar na Jamaica colônia.
Independente desde 1962 apenas, a Jamaica tem regime parlamentar. Entre 2011 e 2016, quem governou foi uma mulher do partido de centro-esquerda People’s National Party. Foi em seu governo que a maconha foi descriminalizada na ilha - apesar da aceitação social do consumo da erva, sua posse era ilegal até então. Em 2016, voltou ao poder o Partido Trabalhista, que, apesar do nome, é conservador.
Circulando pela ilha
A Jamaica tem altos índices de violência, então viajar acompanhado de um morador local é sempre bom para ter mais informações e passear com tranquilidade, mas estando sozinho você pode caminhar atento e se informar sobre regiões mais hostis a um estrangeiro. Sendo mulher, é importante saber que o assédio masculino é comum na ilha. Existe bastante assédio a turistas no comércio também, já que há muita pobreza. Se quiser fotografar alguém, aja com respeito e converse antes com a pessoa.
*A repórter viajou a convite do Moon Palace Resort, com o apoio da Copa Airlines, CVC e do escritório de promoção turística do país
** Preços pesquisados em março de 2016 e sujeitos a alteração
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