Marcado pela guerra, Kosovo tem capital moderna e lindas cidades históricas
Kosovo é uma palavra que, até hoje, remete à guerra. Mas, ao entrar nesse território balcânico nos dias atuais, é provável que o turista veja mais jovens com um iPhone ao ouvido do que soldados com fuzis Kalashnikov na mão.
A história do conflito armado dos 1990 que opôs a maioria albanesa da região aos sérvios ainda está por aqui. Porém, ao andar pelas ruas de Pristina, a capital kosovar, o forasteiro tem a impressão de que os nativos estão mais otimistas com seu presente do que deprimidos com seu sombrio passado.
De tão novo e bem cuidado, o centro de Pristina se mostra quase tedioso. Em cada esquina, cafés chiques servem excelentes macchiatos para empresários engravatados, restaurantes de comida turca preparam pratos para famílias muçulmanas e, nos floridos calçadões, jovens passeiam tranquilamente exibindo roupas e bolsas de grife.
A tensão bélica, tão esperada por quem vem de fora, parece ter se dissipado.
Hoje, Pristina tem acomodações para viajantes com todos os tipos de bolso: o centro da cidade é marcado pelo enorme edifício do Swiss Diamond, um hotel cinco estrelas que oferece spa, lounge com piano e um restaurante refinado.
Para os mochileiros, o White Tree Hostel é a escolha mais popular, com quartos compartilhados custando poucos euros e um bar a céu aberto que, além dos hóspedes, recebe legiões de jovens kosovares todos os dias. Trata-se de um ótimo lugar para interagir com os nativos e provar algumas das cervejas locais, como a Peja.
E, quando a noite chega, multidões se reúnem no bulevar Nena Teresa (em homenagem à Madre Teresa de Calcutá, que tinha origem albanesa e é adorada por aqui) para curtir os bares da área.
A moeda usada pelo Kosovo é o euro, mas isso não deve ser um impedimento para o brasileiro preocupado com a cotação do real: grande parte dos produtos e serviços locais custam poucas unidades da moeda europeia. Um almoço, na média, sairá por cerca de 5 euros.
De quem é esse lugar?
O Kosovo declarou sua independência da Sérvia em 2008 e é atualmente reconhecido como um país por 109 das 193 nações que fazem parte da ONU. Tem parlamento, primeiro-ministro e forças de segurança. Os Estados Unidos apoiam e financiam este status soberano.
E o Kosovo se mostra independente para quem vem de fora.
Ônibus saem diariamente da capital sérvia de Belgrado com destino a Pristina. Ao chegar à cidade de Plakovo, no meio do caminho, um posto fronteiriço: soldados kosovares entram nos veículos e pedem os documentos de todos os passageiros.
"Por que eles estão pedindo minha identidade? Isso aqui ainda é a Sérvia", se indigna uma jovem viajante sérvia presente no ônibus. Ela conta que está indo a Prizren, uma linda cidade histórica do Kosovo que abriga uma ponte otomana do século 15, uma mesquita inaugurada em 1561 e um centro histórico recheado de vielas românticas. Sua viagem, porém, tem como objetivo uma festa de música eletrônica que será realizada por lá.
"Mas você não tem medo de vir ao Kosovo?", pergunto, até aquele momento achando que a guerra dos anos 90 criara uma barreira intransponível entre sérvios e albaneses. "Lógico que não. Os albaneses do Kosovo também vão à Sérvia para curtir festas", diz ela.
Mesmo com esta interação, as opiniões dos dois lados são divergentes. Mais de 90% dos cerca de 2 milhões de pessoas que vivem no Kosovo têm etnia albanesa e uma história influenciada pelo islã trazido a partir do século 15 pelo Império Otomano. Eles se sentem diferentes dos sérvios, que são eslavos e profundamente ligados à igreja cristã ortodoxa.
Para os sérvios, porém, a história vai mais longe. Foi nesta região onde, durante a Idade Média, se formaram seus primeiros mosteiros e onde milhares de sérvios morreram ao combater a invasão do Império Otomano no século 14 (que foi bem-sucedida e converteu a maioria dos albaneses que viviam na área ao islã).
Enclaves sérvios
Os sérvios ainda representam uma minoria significativa da população local. E visitar as cidades em que eles vivem é como entrar em outro universo.
Um desses lugares é Gracanica, localizada a 30 minutos de Pristina e que abriga um mosteiro que é um dos principais centros de culto para a Igreja Ortodoxa Sérvia.
Finalizado no século 14, o interior cavernoso do local é coberto por lindas pinturas religiosas, iluminadas parcamente pelo sol que entra por estreitas frestas. Um tranquilo jardim cerca a construção e sustenta edifícios onde ainda vivem monges em reclusão.
Assim como em Pristina, não há, à primeira vista, uma grande tensão no ar, mas todas as áreas habitadas por sérvios dentro do Kosovo ainda são monitoradas pela KFOR, força militar de 4.600 soldados da OTAN que tem como objetivo manter a estabilidade entre albaneses e sérvios na área.
A KFOR, por exemplo, faz a segurança do mosteiro de Visoki Decani, construído no século 14 e que abriga mais de 20 monges da Igreja Ortodoxa Sérvia. Localizado perto da cidade de Peja, de maioria albanesa, o lugar foi atacado em meados dos anos 2000 por causa de sua origem sérvia. Seu interior, entretanto, é marcado por fascinantes afrescos e ícones cristãos – o que, somado aos deliciosos doces preparados pelos monges locais, também fazem uma visita valer a pena.
ATRAÇÕES DO KOSOVO QUE VOCÊ, PROVAVELMENTE, DESCONHECIA
Ótimos vinhos
A região de Rahovec, no centro do Kosovo, é uma produtora de excelentes vinhos. De lá saem garrafas de Pinot Noir, Merlot e Chardonnay que, além de abastecerem os mercados locais a preços módicos, são exportadas para outros países da Europa. Uma das melhores marcas kosovares é a Stone Castle.
Festival de cinema
Já a linda cidade de Prizren sedia, no verão europeu, o festival de curta-metragens e documentários Dokufest, com excelentes produções cinematográficas de todo o mundo, do Peru à China.
Arquitetura inusitada
A cidade de Pristina abriga um dos prédios mais chamativos da Europa. Trata-se da Biblioteca Nacional, projetada pelo arquiteto croata Andrija Mutnjakovic e que parece um amontoado de cubos de concreto protegidos por uma armadura medieval. Muitos acham a obra horrível, mas vale a pena vê-la de perto e tirar suas próprias conclusões.
COMO CHEGAR
Uma das maneiras para ir ao Kosovo é com ônibus saindo de Belgrado, em viagens que duram cerca de oito horas. É também possível entrar no Kosovo a partir da Albânia (a viagem por terra a partir de Tirana dura cerca de seis horas) e da Macedônia (duas horas desde a cidade de Skopje).
Brasileiros não precisam de visto para entrar no Kosovo. O carimbo de entrada na fronteira do território costuma ser dado sem maiores questionamentos. Mas, por precaução, tenha pelo menos um hotel reservado por lá antes da viagem. Como o Brasil é uma das nações que não reconhece o Kosovo como um país, a exigência e o tempo de permanência do visto pode mudar de uma hora para a outra. Verifique a situação atual com serviços consulares brasileiros antes da jornada.
ONDE FICAR
Pristina possui acomodações de todos os níveis. Uma estadia em um quarto compartilhado do White Tree Hostel, por exemplo, custa a partir de R$ 35. Já a diária do Swiss Diamond pode sair por mais de R$ 600. Hotéis medianos, por sua vez, têm diárias por cerca de R$ 110. Tente ficar na região central da cidade, perto do bulevar Nena Teresa.
E não é difícil encontrar acomodações em outros locais turísticos do Kosovo. A cidade de Prizren possui hotéis de quatro estrelas com diárias de aproximadamente R$ 150. Já Peja, que fica entre as lindas montanhas da cordilheira do Rugova, tem o Hostel Sarac, onde a noite sai por aproximadamente R$ 50*.
Se você tiver flexibilidade de tempo, tente visitar a região entre abril e junho, quando o calor é agradável e perfeito para passeios ao ar livre.
*Preços pesquisados em 2 de agosto de 2016 e sujeitos a alterações.
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