Antigo bairro da Cidade do México, Colonia San Rafael é novo reduto das artes
Ao lado do pequeno pátio aberto da cobertura de uma antiga mansão, Anuar Maauad tinha um cigarro numa das mãos, uma cerveja na outra e um celular que tocava – constantemente – na sua frente sobre a longa mesa da cozinha. E continuou sentado, ladeado pelos amigos, enquanto o céu da Cidade do México explodia com um raio tão forte que até sacudiu a construção de 123 anos.
A "Casa Maauad" tem 603 metros quadrados e é um trabalho em andamento. O Maauad em questão é um arquiteto de 28 anos que virou escultor, comprou a construção em 2010 e desde então mora nela enquanto reforma a estrutura interna, que estava em péssimas condições. A casa de três andares (que, segundo a lenda, era um bordel), hoje é a sede da Marso (www.marso.com.mx), que consiste num "espaço curatorial" inaugurado há poucos meses, um programa de residência de artistas e estúdios para os amigos do dono da casa.
O projeto faz parte de um cenário artístico emergente em Colonia San Rafael, bairro de classe operária decadente que, nos seus dias de glória, era o local preferido da elite da cidade, considerado a Broadway do México. Seu declínio começou nos anos 70, quando as mansões do século 19 de influência francesa foram abandonadas pelos moradores que preferiram fugir da nova linha de metrô, que tornou a região acessível a todos. Então, em 1985, um terremoto danificou vários cinemas da área e forçou a saída das famílias de classe média que restavam. O bairro virou um distrito da luz vermelha bem famoso, mas, ao mesmo tempo, os artistas tiveram que começar a sair de Colonia Condesa e Colonia Roma por falta de condições - e a linha de metrô , junto com os preços dessas belas casas, mesmo caindo aos pedaços, se tornaram cada vez mais atraentes.
As instituições também estão recuperando estruturas esquecidas. Um dos museus historicamente mais importantes, o Museo Experimental El Eco (Sullivan 43; 52-55-5535-5186; www.eleco.unam.mx) reabriu em 2005. Fundado no início dos anos 50, foi substituído por um bar gay antes que a Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM) comprasse o prédio e o reformasse. El Eco hoje apresenta vários tipos de trabalhos, desde a exibição de filmes de Godard ao ar livre à instalação do artista de Amsterdã Praneet Soi.
Logo na entrada de Santa Maria la Ribera fica o Museo Universitario del Chopo (Dr. Enrique Gonzalez Martinez 10; 52-55-5546-3471; www.chopo.unam.mx), outro projeto de restauração da UNAM para um antigo salão de exibição importado de Dusseldorf, na Alemanha, em 1902. A firma de Enrique Norten, a TEN Arquitectos, remodelou seu interior e hoje ele funciona como um espaço multidimensional para programas como o atual Festival Internacional de Diversidade Sexual, que oferece filmes, palestras e arte visual.
Esse revival também inclui donos de galerias independentes como Gerardo Contreras, diretor da Galeria Preteen (Joaquin Velazquez de Leon 58, interior 5; 52-55-2663-9070; www.preteengallery.net). O estúdio minúsculo, por onde se chega depois de atravessar um pátio cor-de-rosa, é imaculadamente branco. Numa visita recente, Contreras se desculpou pelo estado do piso, todo marcado pelos saltos altos das convidadas da última inauguração. "Estava lotado", diz ele. Batizada com a palavra pejorativa em espanhol para denominar os homens gays, a mostra traz livros de colorir tipo "una os pontos" que, quando preenchidos, revelam "cenas de sacanagem" de revistas de pornografia gay dos anos 70.
Logo ao lado, Brett Schultz e Daniela Elbahara abriram a galeria Yautepec (Melchor Ocampo 154-A; 52-55-5256-5533; www.yau.com.mx) em 2009, depois de procurar um espaço em Roma. "Só que os aluguéis são uma loucura de tão altos", lamenta Schultz.
No cenário artístico fragmentado de San Rafael, a Galeria Hilario Galguera (Francisco Pimentel 3; 52-55-5546-6703; galeriahilariogalguera.com) é a exceção, uma galeria bem estabelecida que atrai nomes como Damien Hirst e levou artistas mexicanos como Bosco Sodi à fama internacional. Foi uma das primeiras "a trazer o modelo de galeria norte-americano para o México" explica seu diretor, Mauricio Galguera.
"É estranho estar num bairro tradicional e popular e dar de cara com um prédio desses, sim", reconhece Galguera, "mas, considerando a história da área, tem tudo a ver".
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