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Preto à Porter

Um resgaste da realeza negra


Entre santos e orixás, 'Preto à Porter' mergulha no sincretismo religioso

Lucas Veloso

Colaboração para o UOL, de São Paulo (SP)

31/08/2021 11h00

A palavra-chave do segundo episódio de "Preto à Porter" é sincretismo. Desta vez, a produção busca saber: como São Sebastião passou a ser associado a Oxóssi no Brasil? Como São Jorge virou Ogum? Qual a conexão de São Jerônimo com Xangô? E ainda: que história é essa de Nossa Senhora Aparecida ser cultuada como Iemanjá?

Podem parecer simples rituais, mas pular as sete ondinhas no Réveillon, jogar flores para Iemanjá ou tomar banho de folhas dizem muito sobre a influência dos povos africanos no cotidiano de vários brasileiros, independentemente de sua religião. É isso que o episódio "Qual seu Axé" do programa dirigido por Rodrigo Pitta em parceria com MOV, a produtora de vídeos do UOL, explica ao receber especialistas de diversos credos.

Por anos o responsável pela Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, em Salvador (BA), padre Lázaro Fernandes explica como a Igreja Católica lida com misturas com outras religiões. Ele ganhou notoriedade por lotar missas com símbolos de religiões afro, como atabaques e pontos de candomblé. A ialorixá e antropóloga Nívia Luz ajuda a contextualizar como essa amálgama ocorre.

Já pai Urandi de Oxóssi e ialorixá Luciana de Oya explicam quais as diferenças entre o candomblé e a umbanda, cujas semelhanças e disparidades em suas cerimônias e ritos ainda confundem muita gente.

Preto à Porter também discute aspectos dolorosos da interação entre os diferentes credos no Brasil. Apesar de todas as contribuições das religiões de matrizes africanas no Brasil, ainda são comuns casos de intolerância religiosa, como ataques a terreiros e espaços considerados sagrados por fiéis.

De acordo com números do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, em 2019, houve um crescimento de 56% nas denúncias de intolerância religiosa no país.

Na Bahia, estado com maior concentração de pessoas negras, os crimes de intolerância saltaram 124% entre 2017 e 2018. De 2013 a 2019, a guinada chegou a 2.250%.

Para a ialorixá Luciana de Oya, os crimes representam, por um lado, o "prejuízo extremo para as religiões afro-brasileiras". Por outro lado, o maior número de denúncias é um avanço, pois sinaliza uma maior consciência, diz.

Já Pai Urandi relaciona intolerância à falta de conhecimento. "As pessoas costumam julgar de qualquer forma aquilo que não conhecem", pontua.

Na comunidade internacional, os constantes ataques à religiosidade são um problema tão grande, que há até uma data para reafirmar o respeito ao direito às liberdades de pensamento, consciência e religião. Celebra-se todo 22 de agosto o "Dia Internacional em Memória das Vítimas de Atos de Violência baseados em Religião ou Crença", criado pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU).

No Brasil, o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa é celebrado em 21 de janeiro para lembrar aos ataques sofridos por uma mãe de santo. A Lei 11.635, de 2007, instituiu a data em homenagem a Mãe Gilda, ialorixá vítima de intolerância religiosa em 1999, em Itapuã, na Bahia.

Morta em 21 de janeiro de 2000, Mãe Gilda foi vítima de um infarto fulminante. À época, a morte da ialorixá foi atribuída a um ataque feito naquele ano pelo jornal Folha Universal, da Iurd (Igreja Universal do Reino de Deus), que trazia na capa uma foto de Gilda acompanhada dos dizeres "macumbeira charlatã".

Em 2009, a Iurd foi condenada a pagar uma indenização de R$ 260 mil aos filhos e marido da líder religiosa. A medida foi imposta pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) em uma decisão contra a qual não cabia recurso.

Para falar sobre herança religiosa, o programa também aterrissou em Los Angeles (EUA), onde falou com as irmãs Flor e Luz Jorge, filhas do cantor e ator Seu Jorge. De lá, elas falam sobre suas infâncias no candomblé na Bahia, em meio às festividades, oferendas e rezas. Mesmo longe geograficamente do terreiro, as duas mantêm as tradições onde moram atualmente.

O ator Ícaro Silva dá as caras no segundo episódio de Preto à Porter, declamando a oração de São Jorge, um dos santos mais cultuados no Brasil. Ainda na Bahia, o fotógrafo e criador da festa "O Pente", Uran Rodrigues, bate um papo com a produtora cultural Licia Fabio e a chef de cozinha Dadá no Rio Vermelho para falar sobre Iemanjá.

A cozinheira ainda ensinou a Nossa, o canal de gastronomia do UOL, a receita de seu arroz de coco.

Onde assistir "Preto à Porter"
A série conta com episódios novos toda terça-feira transmitidos no Canal UOL. Ao longo de cinco capítulos semanais, o público poderá acompanhar histórias, entrevistas e conteúdos relacionados à existência negra, como religião, colorismo, pretos em posições de poder e ancestralidade.

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