Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Velozes e Furiosos 10 é uma carta de amor à imbecilidade
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Eu devia ter imaginado que precisaria de algum contexto anterior para assistir ao décimo capítulo de uma longa franquia cinematográfica, mas que nada. Não é necessária qualquer bagagem para curtir Velozes e Furiosos 10, pois o fiapo de história conta com o apoio de vários diálogos expositivos e algumas redundâncias para que ninguém se sinta pegando o bonde andando.
Nunca tive a oportunidade de prestigiar os episódios anteriores na íntegra —já tem mais de duas décadas que tento chegar ao fim do modorrento primeiro filme, sem muito sucesso. Mas parece que as coisas deram uma acelerada de lá para cá.
Velozes e Furiosos 10 é tão exagerado quanto uma saga que precisa de dez filmes para ser contada deveria ser. Até pelo fato de não haver história alguma —tudo é apenas motivo para explodir as coisas. E, pelo que pude entender, são cada vez mais coisas, e coisas cada vez maiores.
Estava lendo o livro Nação Dopamina da doutora Anna Lembke, um best-seller mundial. A médica explica de maneira didática uma questão contemporânea que se encaixa perfeitamente nessa poderosa jornada cinematográfica.
Segundo a ciência, a evolução da humanidade está nos deixando acostumados com prazeres fáceis demais que dão uma coceirinha gostosa no nosso cérebro. Em contrapartida, nos entediamos com uma rapidez fulminante quando somos convidados pela vida a lidar com os problemas que em outros tempos da sociedade civil seriam absolutamente corriqueiros.
A sucessão de explosões que entram numa espiral crescente absurda no filme é justamente para garantir que estaremos anestesiados de satisfação durante as mais de duas horas de exibição. E a falta de nexo ou uma profundidade maior dos personagens é também para nos poupar de maiores incomodações —ficamos só com "a parte boa" de um clássico de ação, com pancadaria, tensão e mais pancadaria.
Nesse sentido, Velozes e Furiosos 10 é uma carta de amor à imbecilidade. Digo isso sem juízo de valor, mas como contexto. É tudo concatenado para desligar o superego, criar uma sensação de prazer e regozijo. A missão é desanuviar a mente e projetá-la rumo ao completo abismo de qualquer sentido.
E isso rapidamente se torna uma experiência sensorial. Vin Diesel, mais do que nunca, está falando no mesmo tom da Menina Arroto do extinto Programa Pânico, o que gera um efeito parecido com os melhores vídeos de ASMR disponíveis na internet.
Ainda tem o Jason Momoa como vilão cretino e espalhafatoso rouba a cena, fazendo uma performance evidentemente inspirada no Bum de Fora, obscuro personagem da série A Vaca e o Frango da fase final dos estúdios Hanna-Barbera. Era um diabo vermelho que, como o nome promete, ficava com a bunda de fora.
Vários outros personagens surgem do nada e vão para lugar nenhum em seus arcos narrativos paupérrimos. A princípio, pensei que era uma sofisticada crítica às relações líquidas preconizadas por Sheila Mello em sua análise inspirada em Bauman, onde as pessoas passam pela vida das outras como se fossem água. Mas na verdade isso acontece pelo fato de Velozes e Furiosos 10 ser apenas o primeiro ato de uma suposta trilogia, e então o filme tecnicamente nem tem fim.
E se a Globo e a Record estão com problemas para contratarem famosos para seus realities, provavelmente é porque estão todos neste filme. Até a Ludmilla dá as caras em uma cena rápida, mas contundente.
Tirando os problemas de roteiro, que às vezes parece o delírio de um púbere de 11 anos (pelo menos em seus melhores momentos), também alguns equívocos das atuações e a produção nem sempre convincente, dá para dizer que é um filme perfeito para aquilo que se propõe: manter a indústria de tunning de automóveis pulsante e sustentar os hábitos caros da família de Vin Diesel e seus colegas. Por mim, tudo bem.
Voltamos a qualquer momento com novas informações.
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