Chico Barney

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Opinião

'Um Tira da Pesada 4' não chega a ser um filme: é um sintoma

Se o amigo leitor pensa que vai prestigiar pura e simplesmente mais um filme ruim ao clicar no botão de play em "Um Tira da Pesada 4: Axel Foley" da Netflix, está redondamente enganado.

O que acontece durante o processo, na verdade, é uma pororoca de sentimentos e sensações que funcionam como a culminação de décadas de precarização da experiência humana na Terra. E digo isso como um elogio.

É outra coisa muito além de um mero filme. É um sintoma do tempo em que vivemos.

Ao longo dos últimos anos, parte relevante da produção cultural, em geral, se tornou muito consciente a respeito de si mesma. Os blockbusters ficaram mais cínicos. Axel Foley retorna disposto a agradar quem sente saudades de tempos supostamente mais simples. E não faz concessões para isso: é tão simples quanto simplório, ainda que tremendamente bem executado.

Houve uma época em que filmes como Um Tira da Pesada eram sucessos, mas também criticados por representarem um tipo de produção excessivamente rasa, sem maiores referências. A roda girou e hoje esses filmes são as referências para toda uma geração de realizadores e também de audiência.

A quantidade de vezes que a famigerada música tema é executada ao longo do filme chega a parecer uma piada por si só. Os produtores não querem que você esqueça, em momento algum, que pode relevar qualquer morosidade do ritmo da ação, eventual infâmia do roteiro ou bola quadrada das atuações por conta do inebriante carinho que a nostalgia faz em nosso encéfalo.

A nova aventura de Axel Foley segue uma tendência que promete continuar ditando os rumos do entretenimento no futuro. Se até pouco tempo atrás havia o desejo de pegar personagens antigos e atualizá-los para os novos tempos, o foco agora é pegar personagens antigos e deixá-los do mesmo jeitinho que haviam sido abandonados nos anos 80 e 90.

Os algoritmos estão há anos atrofiando os horizontes da sociedade, empanturrando as pessoas com conteúdo que reforce seus pontos de vista já plenamente sedimentados. Não querem ser desafiadas pelo consumo de produtos da cultura pop. Preferem pisar em terreno conhecido, sob o ponto de vista ideológico, cultural e sensorial. Para chegarem ao fim da exibição dizendo "uau" como reflexo, e não como assombro sincero.

Então ao apertar o botão de play em "Um Tira da Pesada 4: Axel Foley", caro leitor, saiba que são eles que estarão apertando botões em você! Como um alimento ultraprocessado, não há nada de genuíno ali -apenas ingredientes preparados para atiçar as papilas gustativas do coração. Eu adorei.

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"The Heat Is On", diz a canção. Por mais agradável que seja assistir ao retorno do Beverly HIlls Cop em 2024, o clima nunca esteve tão morno.

Voltamos a qualquer momento com novas informações.

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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