Confusa e sem nexo, 'Mania de Você' é a melhor coisa da TV em 2024

O confuso folhetim de João Emanuel Carneiro é um exemplar pioneiro na era da pós-coesão. A mera concatenação de eventos já não nos satisfazem mais: como estamos viciados em dopamina, "Mania de Você" não é para entender, é para sentir.

Ah, e como sentimos durante a exibição de cada capítulo. Sinto muito! Sinto horrores! Vergonha alheia! Raiva! Constrangimento! E até culpa —não poderíamos estar ocupando nosso tempo com outra coisa?

Muita gente está. A trama infelizmente não é o sucesso que se espera de uma novela das 21 horas. Está em um patamar até abaixo do que seria um fracasso esperado na faixa. Mas como eu não sou acionista da Globo, deveria estar preocupado?

Que nada! Detesto quando as discussões sobre produtos da indústria cultural percorrem apenas o rame-rame de audiência, bilheteria, visualizações, streams.

A vida não cabe no algoritmo! E Mania de Você também não —fui dar uma olhada no Globoplay e o carro-chefe da emissora está em um perigoso oitavo lugar entre as produções mais assistidas da plataforma, quase caindo para fora da caçamba do top 10.

Os aspectos que os jovens chamariam de cringe são justamente a melhor coisa da novela. Viola ficou uns dias sumida, virou melhor amiga do sujeito que roubou seu celular e agora é a coordenadora geral de um orfanato, ou abrigo, ninguém entende direito.

E transformou o espaço em uma lona cultural. Existe um núcleo circense na outrora soturna trama de suspense, e vida que segue. Mesmo laureada como grande chef e tendo trabalhado em ótimos restaurantes, só conseguiu uma vaga de faz-tudo na Biroska da Rainha, onde precisa tirar do próprio bolso a grana para comprar ingredientes.

A grande virada para Rudá, que continua foragido e inseguro, foi cortar o cabelo e tomar um banho. Mavi segue querendo cometer maldades sem objetivos muito planejados, ele apenas vai —improvisando como Chay Suede está fazendo em todas as cenas. E a Luma toda semana se surpreende quando descobre que Mavi é ruim mesmo —ela parece a Dory de Procurando Nemo.

Sobre a Mércia, prefiro não comentar: é o papel mais desafiador da carreira de Adriana Esteves, pois a personagem tecnicamente apenas existe —mais ou menos como o Tuco de "A Grande Família", mas sem a responsabilidade de representar uma geração.

É tudo encantador. O insistente telespectador pode ficar emburrado procurando motivações lógicas ou premissas factíveis. Recomendo apenas se deixar levar pela hora mais divertida, doidivanas, lúdica e aleatória do dia.

A vida já anda muito complicada na contemporaneidade. Mania de Você também é muito complicada, mas pelo menos não é problema nosso.

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