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Em Cannes, premiação 'Um Certo Olhar' mira os desafios da juventude
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Um filme sobre crescer na periferia de uma cidade também periférica (a portuária Boulogne-Sur-Mer, no norte da França) da França, um microcosmo para se tratar do desafio de ser jovem em um mundo de famílias disfuncionais, com os novos desafios de um mundo cada vez mais conectado, mas com os velhos preconceitos de um mundo antigo, em que beijar vários garotos do bairro é motivo para ser considerada uma "vagabunda", em que a maternidade muitas vezes chega precocemente, em que muitas vezes o desafio de ser mãe vem marcado pelo desafio de sobreviver em uma sociedade que vira as costas para os mais fragilizados economicamente.
Em meio a tudo isso, um filme dentro de um filme. Foi para este projeto que o júri da mostra 'Um Certo Olhar' (Un Certain Regard), a segunda mostra mais importante do Festival de Cannes, deu seu prêmio máximo, entregue na noite desta sexta.
O filme em questão? "Les Pires"(ou Os Piores), de Lise Akoka e Romane Gueret. Filmado com estilo entre o documental e a ficção, conta a história de três jovens "problemáticos" do bairro (os piores do título) que integram um programa de educação e acompanhamento psicológico e social. Eles são escolhidos por uma equipe que vai rodar um longa-metragem no bairro, e o diretor faz questão de escalar jovens não atores profissionais do próprio local para "dar mais verdade" à história.
Na trama dentro da trama, Ryan (Timéo Mahaut) — maravilhoso no papel, vive o irmão mais novo de Lily (Mallory Wanecque), uma adolescente grávida do namorado, aos 15. O talento, as dores, o histórico de cada personagem vai se revelando aos poucos ao público, que nunca tem exata noção do que é real e o que é ficção, mesmo dentro da própria ficção no filme.
Um formato engenhoso, irregular, mas cheio de frescor para, também, fazer pensar nas histórias preconcebidas que formamos de jovens que, muitas vezes, são considerados violentos, problemáticos e "sem futuro" em uma sociedade.
Curiosamente, Cannes este ano pode ser vencida por dois filmes falados em francês.
"Les Pires" é uma produção francesa, e o mais cotado para levar a Palma de Ouro na noite do sábado é o "Close", falado em francês e passado na Bélgica. O filme é dirigido pelo jovem cineasta belga Lukas Dhont (que já foi premiado na 'Um Certo Olhar' com o longa "Girl" ("O Florescer de uma Garota"), em 2018, que venceu a Caméra D'Ór (prêmio ao melhor diretor estreante em longas) e a Queer Palm (dada a filmes de temática LGBTQ+). Curiosamente, "Close" também é protagonizado por jovens e trata, entre outros temas, do desafio de crescer e encarar questões como homofobia, bullying e luto.
As Palmas serão conhecidas em breve e, claro, haverá, como sempre, contestação sobre a escolha do júri, que neste ano é presidido pelo ator francês Vincent Lindon. Por ora, a discussão fica por conta da Certain, cujo favorito da crítica e do público era o "Joyland", de Saim Sadig, o primeiro filme paquistanês da história a competir na seleção oficial de Cannes. A equipe do filme e a plateia que estiveram presentes na premiação ficou visivelmente decepcionada com "apenas" o Prêmio do Júri.
"Joyland" também traz a temática LGBTQ+ e conta a história de um homem casado que se apaixona por uma mulher trans.
Os demais prêmios da mostra 'Um Certo Olhar' foram para a atriz Vicky Krieps (de "Trama Fantasma" e "Tempo") por sua atuação em "Corsage" (outro filme que arrancou muitos elogios do público e crítica), de Marie Kreutzer. O ator Adam Bessa, de Harka, dividiu o prêmio com Krieps.
Já o prêmio de melhor direção foi para Alexandru Belc por Metronom e o "Coup de Coeur" (o "filme do coração" do júri) foi para Rodeo, de Lola Quivoron.
Uma certeza há nesta edição de Cannes. Seja na 'Um Certo Olhar' ou na seleção que concorre à Palma de Ouro, jovens em momentos cruciais de suas vidas e os tantos desafios de se entender no conturbado mundo contemporâneo ganharam o coração da comissão de seleção e certamente ganharam também o coração do júri.
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