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Popular e também autoral, 'A Filha do Palhaço' vence Mostra de Gostoso
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"A Filha do Palhaço", de Pedro Diógenes, foi o vencedor da Mostra de Cinema de Gostoso 2022, em São Miguel do Gostoso (RN). Produção cearense estrelada pela jovem Lis Sutter e pelo ótimo Demick Lopes (de "Greta"), além de Jesuíta Barbosa, o filme conta a história de reencontro e reconciliação entre um pai e uma filha que mal se veem desde que ele saiu de casa quando ela, agora com 14 anos, era praticamente um bebê.
O detalhe interessante é que o longa também foi premiado pelo júri da crítica que acompanha o festival realizado na cidade litorânea do Rio Grande do Norte, como um dos casos de produção brasileira que tem ousadia formal para chamar atenção dos profissionais e também a capacidade de emocionar o público. Na trama, Lis Sutter vive a garota Joana, que vai passar uma semana com o pai Renato (Demick), um humorista que apresenta seus shows em churrascarias, bares e casas noturnas de qualidade bastante questionáveis de Fortaleza interpretando a personagem Silvanelly.
Eles são praticamente dois estranhos, mas é justamente o estranhamento entre duas pessoas profundamente ligadas que garante a humanidade que emociona em "A Filha do Palhaço". Sem contar que o roteiro, simples mas nada simplista, tem humor, drama e poesia, que ganham mais camadas com a direção também simples, mas engenhosa de Diógenes, que sabe explorar elementos muito brasileiros (como um certo ar kitsch, cafona, mas autêntico) com respeito e afeto.
É o caso, assim como toda a ótima programação do festival, do cinema brasileiro que floresce e revela histórias que contam mais do Brasil para um público que nem sempre tem acesso às salas de cinema.
Realizada na praia do Maceió, com uma estrutura que não deixa nada a desejar às grandes salas do circuito comercial (e com a vantagem de ter o luar como testemunha, além de uma tela de 12m x 6,5m, projeção com resolução 2K e som 7.1), a Mostra de Gostoso revela a cada ano que eventos culturais locais como este têm eco nacional e formam o olhar de um público que quer ver sim suas histórias na tela.
Este desejo se confirma também pelo fato de que, excepcionalmente, uma menção honrosa do público foi dada para "Noites Alienígenas", de Sérgio de Carvalho. Primeiro longa do Acre a competir e vencer o Festival de Gramado em agosto, o filme não é uma história nada óbvia.
Apesar de forte cor local, pois trata da juventude da periferia de Rio Branco e de seus desafios para superar a exclusão social e sobreviver à violência e às facções criminosas do Sudeste que têm invadido cada vez mais as capitais do Norte do País, "Noites Alienígenas" dialoga com o público, e principalmente os jovens de um Brasil que vê poucas oportunidades para sua juventude que nasceu sem privilégios.
A votação entre "A Filha do Palhaço" e "Noites Alienígenas" foi apertada e sinaliza, mais uma vez, que o brasileiro está antenado ao que ocorre não só em sua pequena aldeia, mas em todo o Brasil. Ao contrário do que muitos querem acreditar, as histórias brasileiras interessam sim ao brasileiro.
Outra prova? "Marte Um", filme de abertura de Gostoso 2022 (exibido fora de competição, pois já estreou em circuito), emocionou uma plateia que viu na tela uma história de uma família brasileira comum, de personagens negros, também periféricos que, apesar de viverem em um país que não os prioriza em suas políticas públicas, sonham, lutam, vivem.
O filme dirigido por Gabriel Martins representa o Brasil na corrida ao Oscar 2023 e diretor e elenco viajam na próxima semana para Los Angeles, onde participam da campanha para promover o filme em Hollywood e tentar a sonhada vaga ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro 2023. A corrida é difícil, pois a safra atual de filmes internacionais é ótima e o cinema latino-americano tem também o excepcional "Argentina 1985" ( em cartaz na Amazon Prime Video) no pária.
Entre os curtas, Gostoso 2022 também sinalizou um importante recado para o Brasil profundo. "Ela Mora Logo Ali", de Fabiano Barros e Rafael Rogante, foi eleito o melhor curta-metragem segundo o júri popular e também comprovou que há sim cinema em Rondônia. Realizado com recursos obtivos por meio da Lei Aldir Blanc de incentivo à cultura, o filme é uma produção enxutíssima, mas competente e comovente, que retrata a luta de uma vendedora ambulante de bananas fritas para sustentar a casa. Quando ela conhece uma jovem que todos os dias lê um certo "Don Quixote" no ônibus em seu trajeto de volta para casa, um mundo se abre para ela, que é analfabeta mas está disposta a contar a história fascinante para seu filho.
Já a crítica premiou "Ainda Restarão Robôs nas Ruas do Interior Profundo", de Guilherme Xavier Ribeiro, na categoria curta-metragem. Realizado em Assis, no oeste paulista, o filme revela uma história que é puro cinema, com direção ousada, atmosfera e a intersecção entre um Brasil agrário e aparentemente parado no tempo com um Brasil que se moderniza, mas não sem sofrer com as questões que também afetam as já citadas juventudes das grandes cidades.
A curadoria da Mostra de Gostoso tem olhar atento e traça esta linha que conecta os tantos Brasis, seja qual região for, que enfrentam as questões de um mundo contemporâneo complexo, mas fascinante.
"Estamos muito felizes em termos conseguido realizar a 9ª edição, com as presenças de tantas pessoas, como realizadores, atores, diretores, jornalistas, críticos, público em geral, sendo muitos de vários estados brasileiros e que elogiaram muito a programação", comentou Eugênio Puppo, diretor da mostra.
"Nossa Mostra é uma das últimas mostras que acontece no final do ano, e nós temos esse olhar para com a produção independente, não só para os filmes escritos, mas os que são exibidos em outros festivais e principais produtoras, de modo que essa é uma curadoria sempre mais complexa de se fazer por conta disso, por conta desse olhar para toda a produção do cinema independente brasileiro do ano", completu Puppo.
Confira todos os vencedores da Mostra de Cinema de Gostoso:
Prêmio da Crítica
Longa-Metragem - A Filha do Palhaço, de Pedro Diógenes
Curta-Metragem - Ainda Restarão Robôs nas Ruas do Interior Profundo, de Guilherme Xavier Ribeiro
Prêmios do Júri Popular
Melhor Longa-metragem
A filha do Palhaço, de Pedro Diógenes
Melhor Curta-Metragem
Ela Mora Logo Ali, de Fabiano Barros e Rafael Rogante
Menção Honrosa
Noites Alienígenas, de Sérgio de Carvalho
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