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Scorsese volta a Cannes 38 anos depois, com 9 minutos de aplausos animados
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Foram 38 anos para que, finalmente, Martin Scorsese voltasse ao Festival de Cannes. Desde 1985, quando exibiu "Depois de Horas", que lhe deu um prêmio de melhor direção, o cineasta não integrava a programação do maior e mais importante festival de cinema do mundo, que ocorre na França até o próximo fim de semana.
Scorsese voltou hoje com seu novo —e aguardadíssimo— filme, "Killers of the Flower Moon" ("Assassinos da Lua das Flores", em tradução livre), exibido fora de competição. Estava acompanhado de Leonardo DiCaprio, Robert De Niro, Jesse Plemons, além da atriz de origem indígena Lily Gladstone.
O cineasta recebeu nove minutos de aplausos ininterruptos, o recorde do evento até o momento.
Pode parecer mero detalhe, mas o badalado "Indiana Jones e a Relíquia da Morte", que estreou na quinta em Cannes, recebeu protocolares seis minutos de aplausos e o filme de abertura, "Jeanne Du Barry", estrelado por Johnny Depp, também teve pouco mais de cinco minutos de palmas apenas educadas.
Já "Killers of the Flower Moon" arrancou palmas sinceras e empolgadas, diante de um Scorsese emocionado que, aos 80 anos, não só continua em ótima forma como avança em sua proposta de se dedicar a um novo capítulo em sua obra: a história e a constituição da sociedade norte-americana calcada no racismo, no desrespeito, desumanização e no genocídio da população indígena.
"Obrigado a vocês. Obrigado aos Osage (povo indígena retratado no longa), a todos os envolvidos com o filme. Meus velhos amigos Bob e Leo, Jesse e Lily. Rodamos este filme há alguns anos em Oklahoma. Demorou para que ele chegasse. A Apple (o filme é da Apple com a Paramount) fez muito bem por nós. Tivemos muita verba. Eu sou nova-iorquino. Fiquei muito surpreso. Foi uma experiência incrível. Nós vivemos aquele universo", declarou Scorsese ao final da sessão diante da plateia.
O longa
O filme é baseado no livro de "Killers of the Flower Moon: The Osage Murders and the Birth of the FBI" ("Assassinos da Lua das Flores: Petróleo, morte e a origem do FBI"), em que o autor David Grann trata do caso real de uma série de assassinatos ocorridos na região de Osage Nation, em Oklahoma, nos anos 1920.
O longa parte da história de um atrapalhado e matuto Ernest Burkhart (Di Caprio), que, ao voltar do front da Primeira Guerra Mundial, vai viver com seu tio Wiliam Hale (De Niro), um poderoso fazendeiro da região de Osage.
"Terra indígena", como o próprio Hale repete à exaustão, a cidade abriga o povo Osage, que enriqueceu devido aos tantos poços de petróleo que foram descobertos em suas terras.
Invejados, cobiçados e alvo de intrigas da população branca local, os Osage vivem um tanto quanto distraídos do mal que os cerca. Burkhart, que não tem uma inteligência muito avantajada, vai trabalhar como taxista e acaba conhecendo a jovem indígena Mollie Kyle (Lily Gladstone, de "Certas Mulheres", de Kelly Reichardt), detentora de uma fortuna que divide com a mãe e suas três irmãs.
Ela é silenciosa, observadora e perspicaz. Não por acaso, ao conhecer Burkhart (DiCaprio), batiza o motorista de coiote. E não por acaso ele se revela de fato um predador. Eles se apaixonam e, a priori, levam uma vida feliz, mas o veneno que o tio inocula em pequenas doses diárias no coração e mente de Burkhart deteriora a relação.
Típico idiota útil, é facilmente manipulado pelo tio maquiavélico e perverso, que tem um plano velado de poder para aniquilar os Osage e usurpar suas riquezas. Quem surge em cena para sabotar os planos de Hale é um agente do FBI, vivido por Jesse Plemons, que é enviado à cidade pelo então presidente dos Estados Unidos depois que os Osage fazem uma peregrinação a Washington pedindo ajuda para que, já que a polícia local não se move, sejam investigadas as tantas mortes suspeitas de seu povo.
Ainda que seja uma história real, vale poupar, por ora, os pormenores de um roteiro que rendeu um longa de mais de três horas e meia e que leva um tempo quase de romance histórico para contar com calma e riqueza de detalhes sórdidos os fatos que, a exemplo de tantos outros na história dos países colonizados (como o próprio Brasil), relativizaram o assassinato dos povos nativos e foram convenientemente esquecidos.
"Killers of the Flower Moon" traz um Scorsese com amplo domínio de seu cinema, com doses de humor, sarcasmo, violência e até de filme de tribunal. Ainda que longo, justifica sua duração e foi bem acolhido também pela crítica especializada que acompanha o Festival de Cannes.
Vale lembrar que este é o sexto filme que DiCaprio filma com Scorsese e o décimo longa de De Niro com o diretor, que levou com "Taxi Driver" a Palma de Ouro em 1976. Depois disso, Scorsese voltaria a Cannes com "O Rei da Comédia", em 1983. Antes, em 1974, competiu com "Alice não Mora mais Aqui", que deu o prêmio de melhor atriz para Ellen Burstyn. Dito isso, não é exagero afirmar que a corrida ao Oscar 2024 começa com tudo e com "Killers of Flower Moon". E que DiCaprio, De Niro e, principalmente, Lily Gladstone têm já suas vagas praticamente garantidas.
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