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'Viva Lula': Karim Aïnouz exalta Brasil e celebra 'Firebrand' em Cannes
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"Viva o Brasil, viva o cinema brasileiro, viva o Lula e viva a Argélia", disse o cineasta brasileiro Karim Aïnouz ao final da première mundial de "Firebrand" na noite deste domingo no Festival de Cannes.
Mesmo assinando uma produção europeia, o cineasta, que venceu a mostra Um Certo Olhar de Cannes em 2019 com "A Vida Invisível", fez questão de lembrar do Brasil diante de uma seleta plateia do cinema mundial.
Primeiro filme internacional de Karim, a produção concorre à Palma de Ouro e é toda falada em inglês. "Firebrand" conta a história da rainha Katherine Parr (Alicia Vikander), a última das seis mulheres de Henrique 8º, vivido por um Jude Law quase irreconhecível, grosseiro, abusivo e violento.
Em conversa com Splash em Cannes, o cineasta comentou:
"Estou muito feliz. Tem uma espécie de uma alegria infinita de poder estar na competição, de voltar para cá depois de dois anos, sentindo que tem uma temperatura boa em torno do filme. Ao mesmo tempo, queria que pudesse ser um filme brasileiro. Estou navegando. É estranho estar na competição pela primeira vez com um filme que não é em português. Então estou negociando essas emoções, mas são todas muito boas."
Aplaudido com entusiasmo em Cannes, "Firebrand", que poderia ser traduzido como brasa, é um retrato original com a assinatura precisa de Karim, que não tratou o tema histórico com cerimônia, mas sim com humanidade, com a câmera sempre próxima dos personagens, principalmente de Vikander, que vive uma rainha jovem, inteligente, ousada e desafiadora.
O filme
Pode parecer exagero, mas Katherine Par encarou o terror de se casar com um homem poderoso que já tinha decapitado duas mulheres (incluindo Ana Bolena) antes de se casar com ela. A trama do filme começa com Katherine como regente, durante uma das batalhas contra a França no século 16. Ela, que tem ideias protestantes e acredita numa fé mais democrática, em uma igreja mais próxima do povo, que nem mesmo tem o direito de ler a Bíblia em inglês.
A atitude ousada de Katherine, ao apoiar uma amiga de infância líder do movimento reformista, coloca a rainha em perigo real.
Mesmo trazendo um período crucial para a história —não só dos Tudors, nem da Inglaterra, mas do mundo como o conhecemos—, "Firebrand" não tem de forma alguma tom de drama histórico protocolar ou solene. Tanto o tratamento de linguagem, fotografia quanto o roteiro dão ao longa a relevância para tratar de questões que dizem respeito ao mundo contemporâneo, principalmente a condição, e a revolução, feminina.
O retrato que um brasileiro faz de uma história tão emblemática para a Europa é, naturalmente, particular, mas muito bem vindo, em tempos que sinalizam que talentos nacionais transitam cada vez mais por uma nação internacional do cinema.
"É um pouco o que os chilenos estão fazendo e os mexicanos fizeram. É legal a gente poder estar trabalhando globalmente, contando histórias que não são de lugares de onde a gente veio, mas que vão ser contadas com nosso sotaque", disse o diretor a Splash.
Um brasileiro contar a história da monarquia inglesa é muito diferente de um inglês contar. Certamente há uma marca que é o jeito que a gente fala. Não o sotaque literal, mas certamente a gente fala de um jeito que não é o jeito inglês. Então, é bacana sim e dá uma sensação de que a gente está num lugar em que pode fazer estas escolhas
Sobre o início do projeto, o cineasta explicou que surgiu em um momento específico. "Este projeto veio em um momento muito difícil da minha vida, que foi a eleição do fascismo em que todas as fontes de financiamento público foram cessadas, interrompidas", disse.
"E veio também da minha vontade de fazer um filme para o mercado de língua inglesa, o maior do mundo, vontade de experimentar. Veio também da repercussão e interesse que 'Vida Invisível' teve e também do convite de uma produtora para retratar a Katherine Par", explicou ele.
No princípio, Karim não se interessou muito. "Pensei no porquê de falar de uma rainha com tanta gente para falar no mundo. Mas quando ela propôs, entendi que falar de rainhas e reis ainda dá muito certo comercialmente. E pensei em como eu poderia falar de uma rainha de um jeito interessante. E ela, a produtora, me deu um livro, que conta a vida toda dela. Eu até fiz aula sobre ela. E fiquei me perguntando por muito tempo se eu tinha legitimidade, se eu era a pessoa ideal", contou Karim.
Do convite, Karim reescreveu o roteiro que estava sendo preparado e entendeu o que fez com que a produtora o convidasse: foi a paixão dela por seus filmes anteriores e pela compreensão de seu cinema. A percepção de que ele iria contar a partir de um ponto de vista original, principalmente sua forma de contar histórias de personagens femininas.
Eu me interessei por uma parte da vida dela, em que ela sobreviveu ao marido. Eu não olhei para os personagens como realeza, pois um membro da realeza parece quase sobre-humano. Em 2023, não faz mais sentido. Eu olhei para eles como olharia qualquer ser humano.
"Este filme é uma mistura de thriller com drama doméstico. A história de um cara abusivo, absolutamente instável, quase morrendo, com histórico de feminicídio gigante dentro da própria família. Então, o segredo foi olhar para eles com humanidade, de igual para igual, sem pensar em que estava fazendo o filme de uma rainha. Estava fazendo o filme de uma pessoa, que tem o mesmo coração de qualquer mulher."
O fato de ser um filme intimista, que, apesar das questões políticas, tem a ação centrada em ambientes domésticos, como o quarto do rei, da rainha, confere o tom de drama familiar, mas o tempo todo tenso, caminhando pelo fio da navalha.
"Eu pude ter uma intimidade com estes personagens que raramente a gente vê, desmitificando. O que me fascina é a dinâmica deles, pelo que ela luta e não um deslumbre pela realeza", concluiu Karim.
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