Bernstein de Cooper vai além de nariz fake e bissexualidade: 'Liberdade'
Bradley Cooper é um cara obcecado por seus projetos. Não só estava determinado a estrear mundialmente "Maestro", que ele dirige e protagoniza no Festival de Veneza 2023, como cuidou de cada etapa da cinebiografia de Leonard Bernstein.
Do roteiro à caracterização, passando por realmente aprender a reger, Cooper estava obstinado em praticamente se tornar o compositor, regente, educador, pianista, apresentador de TV, filantropo, entre outras funções, que integra a lista dos músicos mais importantes não só dos Estados Unidos como da música internacional no século 20.
A determinação era tamanha que o cineasta e ator passava de duas a cinco horas por dia na maquiagem para não só rejuvenescer ou envelhecer, conforme a fase da trama, mas também para colocar a prótese de nariz que ele usou em cena. Mas o trabalho de definir como e qual seria a maquiagem ideal começou dois anos antes das filmagens.
"A gente começou a conversar no início de 2020, mas a pandemia [covid-19] começou. Chegou agosto de 2020 e a pandemia se estendeu. Durante esse tempo todo, eu fazia testes de maquiagem e testes de filmagem para encontrar a resposta. Finalmente a gente começou a filmar em maio passado", diz o maquiador Kazuo Hiro na conversa com a imprensa neste sábado (2), quando "Maestro" faz sua estreia no festival.
E cada look levou bastante tempo, para a gente entender o material, a aparência, tanto mais jovem quanto mais velho, para que tudo ficasse o mais natural e verossímil possível. Kazuo Hiro
Apesar de ser a alma, o cérebro e a cara de "Maestro", Cooper não representa seu trabalho em Veneza neste ano por causa de sua solidariedade à greve dos atores de Hollywood. Ainda que o sindicato dos atores (SAG-AFTRA) impeça que os intérpretes participem de eventos e deem entrevistas, Cooper, como diretor, poderia estar presente, mas optou por não.
O SAG-AFTRA abriu algumas exceções em casos de filmes de estúdios independentes, como o caso de Adam Driver, de "Ferrari", e Jessica Chastain, de "Memory", ambos em competição em Veneza. Mas "Maestro" estreia em breve na Netflix e isso o exclui da lista de exceções.
Sobre a polêmica em relação à prótese de nariz, que foi motivo de críticas por ser interpretada por internautas como um preconceito contra judeus e ser chamada de "jewish face", ou seja, usar um estereótipo, o do nariz grande, para retratar um personagem judeu, Kazuo Hiro, pontuou:
Não estava esperando por isso. Peço desculpas se feri os sentimentos de alguém. Eu queria retratar Lenny [Bernstein] o mais real possível. Ele é fotogênico e uma grande pessoa. A gente sempre quis respeitar e amar seu visual. Fizemos muitos testes para isso. Esta era nossa única intenção.
As associações judaicas, aliás, como a Anti Defamation League (Liga Antidifamação), uma organização judaica internacional, e a própria família de Bernstein já haviam saído em defesa de Bradley Cooper, que não é judeu.
Presente em Veneza, uma das filhas do maestro, Jamie Bernstein, ao lado de seus irmãos, Nina e Alexander, já havia afirmado via Twitter que Cooper havia incluído a família em cada etapa do projeto e que foi uma jornada incrível a de realizar um filme sobre seu pai.
"A ideia de fazer uma cinebiografia do meu pai existe há tempos, mas Bradley trouxe uma visão original, trouxe sua proposta. A partir do momento em que embarcamos em sua ideia, ele teve toda liberdade para criar sua obra, mas sempre nos incluiu, sempre foi muito participativo o processo", conta ela, que é autora do livro "Famous Father Girl"A Memoir of Growing Up Bernstein", que serviu de base para o roteiro, além de outras fontes de pesquisa, assinado por Cooper e pelo vencedor do Oscar Josh Singer (de "Spotlight").
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Quero receberA ideia principal que Cooper trouxe foi a de não realizar uma cinebiografia convencional, mas focar principalmente na relação entre Bernstein e Felicia Montealegre Cohn (Carey Mulligan). O maestro e a atriz se conheceram muito jovens e ficaram 30 anos juntos.
Os primeiros anos de encantamento se tornaram críticos à medida que, com o passar do tempo e o sucesso cada vez maior de Bernstein, ele foi trazendo novos personagens para o jogo. Bissexual, o regente era apaixonado por Felicia, mas não se sentia completo somente com o casamento convencional e passou a ter casos extraconjugais.
Ainda que Felicia sempre soubesse e aceitasse esses amores do marido, com quem se casou em 1951, ela também nunca esteve exatamente satisfeita com a relação, chegando a se separar dele por um ano. Mesmo vivendo paixões com mulheres e homens, são suas relações com jovens rapazes que ganham atenção em "Maestro", despertando, com delicadeza e respeito, a discussão sobre a bissexualidade do regente e até mesmo sobre o preconceito da época.
Questionada sobre uma conversa que a personagem Jamie tem com o pai no filme sobre o quanto ele nega um dos casos mais famosos com um jovem, Jamie, a real, comentou que isso de fato ocorreu e que trata disso longa e francamente em seu livro.
"Bradley leu meu livro. Foi assim que ele descobriu o incidente. Não sei se minha mãe o aconselhou a negar os rumores. Não sei porque meu pai decidiu negar tudo, mas este é meu palpite. No meu livro, eu também falo bastante disso, sobre o que meus irmãos e eu passamos, sobre como foi descobrir que nosso pai era bissexual e como ele lidava com sua própria sexualidade", revela Jamie.
Foi um processo para nós, um desafio e confuso. Mas, de qualquer forma, o amor e a conexão que havia na nossa família, e ainda havia, foi capaz de nos conectar e unir diante de cada situação enfrentada. E a gente enfrentou tudo e se apoiou um no outro como uma família. Jamie Bernstein
A propósito, a decisão de Cooper de focar menos na questão profissional de Bernstein, ou em seus erros, e mais no amor e no perdão, se revela acertada e direcionada ao grande público. Não é necessariamente preciso saber sobre suas composições, nem mesmo que ele é o autor do aclamado "West Side Story", que redefiniu o gênero musical, para embarcar na jornada de Felicia e Lenny.
"Esta foi uma escolha de Bradley. Uma vez que ele ganhou permissão para fazer esse filme, a gente estava fora e era o filme dele. Ele escolhe contar esta história intimista sobre os nossos pais. A gente não esperava isso. Não imaginávamos que ele nos incluiria no processo", conta Jamie.
Mas, conforme o processo avançou, ficou claro para ela e para toda a família que o ator era perfeito para o papel. "No processo de a gente ver este filme ser feito, ficou mais e mais obvio para nós como Bradley parece com nosso pai, seu foco é paixão, compromisso e compartilhar este amor que tem com todos."
Entendemos que este era o cara para fazer este papel. Seria sua história pelas lentes deste cara, uma jornada emocional. Para Bradley, era crucial que o filme tivesse temas universais, temas que acontecem com muita gente, em qualquer tempo, em qualquer idade. Jamie Bernstein
Produzido por Martin Scorsese, Steven Spielberg (que recentemente dirigiu a nova versão do longa "West Side Story"), Fred Berner, Amy Durning e Kristie Macosko Krieger, "Maestro" estreia em breve na Netflix.
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