'Maestro' traz Bradley Cooper forte para o Oscar em cinebiografia incomum
"Maestro", a priori, é a cinebiografia de Leonard Bernstein, o grande compositor, regente, educador, pianista, apresentador de TV, filantropo, entre outras funções, que integra a lista dos músicos mais importantes não só dos Estados Unidos como da música internacional no século 20.
Produzido por Martin Scorsese e Steven Spielberg (que recentemente dirigiu a nova versão do longa "West Side Story"), "Maestro" é o segundo longa dirigido por Bradley Cooper (que também interpreta o protagonista) e estreia nos cinemas nesta semana — e em 20 de dezembro, na Netflix — com a promessa de ser um dos fortes candidatos na corrida ao Oscar 2024. No entanto, mais que da trajetória profissional ou criativa de Bersntein, o longa trata principalmente da relação entre o maestro e Felicia Montealegre Cohn (Carey Mulligan), sua companheira de toda vida.
Talvez seria até mais justo se o filme se chamasse "Leonard e Felicia". É por meio das tantas fases do relacionamento entre o músico e a atriz que a narrativa se desenvolve. Felicia foi seu grande amor e a relação com a atriz permeou toda a trajetória do músico revolucionário, que, além de mudar a hstória da música, também ousou ao assumir sua bissexualidade em tempos em que o moralismo e o conservadorismo eram muito mais intensos nos EUA e no mundo.
A história começa quando Bernstein, ainda um jovem e não famoso maestro, recebe um telefonema urgente para reger, como substituto, a Filarmônica de Nova York na mesma noite, pois o regente oficial estava doente. Ele, que abriu o filme em cenas de carinho com um então "amigo especial", aceita, obviamente, na hora e faz uma apresentação histórica, como a do revolucionário "Missa". A partir daí, torna-se uma celebridade imediata e sua vida nunca mais seria a mesma.
Pouco tempo depois, em uma festa, conhece Felicia, que era uma jovem atriz bastante prestigiada, e mais uma vez sua vida mudaria para sempre. Quando suas trajetórias se cruzam, passam a seguir juntas, ainda que com altos e baixos e algumas interrupções, por 30 anos. É esta relação, é a vida de Bernstein permeada pela presença de Felicia, que "Maestro" nos traz.
Quem espera uma cinebiografia clássica, quase didática, sobre as criações e a carreira de Bernstein, ou vai se decepcionar ou se surpreender ao encontrar outra história. Os pontos cruciais da carreira do autor de "West Side Story" estão na tela, mas até mesmo o musical ocupa apenas alguns acordes na trama. É a relação do casal, as contradições da personalidade pública e privada de Bernstein e o quanto uma esfera contaminava a outra que são o centro de "Maestro".
Dos primeiros anos de encantamento entre o casal, a trama e a relação evoluem para as primeiras crises, quando o sucesso cada vez maior de Bernstein passou a entrar pela porta da casa dos Bernstein e trazer cada vez mais novos personagens para sua vida e para a vida da família. Bisexual assumido, o regente era apaixonado por Felicia, mas não se sentia completo somente com o casamento convencional e passou a ter casos extraconjugais.
Felicia sabia e aceitava esses casos do marido, com quem se casou em 1951, mas nunca esteve exatamente satisfeita com a relação aberta, chegando a se separar dele por um ano. Mesmo vivendo paixões com mulheres e homens, são suas relações com jovens rapazes que ganham atenção em "Maestro", despertando, com delicadeza e respeito, a discussão sobre a bissexualidade do regente e até mesmo sobre o preconceito da época. A propósito, quem também assistir esperando que a polêmica sobre sua sexualidade ganhe o centro da história também vai se decepcionar. É de forma fluida que seus amores entram em cena e jamais para chocar, mas sim para revelar o quão complexo era o maestro e quão nada óbvia era sua relação com Felicia, contrariando os cânones e o moralismo da época.
Tratar da biografia de Bernstein pelo viés da relação com Felicia e sem grandes alardes sempre foi a ideia inicial de Bradley Cooper. Durante o Festival de Veneza 2023, onde o filme fez sua première mundial, uma das filhas do maestro, Jamie Bernstein, afirmou que ela e os irmãos (Nina e Alexander) só aceitaram ceder os direitos de seu livro "Famous Father Girl - A Memoir of Growing Up Bernstein" par o ator e diretor justamente por sua visão diferente. Não por acaso, a tradução do título do livro fala da história da filha do pai famoso e de como é crescer na família Bernstein. Além de fontes de pesquisa, o roteiro assinado por Cooper e pelo vencedor do Oscar Josh Singer (de "Spotlight") trata justamente desta esfera doméstica com respeito e até certa reverência.
Por tudo isso, "Maestro", que no início e quando recorre a momentos mais "antigos" da vida de Bernstein usa o recurso da fotografia em preto-e-branco, tem personalidade, mas não se destaca exatamente por sua direção ou abordagem ousadas. As cenas mais contemporâneas da vida de Bernstein são filmadas em cores e com estilo de drama clássico, sem ousar tanto na condução das cenas quanto no conteúdo. É como se o espectador passasse pelos anos de sua vida e obra, observando tudo, mas não necessariamente se envolvendo visceralmente. Salvo uma cena de condução mais emocionante, ou o desfecho do filme, quando a emoção ganha tons mais altos, "Maestro" corre quase monocórdio, o que pode parecer até uma ironia, pois se trata da história de um dos mais inventivos e incríveis músicos contemporâneos.
Destaque justo, claro, para o capricho da produção e para a atuação de Cooper e de Mulligan. Excluída a polêmica sobre a prótese de nariz que o ator usou para se parecer mais com o maestro, o que revela sua obsessão pela perfeição, a caracterização de Cooper é preciosa. Os trejeitos, os movimentos e até mesmo a voz do maestro são reproduzidos com precisão por Cooper, que larga bem na corrida a uma indicação ao Oscar de Melhor Ator 2024. Mulligan é, como pretendido, a alma do filme. É seu sorriso que ilumina a tela, que conduz o olhar do marido e artista, que o tira do lugar de conforto e o faz confrontar sua soberba e suas inseguranças. "Maestro" vale demais somente pela dupla Mullingan e Cooper.
A opção de Cooper de focar menos na faceta musical de Bernstein, ou em seus erros e acertos, e mais na história de amor, de perdão e de família revela que ele mirou o grande público. Não é preciso saber sobre suas composições e nem mesmo de "West Side Story", ou de como ele redefiniu e popularizou a música contemporânea para embarcar na jornada de Felicia e Lenny. Ao mesmo tempo, também é uma pena que não se saia do cinema sabendo um pouco mais sobre o quanto ele trabalhou para difundir a música clássica e instrumental.
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Quero receber"Esta foi uma escolha do Bradley. Uma vez que ele ganhou permissão para fazer esse filme, a gente estava fora e era o filme dele. Ele escolhe contar esta história intimista sobre os nossos pais. A gente não esperava isso. Não imaginávamos que ele nos incluiria no processo", contou Jamie.
Mas, conforme o processo avançou, ficou claro para ela e para toda a família que o ator era perfeito para o papel. "No processo da gente ver este filme ser feito, ficou mais e mais obvio para nós como Bradley parece com nosso pai, seu foco é paixão, compromisso e compartilhar este amor que tem com todos. E a gente entendeu que este era o cara para fazer este papel. Seria sua história pelas lentes deste cara, uma jornada emocional. Para Bradley, era crucial que o filme tivesse temas universais, temas que acontecem com muita gente, em qualquer tempo em qualquer idade", completou ela.
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