'Furiosa' fecha com maestria dia de mulheres fortes e lutadoras em Cannes
Toda edição do Festival de Cannes tem um filme badalado, aguardado pelo público e pela crítica que une dos cinéfilos mais cults aos fãs do cinemão.
Se em 2022 foi Tom Cruise com "Top Gun", em 2023 foi Harrison Ford com "Indiana Jones", em 2024 George Miller e seu "Furiosa: Uma Saga Madmax" que chacoalhou a cidade na noite de quarta-feira e uniu uma plateia sortuda de 2.309 mil pessoas para ver finalmente a saga da personagem vivida por Charlize Theron em "Mad Max - Estrada da Fúria".
E se em 2015, a saga também abalou a Croisette (a avenida que margeia a praia de Cannes), desta vez Annya Taylor-Joy, Chris Hemsworth, Alyla Browne (que vive Furiosa na infância), Tom Burke (Praetorian Jack), e companhia fizeram a alegria dos fãs, fotógrafos e do público, que aplaudiu o filme por cerca de seis minutos ao final da sessão que durou 2h30.
Não só pelas cenas de ação absurdamente bem filmadas, mas também por trazer a saga de uma heroína feminina dura, que busca vingança, justiça e luta de igual para igual, quando não melhor, contra tiranos misóginos e machistas, "Furiosa" consagra uma edição de Cannes em que o #MeToo, a luta contra o assédio, o debate em torno de personagens femininas mais multifacetadas está no centro de todas as discussões.
Também nesta terça, Meryl Streep, em debate com o público, defendeu justamente que papeis melhores vêm também com a maior presença de mulheres produzindo filmes. Os dois primeiros filmes em competição também trouxeram personagens femininas no centro de histórias duras, que as forçaram a endurecer para sobreviver.
"Diamante Bruto", primeiro longa da francesa Agathe Riedinger, trouxe uma jovem francesa periférica lutando contra a pobreza e a relação péssima com mãe com os meios que tem: um celular, as redes sociais, seus seguidores e o sonho de participar de um reality show que a revele ao mundo.
Já "The Girl With a Needle" (A Garota com a Agulha), do sueco Magnus Von Horn, retrata uma jovem costureira que, durante a Primeira Guerra Mundial, acredita estar viúva e se apaixona e se envolve com o patrão, dono da fábrica em que trabalha. Grávida, ela é enxotada pela família dele, descobre que o marido voltou ferido da guerra e se vê diante de um impasse entre ter o bebê e criá-lo, ou entregar à adoção. Duro, contundente, filmado em branco-e-preto, revela o abandono em que mulheres se veem desde sempre quando o assunto é a maternidade.
Voltando...
De volta a "Furiosa", desta vez, o quinto filme da saga "Mad Max" criada em 1979 pelo australiano George Miller traz Annya Taylor-Joy no papel da protagonista cerca de 15 a 20 anos antes de "Estrada da Fúria". Sequestrada quando menina por um clã de motoqueiros selvagens e violentos comandados pelo implacável Dr. Dementus (Hemsworth), ela vê seus sonhos de menina desabarem para dar lugar a um mundo em ruínas, violento, perigoso e tão árido na natureza quando nas relações humanas.
Se em "Estrada da Fúria", Charlize é a Furiosa que possui um braço mecânico e liberta as mulheres de um harém de um tirano, em "Furiosa", entendemos os caminhos que conduziram a heroína de uma infância feliz e protegida aos caminhos violentos do deserto que impera no mundo pós-apocalíptico da saga.
Miller não faz de forma alguma um cinema em que o tom político é o principal, mas a revolução feminista, o exaurimento do meio-ambiente e a violência como arma de sobrevivência onde, como afirmou Annya no material de divulgação do filme, a empatia é uma fraqueza, são pautas cruciais em "Furiosa".
"A gente trabalhou muito duro neste filme e vai ser muito interessante ver o que vocês vão fazer com ele", declarou o cineasta no agradecimento breve à plateia do Grand Théâtre Lumière na noite desta quarta, sob fortes aplausos.
Se depender do público de Cannes, a estreia do filme no dia 24 de maio será tão estrondosa quanto da de "Estrada da Fúria" e as hordas de motos e carros retrofuturistas da saga. Com cenas de ação extenuantes, longas, mas jamais enfadonhas, com domínio primoroso da ação e de um roteiro que não disfarça, mas desenvolve bem o drama e os traumas que movem cada personagem, "Furiosa" é o casamento dos sonhos de todo cinéfilo, o da boa história com entretenimento para gente grande, que não subestima o público e que lhe oferece um universo rico, fascinante, estranho, mas palpável e real.
Em tempo, se a discussão sobre se criar um Oscar de Melhor Dublê sempre volta à tona, o longa de Miller é a deixa ideal para que, finalmente, esta categoria crucial de trabalhadores de Hollywood seja reconhecida. Ainda que onipresente, as cenas de ação nunca são banais e são impressionantes e valem cada segundo do filme.
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