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Guilherme Ravache

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

O drama de Harry Potter, prisioneiro de J.K. Rowling e dívidas da Warner

Harry Potter terá novos filmes se depender da Warner Bros., mas dívidas e J.K. Rowling complicam projeto - Divulgação/Warner
Harry Potter terá novos filmes se depender da Warner Bros., mas dívidas e J.K. Rowling complicam projeto Imagem: Divulgação/Warner

Colunista do UOL

20/11/2022 04h00

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Resumo da notícia

  • A peça de teatro Harry Potter e a Criança Amaldiçoada deve dar origem a dois novos filmes na Warner Bros.
  • HBO Max prevê lançar série no streaming baseada no universo de Harry Potter, a ideia é seguir modelo da Disney com Star Wars e heróis da Marvel
  • Dívida bilionária da Warner e crescentes cortes de custos realizados pelo estúdio são desafios para as novas produções
  • As polêmicas de J.K. Roling, criadora de Harry Potter, e o fracasso de Animais Fantásticos, dificultam as negociações com a autora

David Zaslav, CEO da Warner Bros. Discovery (WBD), tem dito que uma de suas metas é lançar novas produções da franquia Harry Potter. Dias atrás, em uma conferência com investidores, Zaslav destacou que vê o projeto como uma grande oportunidade.

"Vamos focar em franquias. Não temos um filme do Superman há 13 anos. Não fazemos um Harry Potter há 15 anos. Os filmes da DC e os filmes de Harry Potter forneceram muitos lucros para a Warner Bros. nos últimos 25 anos", disse Zaslav. Mas o executivo concluiu a fala com um comentário destacando uma condição: "se pudermos fazer algo com J.K. em Harry Potter daqui para frente".

Nas entrelinhas, Zaslav deixa implícito que J.K. Rowling, criadora de Harry Potter, talvez seja o maior problema para o retorno de Harry Potter.

O executivo também lembrou que os executivos da Warner "não fazem um filme de Harry Potter há 15 anos". Esse é um detalhe importante. Afinal, já existiram outras tentativas de trazer o jovem bruxo e seus amigos de volta às telas.

Agora, o plano da WBD seria adaptar para o cinema a peça de teatro Harry Potter e a Criança Amaldiçoada, produção de cinco horas lançada em 2016 e que teve sucesso estrondoso em Londres e na Broadway. A peça foi escrita por J. K. Rowling, John Tiffany e Jack Thorne.

De acordo com a Puck News, o produtor Toby Emmerich, que no passado já tentou viabilizar um projeto de transformar a peça em uma adaptação para dois filmes, é o responsável pelo projeto no estúdio.

A maldição da Warner

Zaslav apontar Rowling como a maior barreira para a produção de novas obras de Potter faz sentido. Mas não deixa de ser uma maneira de se livrar de um potencial problema para a empresa. Os fãs e investidores cobram mais produções da saga do bruxo, mas uma produção de Harry Potter demandará grandes investimentos, e a Warner está em uma das piores fases de sua história. Nos últimos meses, a empresa tem cancelado sucessivos projetos e fará demissões de funcionários até 2024.

Nesta semana, Zaslav alertou que o mercado publicitário está pior agora do que durante a pandemia. Disse ainda que, se a situação não melhorar, a Warner terá dificuldades para atingir a previsão de ganhos de US$ 12 bilhões em 2023. As ações da WBD já caíram mais de 55% desde abril. Segundo o CEO, a fusão Discovery-WarnerMedia foi "inesperadamente pior" do que sua equipe imaginava anteriormente, revelando que a HBO perdeu US$ 3 bilhões no ano passado, depois de gastar cerca de US$ 7 bilhões em conteúdo.

O que Zaslav não diz, mas o mercado comenta, é que a WBD tem errado feio na estratégia. Primeiro, usando premissas erradas sobre o crescimento do mercado de streaming, comprou no ano passado a WarnerMedia, criando uma dívida gigantesca de US$ 53 bilhões. Neste ano, realizou seu upfront (tradicional evento para os anunciantes) dizendo que estava aumentando significativamente os preços de sua publicidade, principalmente no digital. Isso levou os anunciantes a trocarem a WBD pelos concorrentes, que tinham preços mais competitivos.

Desesperada para cortar custos, a Warner disse que vai gastar entre US$ 3,2 bilhões e US$ 4,3 bilhões com despesas de reestruturação antes de impostos relacionados à aquisição da WarnerMedia. Apenas com demissões a empresa planeja gastar mais de US$ 1 bilhão nos próximos meses. Já com conteúdo a expectativa é gastar entre US$ 2 bilhões a US$ 2,5 bilhões com avaliações estratégicas de programação de conteúdo (traduzindo, esse dinheiro será usado para "matar produções").

A questão financeira é um desafio imenso para um novo Harry Potter. À medida que a empresa se torna cada vez mais imprevisível, matando projetos no meio do caminho ou encerrando até mesmo filmes prontos, como Batgirl, atrair grandes talentos se torna um problema. Não surpreenderia se J.K. Rowling não acreditar que a WBD esteja capitalizada e comprometida o suficiente para dar vida a uma nova fase de Harry Potter.

Por outro lado, a Warner Bros. é dona dos direitos de Harry Potter para as telas, o que impede Rowling debuscar outro estúdio.

Harry Potter e o Enigma de J.K. Rowling

Mas o dinheiro e os problemas da Warner talvez nem sejam o maior dos desafios para o ressurgimento de Potter e seus aliados. Nos últimos anos J.K. Rowling se tornou uma figura bastante polêmica. Depois de sucessivas crises de relações públicas e polêmicas nas redes sociais, inclusive com acusações de transfobia contra a autora, ela queimou seu filme com muitos fãs. Mas mesmo que os fãs decidam ignorar a autora e focar em sua obra, isso não significa que Rowling sairá de cena.

Rowling tem o controle criativo de Harry Potter. Ou seja, sem ela a Warner fica de mãos atadas. Rowling defendeu, por exemplo, a escolha de Johnny Depp para viver Gellert Grindelwald em Animais Fantásticos e Onde Habitam, filmes derivados da série original de Harry Potter. Depp tinha acabado de ser acusado pela ex-esposa, Amber Heard, de violência doméstica.

Rowling esteve bastante envolvida criativamente nos filmes de Animais Fantásticos. Há quem diga até que ela resiste em autorizar o desenvolvimento de novas produções de Potter porque seria admitir que Animais Fantásticos não deu certo. O plano para Animais Fantásticos era torná-lo cinco filmes, mas após avaliações negativas, bilheterias decepcionantes e polêmicas em torno de Johnny Depp, a produção foi para a geladeira. Adaptar Harry Potter e a Criança Amaldiçoada faz sentido agora que a franquia Animais Fantásticos foi pausada.

Obviamente, sendo a dona da HBO Max a WBD não quer se limitar apenas aos filmes. Sarah Aubrey, chefe de conteúdo original da HBO Max, revelou que uma série ambientada no mundo de Harry Potter deve ser lançada na plataforma de streaming da Warner. "Estamos muito empenhados em criar novos conteúdos para esses fãs e pensar no que fazer a seguir", disse ela quando perguntada se veríamos um retorno a Hogwarts no streaming.

Não faltam histórias do Mundo Mágico para uma série da HBO Max contar. Produções detalhando as aventuras de Remus Lupin, Peter Pettigrew, Sirius Black e James Potter, também conhecido como The Marauders, até produções sobre personagens como Hagrid, Dumbledore ou Snape. Se Star Wars provou algo, é que personagens secundários podem funcionar muito bem no streaming.

A saga de Harry Potter tornou Rowling uma das pessoas mais ricas do mundo. Desse modo, dinheiro provavelmente nem seja a maior questão. Então, basicamente se trata de lidar com o ego de Rowling.

Grandes franquias, como a Warner diz estar priorizando, demandam equipes cada vez maiores para produzir filmes, séries, games, parques e toda sorte de produtos. Rowling dificilmente teria a disponibilidade e capacidade para coordenar algo tão complexo a exemplo do que a Disney tem feito com os heróis da Marvel.

J.K. Rowling deu vida à Harry Potter, mas por hora, o jovem bruxo e suas histórias são reféns de sua criadora e dos problemas da Warner.

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