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Guilherme Ravache

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Exclusivo: CNN Brasil terá TV aberta, rádio e quer comprar concorrentes

João Camargo assumiu o comando da CNN e tem planos ambiciosos para criar um conglomerado de mídia - Divulgação
João Camargo assumiu o comando da CNN e tem planos ambiciosos para criar um conglomerado de mídia Imagem: Divulgação

Colunista do UOL

11/12/2022 04h00

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Resumo da notícia

  • João Camargo chega à liderança da CNN com planos de expansão, mas antes terá de fazer a empresa dar lucro pela primeira vez desde sua fundação no país
  • Se tudo correr conforme o planejado, a CNN será parte de um conglomerado de mídia multiplataforma, com TV aberta, rádio e forte presença digital
  • Com amplo trânsito entre políticos e CEOs, Camargo, de 61 anos, cita Roberto Marinho como referência: "Tenho 61 anos, ele começou a TV Globo com 62"

Em março de 2023 a CNN irá comemorar 3 anos de estreia no Brasil. Mas por enquanto o canal de notícias não tem muito a celebrar. Neste período, a maior marca de jornalismo do mundo já viu sua direção mudar três vezes no país e nos últimos meses uma série de demissões foi realizada no Brasil, diante de um prejuízo de mais de R$ 100 milhões só esse ano.

A CNN brasileira é uma licença da marca americana, e por aqui pertence a Rubens Menin. Com patrimônio estimado em R$ 25 bilhões, a família Menin controla negócios como o banco Inter e a construtora MRV. Em 2021, Menin também comprou a rádio Itatiaia, de Minas Gerais.

O novo escolhido pelo empresário para presidir o canal é João Camargo, executivo com experiência no setor de mídia e trânsito entre CEOs, políticos e membros do judiciário. Em entrevista exclusiva a esta coluna de Splash, Camargo, que também se tornou sócio do canal, afirma que o plano da CNN é crescer. E crescer muito. Mas que para isso acontecer, era preciso colocar ordem na casa e dar fim aos prejuízos.

"As demissões são difíceis, principalmente porque tivemos de cortar pessoas talentosas. Gente brilhante que construiu a CNN", diz Camargo, argumentando que não tinha como postergar os cortes. "Quanto mais demorasse, pior ficaria a saúde do negócio".

Os planos de Camargo para a CNN Brasil

  • Cortar custos, com demissão e revisão de contratos. A empresa já cortou um terço dos seus custos em pouco mais de um mês, segundo o novo presidente. Mais de 120 funcionários foram demitidos. Ele admite cortes no jornalismo, mas diz que o objetivo era reduzir o custo administrativo. Contratos foram reduzidos em 30% ou mais, incluindo o aluguel da sede do canal, na Avenida Paulista.
  • Tornar a gestão mais ágil, com menos chefes. Camargo argumenta que a gestão da CNN era inchada, com muitos vice-presidentes e diretores, o que atrasava a tomada de decisões.
  • Reinvestir lucros, ampliar digital e expandir para TV aberta e rádio. Se a CNN parar de dar prejuízo, ele e Menin, os sócios do canal, se comprometem a reinvestir o que lucrarem até 2027. Camargo diz que a CNN Brasil vai para a TV aberta no segundo semestre de 2023 e que "nos próximos meses" vai lançar a CNN Brasil FM no rádio.

João Camargo elogia tanto o presidente Jair Bolsonaro (PL) quanto o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), mas afirma que a CNN terá independência editorial.

"Bolsonaro montou um time maravilhoso. O Lula é o cara que você conhece, não entrou para errar. Vai fazer um bom governo. Estou muito otimista, até porque temos experiência em lidar com inflação e este é o problema do mundo. O Brasil vai largar na frente na retomada". João Camargo

Novo comando da CNN

"Quando o Rubens fez o convite, recusei várias vezes tentando achar uma justificativa para não ir", diz Camargo, que assumiu o comando do canal em novembro. "Conversei com minha mulher, com o Johnny Saad (presidente da Band e sócio de Camargo na BandNews FM), falei com meus filhos, meus amigos e todos me incentivaram a aceitar".

Dinheiro não foi o principal motivo, diz. "Já tenho 61 anos e uma vida confortável. Mas acredito que com jornalismo independente e apartidário podemos contribuir para criar um país melhor. Eu quero deixar um legado neste sentido".

Menin aceitou todas as condições de Camargo, incluindo a independência editorial. O cargo de CEO, ocupado antes por Douglas Tavolaro e por Renata Afonso, foi extinto.

Na avaliação de funcionários e ex-funcionários da CNN ouvidos pela coluna, a chegada de Camargo foi traumática por causa dos cortes e demissões, mas necessária. A opinião dentro e fora do canal era de que gastavam mal.

"A CNN operava com 42% de custo administrativo. Não faz sentido o core do negócio ter somente 58% do investimento. Em uma construtora a relação é de 6% em administrativo e 94% no core. Espero chegar a pelo menos 85% do nosso custo investido no core, que é o jornalismo" João Camargo

Uma das principais renegociações foi a da sede na Avenida Paulista. "Chamamos os responsáveis e explicamos a situação. No caso do aluguel, mostramos que se o valor não fosse reduzido, teríamos de mudar. O valor foi reduzido, mas se não tivesse diminuído mudaríamos mesmo, não blefamos", revela Camargo, que até já tinha até outro endereço em vista. "Obviamente, haveria custo de cabeamento, mudança e talvez tivéssemos de esperar alguns meses, mas se não chegasse no valor, não ficaríamos".

'Era uma loucura, estrutura de Rede Globo. Muito grande para nosso tamanho'

Uma das metas também é aumentar a agilidade do negócio. "Era uma loucura. Havia sete vice-presidentes e 34 diretores. Estrutura de Rede Globo. Muito grande para nosso tamanho. Quando um queria fazer algo tinha de alinhar com os outros presidentes e diretores que pediam para as secretárias agendarem e nada acontecia em menos de seis meses", conta Camargo. Agora a empresa terá três executivos no comando das operações e a área comercial mais próxima a ele.

"Estamos cortando custos, mas também trabalho muito próximo ao comercial para ajudar a trazer novas receitas", afirma o executivo. Um exemplo é o novo acordo com a Vivo e a Claro, que permitirá ao canal fazer publicidade regionalmente. "Hoje, se um governo estadual ou uma empresa quiserem anunciar somente em uma determinada região do país, não conseguimos. Mas agora teremos essa possibilidade, começando com o estados do Rio de Janeiro e São Paulo".

Pergunto se ele precisou usar sua influência pessoal na negociação com a Vivo e Claro. "Olha, a verdade é que provavelmente nunca ninguém deu bola para isso e nem foi lá pedir", responde. "Quando ouvi essa necessidade da área comercial, entendi que era uma oportunidade e se tornou uma prioridade".

A nova estratégia da CNN é, em três meses, reduzir custos, ganhar agilidade e aumentar a eficiência focando em notícias quentes. A expectativa é que em março a empresa já opere sem perder dinheiro, comece a dar lucro e dobre o faturamento até dezembro de 2023.

'Queremos criar um grande conglomerado de mídia'

"A galinha dos ovos de ouro estava secando, temos de deixá-la saudável. Precisamos arrumar a casa para conseguir expandir o negócio. Vamos reinvestir na própria CNN todo o lucro até 2027. Rubens e eu também estamos comprometidos a fazer novos investimentos para expandir o grupo. A partir de abril, estaremos estudando o mercado e se surgirem novas oportunidades, podemos comprar outras empresas de mídia", diz.

TVs, rádios e sites podem ser adquiridos por Menin e Camargo. A meta é reunir os mais diversos formatos de mídia e diferentes marcas em um grande grupo de comunicação, incluindo a CNN.

O primeiro passo da estratégia é tornar a CNN multiplataforma, uma antiga promessa do canal. "Vamos investir bastante no digital. Já somos muito fortes no YouTube, fomos o primeiro canal de notícias a estrear no Amazon Prime, e estamos negociando com diversos fabricantes de eletroeletrônicos para estarmos embarcados nas TVs e demais dispositivos. Também estaremos em 4 plataformas de TV pela internet".

A lógica é que se o modelo funcionar para a CNN e for um case de sucesso, será mais fácil atrair grupos de mídia no modelo que está sendo implementado. "Não entrei para tapar buraco ou ganhar um troco, entrei pelo projeto", afirma Camargo. "Queremos criar um grande conglomerado de mídia".

Nessa seara, o executivo se cita Roberto Marinho, jornalista que herdou o Grupo Globo de seu pai e o transformou na maior empresa de mídia do país. "Tenho 61 anos, e sem querer comparar, mas em minha defesa posso dizer que o Roberto Marinho começou a TV Globo com 62 anos", diz rindo.

Disputa com a Jovem Pan e influência política

Apesar das polêmicas, a Jovem Pan foi uma das principais pedras no sapato da gestão anterior na CNN. O canal alinhado a Bolsonaro tem custo inferior ao da concorrente e audiência em diversos momentos superior. Camargo prefere não falar de concorrentes, mas destacou que o diferencial da CNN é ser apartidária e independente. "Temos conflitos de ideias, cada um defendendo o que acredita, mas sem polarizar".

A comparação com a Jovem Pan, que também demitiu recentemente, talvez não se encaixe até pelo fato de a CNN Brasil precisar seguir os padrões da matriz americana. "A CNN é cara, olha a qualidade dos nossos painéis de leds, figurinos, maquiadores e câmeras. Apesar de todos os cortes, a CNN ainda é quem entrega mais qualidade para o espectador", diz o executivo.

João Camargo é um nome com trânsito entre políticos brasileiros. Ele é o criador da Esfera Brasil, empresa que conecta empresários a políticos por meio de eventos, constantemente comparada ao Lide, grupo criado pelo ex-governador de São Paulo João Doria. Quando assumiu a CNN, Camargo passou o comando da Esfera para a filha.

Para se ter noção do peso da Esfera, a empresa promoveu recentemente um evento para discutir os desafios políticos para o Brasil nos próximos quatro anos. Entre os presentes, o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, os ministros do STF Luís Roberto Barroso e Ricardo Lewandowski, a governadora do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra (PT), além de integrantes do TCU e do STJ.

Camargo também é sócio do grupo 89 Investimentos, uma gestora de recursos independente com atuação nas áreas de logística, incorporação e comunicação, além de ter participação nas rádios Alpha, BandNews FM, Rádio Disney, Nativa e 89 FM. O family office, que reúne os negócios de Camargo, passou a ser tocado pelo filho.

O executivo refuta a ideia de que a CNN será uma extensão da Esfera ou de outros interesses. "Se perdemos a independência, nosso negócio de jornalismo morre". Ele cita como exemplo o fato de Lula e Bolsonaro apoiarem a Esfera por "entenderam que era um projeto sério e apartidário".

Sobre o apoio de Menin a Bolsonaro, um tema recorrente nos últimos anos e negado pelo dono da CNN, Camargo diz que não existe qualquer interferência por parte do sócio ou da família. "Eu me esforço para falar com eles. Temos um grupo no WhatsApp e até provoco eles lá para ouvir mais. Mas nada, zero interferência".

A venda da CNN também não está nos planos. "A CNN é o bebê de colo do Menin. Ele tem um orgulho enorme. Quando me liga é para saber se estou bem e para dizer que assistiu a algo na CNN que gostou".

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