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Guilherme Ravache

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Em crise, TVs já comemoram aumento da publicidade estatal no governo Lula

Lula e Mercadante: mudança na lei facilitou indicação do ex-ministro ao BNDES e pode multiplicar verba de publicidade de estatais - Ricardo Stuckert
Lula e Mercadante: mudança na lei facilitou indicação do ex-ministro ao BNDES e pode multiplicar verba de publicidade de estatais Imagem: Ricardo Stuckert

Colunista do UOL

20/12/2022 04h00Atualizada em 20/12/2022 12h57

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Resumo da notícia

  • Mudança da Lei das Estatais pode elevar verba de publicidade de R$ 5 bilhões para até R$ 20 bilhões por ano
  • Notícia anima grupos de TV, que enfrentam queda nas receitas e aumento da competição com o streaming e plataformas digitais
  • Lei das Estatais ainda precisa passar no Senado, mas medida já sinalizaria reaproximação do governo com a mídia tradicional

O ano foi terrível para os grandes grupos de mídia. A economia brasileira desmoronou em meio à corrida eleitoral e a verba de publicidade despencou à medida que cresce o temor das empresas com a queda nas vendas e uma recessão global em 2023.

As TVs abertas estão entre as que mais sofreram. O crescimento da internet, e principalmente do streaming, se tornou um enorme desafio. As receitas caíram e a crise econômica agravou a situação.

A Globo segue encerrando contratos fixos de estrelas, cortando custos e o prejuízo com a Copa piorou os resultados. Apesar da boa audiência dos jogos, a precoce eliminação da seleção, a data ruim do evento (concorrendo com Black Friday) e o alto valor do dólar, além de um contrato de transmissão faraônico fechado anos atrás com a Fifa (o segundo contrato mais caro do mundo), impactaram negativamente os números da Globo no ano.

A Band cortou custos duramente. O programa do Faustão, que responde por mais de 50% da receita da casa, foi um dos mais afetados. Bailarinas, produtores e dezenas de colaboradores foram demitidos. Um dos fornecedores da atração reclama de uma dívida de R$ 600 mil que não foi paga pela emissora do Morumbi. Até os programas religiosos voltaram para a programação para ajudar a fechar a conta.

Band e Record brigam na Justiça

O momento é tão complexo que a Band processou a Igreja Universal, acusando Edir Macedo de um calote de R$ 10,7 milhões. O valor seria referente ao aluguel da Rede 21, que pertence à Band, mas era usada para programação religiosa da Igreja. A relação entre os gigantes de mídia costumava ser amistosa.

Na Record também estão acontecendo demissões e cortes de orçamento. Rodrigo Faro estaria inconformado que a direção quer baixar seu salário de R$ 1,2 milhão para R$ 300 mil por mês. As novelas da casa também passaram a ser produzidas diretamente pela Igreja Universal, que se tornará uma fornecedora da emissora do bispo Edir Macedo. Do ponto de vista artístico pouca coisa deve mudar, mas da perspectiva fiscal pode ser um ótimo negócio, ajudando a reduzir custos.

A RedeTV!, onde aconteceram atrasos de pagamentos em 2020, na semana passada anunciou cortes na programação. O programa Encrenca foi encerrado após oito anos no ar. Dias atrás, o site Notícias da TV revelou que a empresa é alvo de uma denúncia conjunta do Sindicato dos Jornalistas e dos Radialistas por servir comida de baixa qualidade no refeitório. Há depoimentos de funcionários de que refeições com larva e barata tenham sido servidas. A RedeTV nega.

O SBT cortou custos e estuda formas de aumentar a receita, principalmente com iniciativas no digital. A relação com o YouTube inclusive estaria sendo repensada. Na avaliação de alguns dentro da emissora, o SBT recebe pouco pelo volume de visualizações que tem em seu perfil na rede de vídeos do Google. Por meio de sua assessoria, o SBT nega mudanças em relação ao YouTube.

Jovem Pan e CNN Brasil fecharam o ano com uma onda de demissões, com a última inclusive renegociando todos os contratos de fornecedores, reduzindo em ao menos 30% os valores.

R$ 20 bilhões para publicidade

É neste cenário desolador da mídia que, na semana passada, a Câmara dos Deputados aprovou a mudança da Lei das Estatais. A proposta passará pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado antes de ir ao plenário, o que só deve acontecer en 2023.

A mudança da lei, que conta com o apoio do PT, permitirá que gigantes ligadas ao governo, como Petrobras, Banco do Brasil e Caixa Econômica, possam gastar mais em publicidade. A proposta aumenta o limite de despesas de 0,5% para até 2% da receita bruta operacional e muda os limites de gastos em ano eleitoral.

As estatais em 2021 faturaram cerca de R$ 1 trilhão. Caso alcance o teto de 2% com a mudança da lei, o valor disponível para publicidade das empresas ligadas ao governo pode saltar dos atuais R$ 5 bilhões para até R$ 20 bilhões por ano.

Como afirmei aqui, manter a mídia próxima, particularmente a mídia bolsonarista como a Jovem Pan, será uma questão estratégica para o PT. Bolsonaro apostou no embate com a mídia, talvez acreditando que as redes sociais seriam suficientes para controlar a narrativa. O erro custou a reeleição. As lives no Facebook e mensagens no WhatsApp influenciam, mas os debates na TV, como os recordes de audiência mostraram, foram determinantes.

Por que mudar a Lei das Estatais?

Segundo o site Poder360, "pelas regras atuais, é possível atingir os 2% por proposta da diretoria justificada com base em parâmetros de mercado do seu setor e mediante aprovação pelo respectivo Conselho de Administração. A autora (da proposta) argumenta que a vigência contratual para os serviços de publicidade pode chegar a 60 meses e que a autorização de ampliação precisa ser feita a cada exercício, o que torna rara a prática".

A mudança da lei facilitou a indicação do ex-ministro Aloizio Mercadante (PT) para a presidência do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Mas também pode dar um trunfo para o novo governo. Nenhum grupo de mídia vai querer deixar de receber um pedaço dos bilhões de publicidade das estatais. Na atual crise, essa verba passa a ser questão de sobrevivência.

A coluna conversou com três executivos de TV. O alívio é geral. "Mesmo que a lei não mude, fica evidente a vontade do novo governo de retomar os investimentos em comunicação", diz um executivo. Na avaliação dele, o governo Bolsonaro usava questões ideológicas como desculpa para justificar a falta de capacidade para criar uma mensagem coesa e investir de maneira efetiva em publicidade. "Cada um dizia o que queria nas redes sociais. No final, ninguém sabia o que o governo estava propondo ou fazendo", afirma.

"Lula é pragmático, bem mais inteligente que o Bolsonaro. Vai fazer o que precisa ser feito", diz outro executivo e acrescenta: "Lula é um ótimo comunicador, sabe que se tiver um palanque vai se dar bem. E no Brasil, ainda não existe palanque melhor que a TV".

Todos os executivos dizem que a notícia das estatais é boa para o setor, mas lembram que o melhor caminho é a volta da estabilidade institucional e o retorno do crescimento econômico.

O que dizem as TVs oficialmente

Procurada, a Globo disse por meio de sua comunicação que seu posicionamento é o mesmo da Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão).

Já a Abert diz que como o tema ainda está sob análise, neste momento não irá se manifestar sobre o assunto.

Band, SBT e Record não comentaram.

A RedeTV não respondeu sobre a questão da mudança da Lei das Estatais, mas entrou em contato com a coluna para negar que tenha tido problemas no refeitório ou que esteja reduzindo o custo com a programação em 2023. Abaixo o comunicado oficial da RedeTV sobre o caso do refeitório:

"As informações causam espanto, pois não procedem. A RedeTV! fornece refeições de qualidade através de restaurante terceirizado, que apresenta um cardápio variado e balanceado. Regularmente todos os colaboradores, casting e convidados se utilizam do restaurante, que é sempre supervisionado pelo departamento de RH. Além disso, em suas amplas instalações, a empresa ainda dispõe de uma lanchonete e frequentemente há food trucks variados."

Após a publicação deste texto, a RedeTV entrou em contato com a coluna afirmando que a palavra "processo" foi usada erroneamente na frase que faz referência aos alimentos servidos com larvas e barata no refeitório da RedeTV. Segundo a empresa, ela é alvo de uma "denúncia" dos sindicatos dos Jornalistas e dos Radialistas, e não de um "processo". A palavra foi alterada no texto.

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