Quem será o rei da TV? Domingos ficam mais tristes sem Silvio Santos

Começou a vida como camelô, vendendo canetas no centro da cidade. Eu mesmo tenho uma tia de 93 anos que jura ter comprado uma caneta das mãos do próprio Silvio. Comprou a caneta, mas não fez a selfie ancestral, impressa e auditada, mais conhecida como autógrafo.

Em 1958, adquiriu de Manuel da Nóbrega, pai do Carlos Alberto da Nóbrega, o Baú da Felicidade, que vendia brinquedos a prestação. Anunciava o seu Baú em seus programas de rádio. Em pouco tempo, Silvio percebeu na tevê o futuro.

Mudou-se para São Paulo, onde trabalhou na TV Paulista Canal 5 que em 1969, tornou-se uma emissora nacional, a TV Globo, em que Silvio alegrava os domingos. Lembro os carnês do Baú da Felicidade, dos quais a minha avó era assídua compradora. Meu sonho era ganhar um carro zero quilômetro, o que nunca aconteceu.

Em 1972, virou sócio da TV Record e em 1976 conseguiu a concessão para sua TVS, canal 11, no Rio de Janeiro. Conversei com meu amigo André Barcinski, um dos roteiristas de Ö Rei da TV", série ficcional do Disney+, baseada na vida de Silvio. Ele me falou sobre este episódio.

Tenho a lembrança dessa grande novidade. A TVS tinha uma programação limitadíssima e ficava boa parte da semana fora do ar. O programa Silvio Santos era exibido simultaneamente na TVS, na Rede Tupi e na TV Record. Pode imaginar um programa apresentado por três emissoras diferentes ao mesmo tempo? Pois é, o Silvio Santos era assim.

Por toda sua carreira, Silvio nunca deixou de ser um camelô à sua maneira. Além de grande vendedor, cativava o público com sua conversa direta e sincera. Sempre teve a preocupação de trazer o povo para a tevê, de forma que o telespectador se visse como atração nos seus programas. Nunca se punha acima das pessoas simples. Seus quadros tinham perguntas fáceis para que nem o candidato nem a plateia se sentissem constrangidos.

Silvio teve uma vida rica em capítulos dramáticos, como o sequestro da sua filha, Patricia Abravanel. Ao falar do episódio, não abria mão do bom humor, chegando a dizer que pensou em pedir ao sequestrador que ficasse com ela, porque era muito chata. Pura brincadeira, pois até pagou um alto resgate para sua libertação. Dias depois, ele mesmo foi feito refém em sua própria casa, drama acompanhado pela tevê por todo o Brasil.

É sem dúvida a personalidade mais imitada pelos comediantes do país, por conta de seu visual e sua famosa voz.

Fez de tudo um pouco. Foi até candidato a presidente em 1989, na primeira eleição direta depois da ditadura militar. Entrou tardiamente na corrida eleitoral, a ponto de seu nome não aparecer na cédula. Mas a candidatura foi impugnada 1 semana antes da eleição.

Silvio é o único caso no mundo em que o dono da emissora é também sua principal atração. Ou seja, era patrão e empregado de si mesmo. Admitia que sempre se pautava mais por intuição do que por pesquisas. Até a divulgação de seus programas tinha um viés de informalidade, o que agradava muito ao público.

Diversas vezes o SBT só lançava seus programas depois da novela da Globo. E chamava atenção com o slogan: "Líder absoluto do segundo lugar". Uma sinceridade que poucos teriam coragem de expor.

Também não tinha problema em declarar a qualidade dos profissionais da emissora rival, quando os convidava para receber o Troféu Imprensa. O "Casseta & Planeta, Urgente!" foi eleito o melhor programa humorístico em 1994, 2001, 2004 e 2005. E o melhor programa geral no ano 2000. Lembro da vez em que fomos receber um de nossos troféus. Silvio brincou dizendo que queria levar nosso programa pro SBT, mas nós éramos muitos, ia ficar muito caro. Isso nunca foi levado a sério, pois nenhuma proposta sequer chegou a ser feita.

Impossível falar de todos os aspectos da vida desse comunicador gigante em alguns minutos de coluna. Afinal, trata-se de um artista único que ficará para sempre na memória do povo brasileiro. Obrigado, Silvio!