Pela 1ª vez só com atrizes pretas, peça de Falabella volta a SP: 'Emoção'
Conversei com as atrizes Iléa Ferraz, Letícia Soares, Flávia dos Prazeres e Adriana Lessa, que estão em cartaz com a nova montagem de "A Partilha", uma peça atemporal e universal que apresenta quatro irmãs que se reencontram e discutem a partilha dos bens deixados pela mãe, um dos grandes sucessos de Miguel Falabella.
Pela primeira vez, a peça é montada somente com atrizes pretas, o que prova que os talentos dessas incríveis atrizes só sofria mesmo do preconceito de produtores brancos.
Falamos sobre representatividade e Iléa explica que poder contar essa história, somente com atrizes pretas, é muito importante porque muitas vezes os pretos estão sempre ligados a um drama específico — e que poder trazer dramas do cotidiano que afetam todo mundo é uma grande emoção.
"A grande emoção, eu falo por mim, especialmente, já que sou uma atriz mais velha, é chegar nesse momento, ter a possibilidade de vivenciar esse Brasil onde a gente pode finalmente fazer parte dessa cena que a gente está trazendo dramas do cotidiano de todo mundo, que afeta todo mundo. É uma emoção muito grande", diz a atriz.
As atrizes ressaltam que Falabella sempre se adiantou nessa discussão sobre artistas pretos e contribuiu nas causas — bem antes do Brasil dar uma visibilidade maior a essa questão. Elas também falam de Jô Santana, o produtor da peça, que é um homem preto e que faz sempre a manutenção das histórias das pessoas pretas.
Iléa Ferraz tem 40 anos de carreira e desde a infância quis ser atriz. Ela se formou na Escola de Teatro Martins Pena e não parou mais, mesmo com as dificuldades por ser uma atriz negra. Há muitos anos vem resistindo e complementa que "resistir não é bom, bom é a gente existir".
As meninas ressaltam e relembram que ela ajudou a formar um grupo de teatro em 1990 que foi muito representativo, o Martins Pena, inspirados pelo TEN - Teatro Experimental do Negro. Ainda pensando na falta de oportunidade para esses artistas pretos, o grupo criou a Companhia de Teatro Em Black e Preto no Rio de Janeiro, que abria espaço para artistas negros e promovia suas vozes e perspectivas no cenário teatral.
Letícia Soares é carioca de Magé (RJ) e diz que demorou para se aceitar atriz, mas que sabia que tinha uma veia artística, um vazio que precisava preencher, mesmo estando muito longe de seu alcance — ela relembra que quando morava em sua cidade natal, não havia escolas voltadas para o teatro, para a atuação, diferentemente de agora.
Enquanto se formava em Serviço Social na Universidade Federal Fluminense e se preparava para prestar concurso público, conheceu a Escola Portátil de Música do Instituto Casa do Choro no Rio de Janeiro, e foi lá que deu o pontapé para iniciar sua carreira. Em um determinado momento, sua professora falou que o compositor Paulo Cesar Ribeiro estava escrevendo o musical "Besouro Cordão de Ouro", que fez parte após realizar alguns testes.
Coincidentemente neste musical que rodou o Brasil inteiro, Iléa Ferraz também fazia parte do elenco e elas se conheceram por lá. Com um talento incrível para cantar e atuar, participou de mais de vinte musicais, entre eles produções musicais renomadas como o "Rei Leão", "Les Misérables" e "A Pequena Sereia". Seu talento também a levou a participar de filmes famosos, contribuindo com dublagens e performances musicais memoráveis.
"Eu me considero uma pessoa de muita sorte, tudo o que poderia dar errado, deu certo pra caramba e hoje estar no palco, com essa história, com essa personagem muito complexa (...) é um prazer e eu tenho muita sorte de estar com essas mulheres no palco", aponta Letícia sobre sua personagem em "A Partilha"
Flávia dos Prazeres além de atriz, é apresentadora e atualmente também está à frente do programa "Café Filosófico" na TV Cultura. Começou sua carreira na infância e, conforme foi crescendo, realizou diversos trabalhos, estudou na CAL (Casa das Artes de Laranjeiras) no Rio de Janeiro, no Grupo de Teatro "Nós do Morro", localizado na comunidade do Vidigal, também no Rio de Janeiro e na EAD-USP (Escola de Artes Dramáticas da USP).
Sua primeira peça profissional foi dirigida coincidentemente por Iléa Ferraz. Ela cita alguns trabalhos como a peça "Senhora dos Afogados" dirigida por Ana Kfouri, o musical "Missa dos Quilombos", de Milton Nascimento, dirigido por Luiz Fernando Lobo com turnê no Brasil e em Portugal, entre outros.
"Estou muito feliz, desse encontro com o Miguel [Falabella], dessa oportunidade, dessa confiança. De nos dirigir com toda essa gentileza e generosidade, eu aprendo muito com ele. É um momento muito importante da minha vida, eu estou vivendo a melhor fase, está sendo a mais intensa e a mais repleta de presentes, pessoas importantes, o Jô (Santana) também confiou em mim... Estou realizada", indica Flávia dos Prazeres.
Adriana Lessa, conta que, antes de se tornar atriz, era atleta e que a disciplina do esporte a ajudou muito em sua carreira artística. Ela explica que durante a adolescência vinha muito de Guarulhos para São Paulo e que em uma dessas vindas foi chamada por um amigo para realizar um teste no Antunes Filho.
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Quero receberEla ressalta a importância de instituições como o SESC, do Sesi e do Senai na profissionalização de tantos profissionais, inclusive os atores. Adriana foi conciliando os estudos com os teatros de revista, que culminou no convite de Amaury Jr. e Ciro Batelli para ela participar do Hotel Tropicana de Folies Bergere, em Las Vegas, que ela cita com muito carinho e cita seus diversos trabalhos no audiovisual como Deusa em "O Clone" (Globo, 2001), Rita de Cássia em "Senhora do Destino" (Globo, 2004) e no streaming como Rute em "Rota 66 - A Polícia Que Mata" no Globoplay, por exemplo.
Já Jô Santana sempre lutou para que os artistas pretos fossem reconhecidos, além de ser um guerreiro pela cultura. Com o sucesso do musical "Marrom, O Musical", terceiro espetáculo da trilogia do samba, escrito também por Falabella, Jô tem conseguido mais ainda que muitos artistas mostrem seu talento.
"Ele que falou 'se não querem falar das nossas histórias, eu tenho que produzir nossas histórias, falarei eu e eles irão nos ouvir", salienta Adriana Lessa sobre Jô Santana.
Veja acima a entrevista completa com as atrizes.
A peça "A Partilha" está em cartaz no Teatro SABESP Frei Caneca, localizado no Shopping Frei Caneca, na região central da cidade de São Paulo. Sexta e sábado às 20h e domingo, às 19h. A peça fica em cartaz até setembro e depois parte para uma turnê pelo país.
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