Topo

Leonardo Rodrigues

REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Que fim tiveram os LaserDiscs e por que não conseguimos nos esquecer deles

LaserDisc - Reprodução/Ebay
LaserDisc
Imagem: Reprodução/Ebay

Colunista do UOL

03/11/2021 04h00

Quando publiquei há duas semanas sobre a "guerra dos formatos", houve quem reclamasse da ausência do LaserDisc no texto, cujo enfoque estava apenas em mídias musicais, não de vídeo.

Mas, considerando que o formato ficou conhecido por aqui principalmente por seus títulos de shows, os pedidos não deixam de fazer sentido. Portanto, hoje é dia de datilografar sobre os discões platinados.

Anúncio de aparelho de LaserDisc da Pioneer - Reprodução - Reprodução
Imagem: Reprodução

Você já teve um LaserDisc?

O LD foi um formato histórico: o primeiro de vídeo doméstico a utilizar um disco óptico para armazenamento de dados. Pense nele como um precursor do DVD e blu-ray, cuja tecnologia serviu de base também para o CD, que, pasmem, apareceu 4 anos depois.

Desenvolvidos pela MCA, em parceria com Phillips e Pioneer, esses modernos objetos, que pareciam ter saído da ficção científica, chegaram ao mundo em 1978, comercializados como MCA DiscoVision, ou simplesmente "DiscoVision".

Eles nada mais eram que um disco de 12 polegadas —tamanho de um LP— com duas faces que, embora não totalmente digitais, forneciam vídeo e áudio com qualidade superior à TV da época e às recém-criadas fitas caseiras.

O primeiro, lançado no dia 15 de dezembro de 78, foi esta versão de "Tubarão", de Steven Spielberg, que chega a valer uma salgada bolada

Apesar de recebidos com entusiasmo por japoneses e entusiastas digitais, os LaserDiscs não conseguiram vingar no mercado. Em seu auge, alcançaram apenas 2% dos lares americanos e menos ainda dos europeus.

Capa de revista com LaserDisc - Reprodução - Reprodução
Imagem: Reprodução
Mas por que não deu certo?

"Por que os aparelhos e discos eram caros demais para o consumidor médio", você deve estar pensando. Correto. Eles não eram baratos. Mas esse é só o sintoma do insucesso. Não o motivo dele.

Como quase tudo envolvendo a "guerra dos formatos", que sepultou mídias e tecnologias ao longo das décadas, o LaserDisc padeceu por seu timing ruim. Curiosamente, ele chegou tarde e cedo demais. E ao mesmo tempo.

Por que tarde?

Porque o LD teve de competir com dois concorrentes de peso: as fitas magnéticas Betamax e VHS, que haviam sido apresentadas pela Sony e JVC poucos anos antes. Respectivamente, em 1975 e 1976. E elas foram um golaço das empresas.

Mesmo de início mais caras que os discos digitais —US$ 19 contra US$ 17 nos EUA—, assim como seus aparelhos reprodutores —cerca de US$ 1000 contra US$ 700 em versões mais baratas—, as fitas traziam uma vantagem que se mostrou decisiva na guerra fos formatos: permitiam gravar programas de TV.

De repente, qualquer um poderia programar um videocassete para capturar seu programa favorito e assisti-lo em qualquer hora. Tudo que o consumidor precisava era de uma fita virgem regravável e alguma paciência para ler o manual de instrução.

Em outras palavras: o mundo estava para assinar a alforria —ainda que relativa— da programação televisiva. Uma revolução de hábitos compatível à chegada dos serviços de streaming.

Mulher pode ir para cadeia por não ter devolvido VHS de "Sabrina" em 1999 - Reprodução/Twitter/@Erika_Stanish - Reprodução/Twitter/@Erika_Stanish
Imagem: Reprodução/Twitter/@Erika_Stanish

Mas por que o LD também chegou cedo demais?

Porque a ideia do LaserDisc, diferentemente da das fitas, consistia em fazer as pessoas consumirem vídeos pré-gravados de filmes, programas e o que mais fosse possível a indústria audiovisual licenciar na época. Assim como são os DVDs modernos.

Ou seja, além possuir livros e discos, você agora teria de criar uma nova coleção em casa, de vídeos. E até o início dos anos 1980, quando a maioria das fitas eram lançadas virgens, o conceito de "home video" nem sequer existia.

Hoje pode parecer curioso, sobretudo à luz do colecionismo, mas, 40 anos atrás, poucos haviam remotamente cogitado a possibilidade possuir um acervo de filmes em casa.

Por que gastar dinheiro com discos caros de filmes, que custavam mais que o dobro de um LP, se dava para assisti-los por muito menos no conforto da sala de cinema? Ou simplesmente de graça na TV, que agora poderia ser gravada?

Lançado com poucos títulos e demanda, o LaserDisc sofreu para atrair atenção. Estúdios resistiam à ideia de licenciar longas em uma mídia física com receio de perder receitas. Tudo era novo. Com tantas barreiras impostas, o LD se viu em um beco escuro e sem saída.

E teve mais: a evidente falta de praticidade do formato —o disco precisava ser virado após uma hora de exibição, como nos toca-discos—, que era menos portátil e resistente que as fitas, acabou servindo como gota d´água para sua derrocada comercial.

Laser Disc - Reprodução - Reprodução
Imagem: Reprodução

Mas por que nunca nos esquecemos dos LaserDiscs?

Porque eram milagres tecnológicos. Levavam som stereo à TVs antes de emissoras começarem a fazer isso. Sua imagem tinha um padrão inédito para aparelhos domésticos, com resolução de 425 (versão NTSC) e 440 (versão PAL) linhas horizontais, não muito inferior a do DVD, que chegou 18 anos depois. O VHS exibia metade disso.

Entre o fim da década de 1970 e o ano de 2001, época em que foram descontinuados no Japão, os LaserDiscs evoluíram tecnicamente para continuar existindo. Em 1993, 13 anos antes do Blu-ray, eles já haviam alcançado o patamar da alta definição.

Ainda na década de 1990, os sistemas de LDs ainda inovaram adotando os sistemas de áudio Dolby Digital AC-3 e DTS, os mesmos do cinema, que os fizeram ser cobiçados também por audiófilos e vocacionados para apresentações musicais.

No Brasil, no entanto, poucos viram a cor dos LaserDiscs. Eles nunca foram distribuídos oficialmente por aqui. Aventureiros endinheirados precisaram esperar até a década de 1990, com a abertura às importações, para ter aparelhos em mãos.

A Gradiente até arriscou ao lançar seu player próprio, que encalhou no varejo. Atualmente, você só consegue encontrar membros da família LD na internet ou escondidos em lojas de discos e sebos menos óbvios. Como este abaixo.

Colecionadores que frequentam essas lojas, por sinal, foram os principais responsáveis por manter viva a chama do LD por muito mais tempo do que se esperaria de uma mídia que já nasceu sob a sombra do fracasso.

Talvez por isso tanta gente ainda se lembre carinhosamente de seus bolachões prateados. Há quem mantenha coleções quase intactas, mesmo depois de se desfazer do reprodutor. Conheço alguns.

Um deles é o ex-goleiro e técnico Zetti, como ele mesmo revela na entrevista abaixo.

desde que descobriu o vídeo acima, o autor deste artigo quer formar uma banda com o nome "Zetti e os LaserDiscs", mas nunca teve coragem de pedir autorização ao ídolo do são-paulino --nem de formar uma banda. Quem sabe agora...

Já perguntei antes, mas você já teve um LaserDisc? Então compartilhe a sua história, crítica ou sugestão escrevendo nos comentários ou mandando uma mensagem para mim no Instagram (@hrleo) ou Twitter (@hrleo_). Quer ler mais textos? Então clique aqui.

E até o próxima datilografada!