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Luciana Bugni

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

De "Meninas do Jô" a Glória Perez, Jô Soares virou lenda por ser humilde

A pausa de Jô Soares: uma olhadinha para o lado enquanto garantia o tempo do público rir - Ramon Vasconcelos/Rede Globo
A pausa de Jô Soares: uma olhadinha para o lado enquanto garantia o tempo do público rir Imagem: Ramon Vasconcelos/Rede Globo

Colunista do UOL

05/08/2022 12h58

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É ingrata a função do entrevistador. Ele precisa se mostrar inteligente em um ambiente onde deve também e principalmente dar espaço para que o entrevistado brilhe. Essa bola dividida é uma armadilha que pode fazer com que se deixe de fazer perguntas importantíssimas. As entrevistas de Jô Soares são uma aula de como dar protagonismo ao convidado, informar e entreter.

Estrela de um talk show só dele desde os anos 80, Jô trouxe para o Brasil um modelo que já era consagrado nos EUA. Ali, ele é a estrela. Personagem de si mesmo, tem objetos pessoais à mostra e um sofá para deixar os convidados expostos, porém confortáveis. E a missão de recebê-los muito bem, cutucar e afagar, arrancar as respostas certas entre risadas, divertir, entrar para a história. Jô Soares conquistava cada um dos itens da frase anterior com a naturalidade com que tirava uma gargalhada estrondosa de Derico. Diariamente.

No documentário Pacto Brutal, da HBO Max, Jô aparece entrevistando Glória Perez nos anos 90 sobre a escalação do ator que contracenaria com sua filha, Daniella Perez, na novela de Corpo e Alma, de 1992, e que posteriormente a assassinou. Glória rebate calmamente que essa seleção era feita via cadastro na Globo, que não havia como testar de outra maneira.

O apresentador ouve com atenção e replica: "você tem toda razão, eu falei besteira". Humildade é arma preciosa nos dias atuais em que ninguém quer discutir, mas todo mundo quer estar certo.

As "Meninas do Jô" é um quadro criado em 2005 que colocava quatro mulheres maduras (Lillian Witte Fibe, Cristiana Lôbo, Ana Maria Tahan e Lucia Hippolito) para discutir política. É outro símbolo de deixar o outro brilhar. Aliás, que homem colocaria mulheres geniais e especialistas em um assunto para mostrar na TV que sabiam mais que ele? E as ouviria com atenção semanalmente, usando seu lugar de destaque para mostrar que quem manjava eram elas?

Tem uma entrevista clássica de Jô Soares com a divina trindade da televisão brasileira, Hebe Camargo, Lolita Rodrigues e Nair Bello. No tempo em que passam em frente às câmeras, não sai muita coisa — elas riem o tempo todo e não conseguem falar sobre nada. Ele entende que aquilo se trata de informação. E tira das entrevistadas o melhor que elas poderiam dar: as gargalhadas. É um dos vídeos clássicos da TV no YouTube, e você vai vê-lo muitas vezes nos próximos dias.

Se o entrevistado está gargalhando em sua frente, ensina Jô, deixe-o rir. Quando ele terminar, espere mais um pouquinho: quem sabe ele não ri de novo? Ele fazia isso em cena com seu sexteto diariamente. A pausa de Jô Soares, seguida de um olhar intrigado para o lado e para a câmera, virou marca da comédia brasileira. E é uma lição em tempos em que não pararíamos de fazer o que estamos fazendo nem se Bira e Derico estivessem rindo na nossa sala.

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