Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Luis Navarro e Ivi Pizzott: a sorte de ser homem é ter tempo para sucumbir
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Uma gestação, uma criança mais velha, de 4 para 5 anos, em casa, um parto da segunda filha, lactação, noites em claro, fraldas, choro: a descrição de um puerpério do segundo filho causa compaixão nas mulheres. É cansativo demais criar um bebê em seus primeiros meses. Some a essa dolorosa (e curiosamente deliciosa) equação um divórcio. Por isso, os olhares de empatia se voltaram para Ivi Pizzott, ex-bailarina do Faustão.
Luis Navarro, o ex, é um ator global em ascensão: está no ar na HBO, na Globoplay e no Telecine com séries, novelas e filmes. É casado com Ivi há sete anos, mas anunciou no fim de semana que estava se separando.
A argumentação seria até válida, não tivesse um bebê de quatro meses na história:
"Eu me encontro confuso com a vida e tomei a decisão de reencontrar a minha essência e pra isso precisei dar um tempo no relacionamento. Não lembro a última vez que fiquei sozinho para refletir, que li um livro ou que me olhei no espelho e me orgulhasse de mim", disse em uma publicação no Instagram que apagou depois da repercussão negativa.
Ter filho é uma decisão que muda a vida da gente. Criar uma pessoa muda a essência do que somos e do que entendemos por tempo livre. Isso acontece para homens e mulheres que se propõem a dividir a criação de alguém. Mas, nos meses da gestação e nos primeiros 6 meses da vida do bebê é incontestável que o trabalho fica muito mais centralizado na mão e nos seios da mulher. E essa mulher, envolvida na maternidade 24 horas por dia durante sete dias da semana, não tem nem tempo de ficar confusa consigo mesma.
Reencontrar a essência? É luxo de quem não está com o peito vazando, com sede, com a unha suja de cocô da troca da fralda (e era a sexta troca do dia). Um tempo no relacionamento parece uma insanidade quando se está imersa numa rotina exaustiva em que não se tem tempo para tomar um banho de mais de três minutos. Tempo? Quem tem tempo de dar tempo, meu bem? Olha lá, sua filha acordou de novo.
Luis não se lembra a última vez em que ficou sozinho para refletir. Eu me lembro da minha: estava sentada em uma bola de pilates dentro do chuveiro, com contração de dois em dois minutos há 12 horas. A água quente batia na minha lombar na intenção de aliviar a dor constante. Uma criança alargava minhas ancas para sair do meu útero por um buraco infinitamente menor do que sua cabeça. O pai da criança cochilou entre os gritos que eu dava — eram 4h da manhã e eu gemia desde a tarde. Eu olhei para ele na cama e me senti sozinha por uns 40 segundos. Ali, usei o tempo para de fato refletir que raios havia feito da minha vida.
A resposta veio nos dias e meses seguintes. Tomei uma decisão que me tirou a minha essência, criou uma nova mulher — e nada disso seria viável sem a divisão diária de tarefas com aquele cara que cochilou por alguns segundos. Foi uma excelente escolha. Foram anos sem dormir. Mas, depois de um tempo, voltamos inclusive a ler livros.
A discussão sobre aborto inflama os cidadãos de bem. Há sempre um homem disposto a palpitar sobre o assunto quando se fala em abrir legalmente mão de um feto, a quem chamam calorosamente de vida. O interesse me impressiona já que são necessários dois gêneros para gerar um feto mas o aborto, no caso dos homens, sempre foi legalizado.
O egocentrismo do post de Luis incomoda porque uma mãe normal pensa coisas parecidas todos os dias. Mas nunca diz, apenas segue. Olha lá, a criança acordou de novo. É bem diferente mesmo.
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