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Luciana Bugni

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Como Tina: sorte de quem tem um Fred Nicácio para te segurar quando surta

Colunista do UOL

23/03/2023 07h10

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Que o Big Brother Brasil não era um jeito bonzinho de a Globo redistribuir renda entre pessoas que precisam muito de um milhão de reais, todo mundo sabia.

O mecanismo da atração é pensado para levar as pessoas ao limite da euforia, da bebedeira, da tensão sexual e, principalmente, do nervosismo. Ou, no caso de Tina, Fred Nicácio e Key com sua turma, ao ódio profundo.

Esse último sentimento é a grande aposta da direção e a solução encontrada para a eliminação precoce de Sapato e de Guimê — ambos importunaram sexualmente uma visitante mexicana do programa na semana passada. Pois o BBB enfiou todo mundo que já foi eliminado, após várias semanas aqui fora, em uma casa diferente daquela. E nesta quinta (23), o público decide quem volta ao confinamento principal.

Na casa anexa, os ex-participantes estão se matando de raiva um do outro. Fechados em um cômodo sem janelas, eles têm como entretenimento olhar para a cara de quem eles odeiam. Claro que são necessárias poucas horas para os ânimos se exaltarem. Não por acaso, todo mundo ali é bom de briga.

São perfis estudados para entrar no programa porque estranha ou infelizmente o que o público chama de entretenimento é gente passando nervoso, chegando ao limite, violentando o outro verbalmente. O porquê não me fica claro: será que se quer ver gente batendo boca para aliviar as explosões que não podemos ter por aqui, na vida real?

Tina provou que a direção estava certa e explodiu com Key — barraco com todo o requinte de TV nos anos 1990, quando câmeras escondidas filmando gente de verdade muito brava com alguma pegadinha bombavam. A garota subiu na mesa de sinuca, apontou o dedo, gritou, ameaçou. Não violentou fisicamente — algo que considero um mérito para quem estava totalmente fora de controle. Dá para entender o porquê de tanto rancor.

A linha da briga é a seguinte. Key foi intolerante a respeito da religião de Fred. O médico, uma pessoa preta, só viu isso quando saiu da casa. Na volta para a repescagem, falou do assunto e expôs Key. Ela, garota branca, inverteu o jogo e foi atrás dele para questioná-lo. Ambos discutiram.

Tina, que ainda não havia entrado na história, como na Quadrilha de Drummond, estava dormindo ao lado dessa discussão. Não tinha entrado na história, mas já nasceu nela, pois também é uma pessoa preta. Acordou com gente falando alto, escutou, tentou entender, se colocou a explicar. Foi ofendida por Key que a mandou voltar a dormir e a chamou de garota — de um jeito que tiraria bastante gente do sério.

Aí Tina perdeu o controle. Key ria com deboche quanto mais nervosa a colega ficava. Alguns tentaram apartar, mas Fred usou sua força para segurar a amiga que gritava para ser solta. Dá para culpar Tina? Quem já perdeu o controle sabe que não é um jeito muito legal de mostrar que está certa. Porém, quantos séculos de violências diversas vivem as pessoas pretas? Como se sente a mulher, vítima de racismo a vida toda, silenciada por uma branca, seja lá qual for a situação?

E, principalmente, como questionar a explosão de uma pessoa que faz parte de um experimento que quer que ela exploda violentamente? Tudo é armado para isso acontecer. Os BBBs por iniciativa própria (ou talvez sem total consciência disso) estão rodando essa rodinha que leva a engrenagem ao ponto final — aquele em que um ou vários CNPJs faturam muito mais do que um milhão e tantos reais.

Fred segura Tina com amor: ele não quer que a amiga pague por algo que não foi ela quem começou. Rompante de raiva é do jogo e da vida real. Ter a sorte de alguém que te segura até que a respiração profunda dê conta de tanto sentimento é sorte.

A solução para todo esse sistema que traz aquelas duas pessoas pretas nervosas tentando se amparar à sala de minha casa... eu não sei. Ensinar todo dia que o racismo é crime? Importunação sexual e intolerância religiosa deveriam ser punidas da mesma forma? Estruturas verdadeiramente educativas para a massa poderiam ser pensadas a partir desses inúmeros episódios. Nem só de cifra é feito o entretenimento. Mas que não é normal achar isso divertido não é.

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