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Luciana Bugni

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

De Volta aos 15: até voltar à adolescência parece atraente em tempos atuais

"De Volta aos 15": na adolescência o futuro perfeito que a gente planeja é meio engessado - Divulgação/Netflix
'De Volta aos 15': na adolescência o futuro perfeito que a gente planeja é meio engessado Imagem: Divulgação/Netflix

Colunista do UOL

05/07/2023 11h33

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Anita (Camila Queiroz) faz login em seu fotolog. Assim, dá um salto para 15 anos antes e a personagem aqui interpretada por Maisa SIlva tem a possibilidade de reviver sua adolescência. Se no início da primeira temporada de "De Volta aos 15", da Netlfix, a magia parece um pesadelo, aos poucos ela se acostuma com a ideia. E faz do vai e vem um trunfo para consertar o que já fez aqui ou lá atrás.

A série, que estreia a segunda temporada nesse começo de julho, pega as adolescentes de 15 anos, que recém entraram em férias e dividem seu tempo entre tentar domar seus hormônios e controlar a ansiedade para a festa mais importante de suas vidas — que é sempre a próxima. Mas também pega adultas que só querem adiar um pouquinho da realidade insossa, enquanto são arrebatadas por problemas que parecem impossíveis de serem resolvidos, como: é errado pegar um menino que minha irmã já pegou? Que gostoso era sofrer por questões como essa quando elas pareciam beirar o limite entre a vida e a morte.

A temática é exaustivamente explorada no cinema e em séries. Matthew Perry (o Chandler de Friends) já voltou a ser Zac Effron em "17 outra vez". No sueco "Tudo de novo, mais uma vez", Amelia ganha um presente ao completar 40 anos: voltar aos 18. Domhnall Gleeson domina a volta ao passado no carismático "Questão de tempo". De onde vem esse fascínio por reviver uma época em que a gente sofria menos que agora?

Peraí: quem disse que em tempos passados o sofrimento era menor do que o presente?

Emicida tem uma frase interessante: a gente olha o passado de um lugar confortável, que é futuro. Daqui, é gostoso olhar para nossa versão de Maisa Silva e pensar que tudo aquilo era bobagem. Um dia, achei que ia morrer porque vi o menino que eu gostava levando uma garota para o laboratório de química — em um momento em que não tinha ninguém lá. Pensar que duas pessoas iriam estudar profundamente a troca da enzima ptialina pode tirar o sono de alguém aos 15 anos. Na série, Anita descobre que precisa viver em Paris na vida adulta com seu melhor amigo — e começa arquitetar tudo para chegar lá, como um trator, sem ver as possibilidades que estão ao seu redor.

Tem um livro que é sucesso de vendas na Amazon: "A Biblioteca da meia-noite". A história fala bem das possibilidades das escolhas e os rumos que a vida pode tomar. E se eu tivesse aceitado aquela proposta de emprego no Rio de Janeiro às vésperas de me casar pela primeira vez? Como seria possível prever o divórcio que viria anos depois?

A série espanhola "Se eu soubesse" mostra a vida de uma mulher madura infeliz no casamento, tentando voltar 10 anos na história para não dizer o "sim". Ela consegue, mas percebe tardiamente que foi aquele sim do qual ela se arrepende que lhe deu seus dois filhos. E agora, como que volta para o futuro? Parece que também já fizeram filme sobre isso, mas precisa de um carro mais tecnológico do que apertar um botão de um fotolog. Complicado.

Amor platônico, da Apple TV, foge da ficção científica e resolve a equação: e se bastar você continuar curtindo a vida, ao lado do seu melhor amigo, comendo batata frita e falando de qualquer coisa que não seja sobre ser adulto? Um jeitinho de ignorar o presente e dar uma fugidinha em uma noite de quinta-feira, vagando pela cidade, como se fosse possível (e talvez seja por algumas horas), ser a "você" de quem você havia se esquecido. Mas, surpresa: quando a gente volta para casa, é sempre a gente mesmo que está lá. A maturidade, meus caros, para o bem e para o mal, é irreversível.

Viagem no tempo segue sendo sucesso quando, entediados, a gente olha para o lado e percebe que não era bem isso que havíamos planejado. Talvez não haja Paris, nem beijos apaixonados com o melhor amigo do colégio, apesar de, aos 15 anos, você ter tido a convicção de ia amá-lo para sempre. Mas que sobreviver tem seu charme... ô se tem.

Um amigo outro dia se lamentava por ter passado da "aurora de sua vida". Imagina só. Tem aurora todo dia. Ih, olha lá, o Sol nasceu de novo.

Quando fica difícil, a gente aperta o play e dá uma fugidinha responsável para a adolescência de outrem. Depois, volta ao presente — que definitivamente é a única coisa certa que temos.

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