Ana Hickmann: expor violência em público é se proteger de si mesma também
"Você acha que ele disse que me estrangularia no primeiro encontro?", diz a personagem de "Maid", série da Netflix. O frame circulou na internet após a notícia de que Ana Hickmann teria apanhado do marido, Alexandre Correa, em casa.
A polícia foi acionada, ambos foram encaminhados à delegacia. Como Ana é famosa, tudo ficou público. Alexandre já não era carismático e a imprensa nunca foi muito fã do moço, o que favorece a rejeição — ele inclusive já reclamou que foi hostilizado em uma padaria. A informação sobre a agressão cria uma invisível rede de proteção à vítima: como ela vai ter coragem de voltar com o agressor se todo mundo sabe que ele já foi violento?
Os fãs recuperaram posts antigos em que Ana falava publicamente sobre seus hematomas anteriores creditando a acidentes domésticos. "Toda vítima dá sinais", diziam as postagens dos fãs. Ninguém sabe se ela realmente sofreu acidentes ou se de fato foi violentada outras vezes pelo marido.
A questão é que a criação de desculpas para violências verbais ("eu provoquei") ou físicas ("caí da escada") adia o problema. Enquanto só você sabe da toxicidade do seu parceiro, não tem risco de outras pessoas cobrarem uma atitude, um rompimento. E, por mais louco que pareça para quem está de fora, é mais fácil criar essa teia e se manter na relação do que sair dela.
O relacionamento abusivo se sustenta em variações de brigas aterrorizantes, como deve ter sido o fim de semana da apresentadora e períodos de lua de mel intensa — é óbvio que existe uma parte boa, ninguém fica com alguém que é apenas violento. O cérebro da vítima, por dificuldade de passar sozinha por tudo que vem passando, minimiza para si os acontecimentos e se segura na parte prazerosa. As vantagens saltam aos olhos quando só você sabe do inferno onde vive.
Tudo muda quando o Brasil inteiro está falando que Ana apanhou, quando a própria está na TV, segura, agradecendo o apoio do público, quando vê o filho assustado pela agressão do pai. Contar para os outros é se proteger.
Os olhares de amigos e da família que julgam as ações condenáveis do agressor servem como um espelho para que as vítimas vejam de maneira adequada a situação em que estão inseridas. Não é fácil entender o ciclo quando se está dentro nele.
Que possamos emprestar os olhos estupefatos de quem vê de fora para entender: não é isso que eu mereço. Ninguém avisa que vai estrangular a gente no primeiro encontro — ter uma rede de apoio atenta ajuda a entender o quanto antes.
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