Luciana Bugni

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Opinião

'Avenida Brasil': após 12 anos, Adriana Esteves ainda usa pen drive

No longínquo e aprazível 2012, o país nunca tinha ouvido falar do gigante que acordaria no ano seguinte nos jogando para "tudo isso que aqui está". Por isso, o prazer das pessoas era ver novela na TV. Para sorte dos terráqueos à época, a novela era boa: "Avenida Brasil" moldava as discussões no bar. Adriana Esteves ressignificava o ser vilã e grasnava com uma elegância que deixava todo mundo viciado em sua Carminha.

Como o WhatsApp ainda não era tão popular na época, não perdíamos muito tempo espalhando fake news. E dava para servir de Ombudsman de novela. Além da jarra de plástico de abacaxi, campeã de memória afetiva de 10 entre 10 famílias do subúrbio carioca, tinha também o encanto do tecido de circo da personagem da Nathalia Dill, a paixão pelo Divino Futebol Clube de Tufão e Jorginho, as coreografias maravilhosas de Cacau Protásio com uma vassoura, pedindo para você chamá-la de amendoim. Bons tempos.

E também tinha uma coisa deliciosa: a gente realmente ficava indignado com erro de lógica ou continuidade de novela. É bem mais saudável descer a lenha no autor do que naquele sobrinho que votou errado no primeiro turno e tirou seu candidato do páreo, certo?

Um desses deslizes antológicos em "Avenida Brasil" foi o fato de Nina, a protagonista de Débora Falabella, guardar fotos que incriminariam os vilões em um pen drive. Pen drive, em 2012? A gente até usava, sim. Mas não era bem o instrumento adequado. Tudo mundo caiu em cima. João Emmanuel Carneiro se defendeu: disse que era analfabeto digital e nem sabia direito do que estava falando.

O pen drive de Nina passou. Todo mundo se alfabetizou digitalmente e, agora, que ironia, a gente mal sabe ler sem uma tela grudada na testa. 12 anos depois, a TV vive batalhas inglórias para manter seu público ali colado —e usa o mesmo escritor em "Mania de Você", a trama atual das 21h. A vilã, veja só, também é a própria Adriana Esteves, agora no papel de Mércia.

Curioso: ela grava provas de crime em pen drive. Só que dessa vez, a brincadeira de João Emmanuel com a autorreferência não impacta tanto o público. Está todo mundo de cabeça baixa, as fotos estão salvas no iPhone, ninguém lembra onde guardou o HD de arquivos porque ninguém tem tempo de fuçar em HD nenhum. Passado? Que passado? Assim eu acabo perdendo a próxima trend.

O autor naufraga a piada depreciativa com o erro da década anterior e ninguém se dá conta. Que pena. São tempos em que a gente está tão ocupado apontando o dedo no nariz de quem pensa diferente que pouco observa além daquilo em que acreditamos. As jarras de abacaxi posam felizes em cena, mas solitárias.

Pior que na véspera do capítulo em que Mércia usa o pen drive, essa colunista nostálgica estava aqui às voltas com o objeto que guardava fotos daquele 2012. As imagens intactas em pastas bem organizadas, na segurança que nuvem nenhuma desfaz. Mergulhei nas roupas que usávamos, nas crianças que sorriam e, hoje, são adultas, nas câmeras digitais que carregávamos ainda. Ninguém de cabeça baixa, ninguém olhando para telas, os sorrisos vivos de quem está presente no momento e só precisava estar em casa na hora certa para ver as confusões do Divino, o bairro periférico do Rio onde se passava a confusão toda.

No ano seguinte, um 2013 que mudou o curso da nossa história, todo mundo foi para a rua lutar não só por R$ 0,20. Depois, aconteceu tanta coisa no país que eu custo a lembrar que novela eu assisti. Hoje, a moçada fuma um negócio parecido com o pen drive que guardava fotos há mais de uma década.

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"O que sinto por você é 'Amor de Mãe'", diz Adriana Esteves em cena para um concentrado Chay Suede que cai na gargalhada ao ouvir o nome da novela que ele fez na pandemia. João Emannuel segue costurando diálogos com referências que só abalam quem viveu o suficiente para lembrar. Memória de TV, a gente diz. Que bom que há quem escreva assim. Que bom que há ainda um ou outro ouvido atento para lembrar o que houve antes.

Pena que a gente deteriorou o próprio cérebro correndo atrás de —o que eu estava fazendo mesmo?

Sei lá o que me deu, mas parece que é saudade de um tempo que cabia no pen drive. Ou de Jorginho jogando aquela bola toda no meu Divino F.C. Vai saber.

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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