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Jayme Monjardim: 'Passaporte para a Liberdade' consolida minha carreira'
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Jayme Monjardim é daqueles diretores que a extensa carreira fala por si. Mas ele surpreende ao dizer que 'Passaporte para a Liberdade' (antes era "O Anjo de Hamburgo"), minissérie que tem sua assinatura, ainda sem data de estreia, é um divisor de águas na sua trajetória.
Talvez seja um dos momentos mais importantes da minha vida, porque foi muita dedicação, um trabalho muito difícil. Imagina a reconstituição da Segunda Guerra, na Alemanha, com aviões, bombardeios... Nem sei nem o que dizer sobre o que passei nesses meses todos. Mas estou muito feliz com o resultado", afirma o diretor, que está em fase de finalização e dublagem da minissérie.
Sim, dublagem. A minissérie é a primeira produção da TV Globo totalmente falada em inglês, e conta com a parceria da Sony Pictures Television (SPT). Uma porta imensa para o mercado internacional, além das novelas que já são vendidas para o exterior.
A gente podia fazer para o mercado brasileiro e, com certeza, teria muito sucesso. Mas acho que está na hora, inclusive, até atrasado, de a gente dar voos internacionais. Os Estúdios Globo têm que olhar pra frente pra buscar um reconhecimento mundial. Foi um acerto muito grande a escolha de "Passaporte para a Liberdade" para ser o primeiro projeto internacional da emissora, tendo como parceira a Sony. Acho que essa é uma obra de interesse mundial", analisa.
Na história, Aracy de Carvalho é uma brasileira que salvou a vida de centenas de judeus na Alemanha durante a 2ª Guerra Mundial. Era funcionária do consulado brasileiro em Hamburgo e casada com o vice-cônsul, Guimarães Rosa (se você está pensando no autor de "Grandes Sertões: Veredas", acertou). Mas Monjardim explica melhor:
Aracy é uma heroína, colocou sua vida em risco para salvar a de centenas de judeus do Holocausto. Ela burlava a lei, dava um jeito do cônsul assinar os passaportes sem perceber e, depois, incluía uma autorização para que os fugitivos pudessem viver permanentemente no Brasil. Por isso, entregava sempre a caneta dela para ele usar. Era tão destemida que subia em navio para colocar os judeus, os escondia em seu carro para passar pelos soldados nazistas. No Brasil, temos mais de 2 mil pessoas descendentes das famílias que foram salvas por Aracy", conta o diretor.
A propriedade com que Monjardim fala sobre a personagem foi adquirida durante os 4 anos em que se debruçou sobre o projeto, escrito por Mário Teixeira. Antes disso, o diretor confessa que nunca tinha ouvido falar de Aracy.
"Não tinha ideia de quem era. A família dela entrou em contato comigo dizendo que queria me contar a história dela. Fui até São Paulo e o encontro aconteceu em um escritório de advocacia deles. Me receberam Eduardo Tess, filho da Aracy, com mais de 80 anos, Eduardo Neto e Sophie, a bisneta dela. Quando terminaram de me contar a história, eu estava com uma lágrima nos meus olhos. 'Meu Deus do Céu, não acredito que vocês estão com uma história assim e nunca soubemos, o Brasil não sabia disso. O mundo não tinha conhecimento dessa história", diz, chocado.
Com o aval para tocar o projeto, Monjardim começou a rodar. Os três primeiros meses de gravação foram em Buenos Aires, já que o diretor encontrou tudo que precisava na cidade argentina.
Consegui adaptar em Buenos Aires porque a capital tem característica europeia muito forte, com grandes palácios. Mas em março tivemos que parar por conta da pandemia e eu já tinha 30% da minissérie rodada. Uma loucura. Parou tudo. Ficamos um ano com elenco internacional contratado. Em janeiro deste ano, fomos os primeiros a retomar os trabalhos nos Estúdios Globo e terminamos em maio. Foi uma loucura", lembra.
Com vários testes feitos dia sim, dia não, regras de distanciamento, acrílico para cenas de maior proximidade, muito álcool em gel, Monjardim finalizou o "Passaporte para a Liberdade" e se anima por ser o responsável por dirigir uma história que ninguém ouviu falar.
'Esta minissérie veio consolidar a minha carreira. Quero dar um show, eu faço questão de botar a seguinte marca: antes e depois de Aracy. Estou contando que a minissérie seja o cartão de visitas da TV Globo para o mundo, em termos de produção internacional, e que me abra um caminho muito grande e bem legal", torce o diretor.
'Eu sou a Aracy'
Na busca pelos protagonistas, Monjardim fala sobre as coincidências e a garra de Sophie Charlotte para dar vida a essa mulher.
Um dia, eu estava no corredor de um dos estúdios na Globo. Quando olhei pro final dele, estava Sophie olhando pra mim. Disse que queria falar comigo, veio apressando o passo, me abraçou e começou a chorar. 'Só vim te dizer uma coisa: eu sou a Aracy. Nasci em Hamburgo, falo alemão e minha mãe é alemã. Por favor, não tira Aracy de mim'. Só podia concordar, né", conta Monjardim
O diretor confessa sua admiração pela dedicação com que a atriz se jogou no projeto.
"É um personagem muito difícil, porque tem que ter uma altivez, já que Aracy enfrentava os soldados da SS e chegou a ser perseguida pela Gestapo. Tudo na minissérie é inspirado em fatos totalmente reais", garante ele, que tem mais de 20 mil documentos que a família dela cedeu, desde diário de guerra do Guimarães Rosa, passando pela documentação particular deles, até fotos de todas as épocas.
Já Rodrigo Lombardi fez o diretor ficar 'preocupado' se conseguiria viver sem ser Guimarães Rosa.
Lombardi é impressionante. Acho que até hoje ele ainda acha que é Guimarães. Está andando de óculos... Ele o incorporou muito bem, é trabalho de cair o queixo. Lombardi demonstrou nesta minissérie que ele é um ator internacional. Com certeza, esse trabalho vai abrir portas para ele que nem ele imagina", vislumbra Monjardim.
Na melhor idade para produzir
Monjardim fez este ano 65 e a disposição para o trabalho não arrefeceu nem um pouco com o tempo. Ele, inclusive, brinca com fato de Roberto Marinho ter começado a Globo com a mesma idade que a sua.
Se ele começou aos 65, então, estou no iniciozinho de um grande projeto (risos). Vivo para o meu trabalho, criar, dirigir, contar história é a alma da minha vida. Chegar com essa experiência, mas ter a certeza que ainda a gente quase não sabe de nada... maior alegria nesse momento é saber que tenho que reconstruir, refazer e repensar coisas novas. Se nós não tivermos essa visão, esse desejo de criar coisas novas, estaremos ferrados. Estou no auge do meu trabalho", afirma.
Ainda mais porque Monjardim viu o diagnóstico de câncer de próstata querer tirar o foco de sua vida. Isso foi há cinco anos, mas ele lembra como se fosse aquela fatídica consulta.
Quando o médico me deu o resultado, saí do consultório dele arrasado. É uma bomba atômica dentro de você. Fiquei assim por uma hora. Só a fé é capaz de tirar você desse lugar. Basta ir pra uma igreja, rezar e entender que você faz parte de um universo muito maior do que tudo isso e que se for o teu momento será. Se não for será resgatado.
Cinco anos depois, o diretor está muito bem, obrigada, e vê mudanças em seu modo de agir.
Foram cinco anos bem difíceis. A cada seis meses eu ficava tenso com o resultado dos exames. Mas agora, estou livre. Essa experiência e minha fé me fizeram um cara mais tranquilo, que começa a entender que tudo tem a sua hora. Sei que minha Santinha sempre me deu força, então, está bárbaro", conta ele, que é devoto de Nossa Senhora Aparecida, a ponto de ter construído uma pequena igreja para Ela.
Máquina de fazer projetos
Um dos grandes desejos de Monjardim está intimamente ligado a sua mãe, a cantora Maysa: é um museu em homenagem a ela, que será montado na casa em que ela adorava em Maricá, cidade da região metropolitana do Rio de Janeiro. Jayme ficou interessado pela projeto da prefeitura em fazer um circuito artístico na região, vendeu a casa para o município e se tornou curador do museu.
No planejamento, há até o uso de recursos de 3D, que o transformarão em um museu de sensações. Os totens dispostos pelo local permitirão que os visitantes acessem as músicas, até mesmo inéditas. A ideia é que o museu fique pronto até o final de 2022", conta o diretor.
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