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Marcelle Carvalho

REPORTAGEM

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'Não se fecha os olhos', diz Claudia Mauro sobre preconceitos de Helena

Claudia Mauro na pele de Helena: gordofóbica e cheia de preconceito com pessoas especiais - TV Globo/Divulgação
Claudia Mauro na pele de Helena: gordofóbica e cheia de preconceito com pessoas especiais Imagem: TV Globo/Divulgação

Colunista do UOL

06/01/2022 04h00

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Se a vida é feita de encontros e desencontros, a de Claudia Mauro está sendo de reencontros. Aos 12 anos, ela era uma das integrantes do grupo de teatro infantil Além da Lua, criado pelo irmão, André, e Lícia Manzo. Isso mesmo. A autora de "Um Lugar ao Sol" já foi atriz e, segundo Claudia, muito boa. Agora, aos 52, ela tem a oportunidade de reviver na TV, pela primeira vez, a parceria com a escritora. Na história, Claudia é Helena, mulher cozida no preconceito que dará dor de cabeça para o ex-marido, Paco (Otávio Müller), a filha, Mel (Samanta Quadrado), e a namorada do dublador, Nicole (Ana Baird).

Estreei como atriz no primeiro espetáculo que ela escreveu. Lícia era uma grande atriz, mas deixou para se dedicar a escrita. Fomos acompanhando o crescimento uma da outra em suas respectivas áreas, mas ainda não havia coincidido de trabalharmos juntas. Mas justamente no ano em que completei 40 anos de carreira surgiu a possibilidade de estar em 'Um Lugar ao Sol'", comemora Claudia, que gaiata, ainda faz graça com o nome da personagem:

Não fui Helena de Maneco, mas serei a da Lícia".

A atriz, figura fácil nas tramas de Manoel Carlos, pode até ter o mesmo nome das heroínas dele na história de Lícia Manzo, porém, não será como elas.

A chegada de Helena na trama será envolta em polêmicas. Ela não tem uma boa relação com Paco. Eles têm uma filha com Síndrome de Down, que é superprotegida pela mãe. Ela não acredita na independência da jovem e bate de frente com o ex, que é a favor da inclusão. É importante discutir o tema. Ainda há esse estigma de que a síndrome é um problema e não é. A própria Samanta é independente, casada, trabalha. Todos podem ter uma vida como nós temos", defende Cláudia.

Mas essa não é a única polêmica que Helena estará envolvida. A personagem é uma coach de emagrecimento e será contratada por Nicole. A princípio, elas não saberão que têm em comum Paco e ficarão até amigas. Porém, aos poucos, a gente vai perceber que, no fundo, ela é gordofóbica.

Ela foi gorda, emagreceu e se afastou de tudo deste universo, inclusive do casamento com um homem gordo. Helena acredita que gordura é uma doença, como o alcoolismo. Acha que quem está acima do peso não pode ser feliz. É lamentável que haja pessoas que pensem assim. Não podemos fechar os olhos. Ainda mais nos dias de hoje que existem vários movimentos que lutam para mudar a visão sobre padrões estéticos", afirma a atriz.

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Gabi (Carolina Oliveira) foi criada pela mãe preconceituosa Angélica, em 'Paginas da Vida'
Imagem: divulgação

Ser polêmica não é novidade para Claudia. Há 15 anos, em "Páginas da Vida" - em reprise no Viva! - a artista vivia a racista Angélica, que não tolerava a relação do ex com uma mulher negra, e criava a filha cheia de preconceitos contra a madrasta. Seria um déjà vu?

Elas têm o mesmo esse perfil preconceituoso. Acho que se 'Páginas da Vida' estivesse sendo exibia hoje, a repercussão desse tema seria ainda maior do que foi na época. É o que acredito que aconteça com as questões que serão levantadas com a chegada de Helena. Os movimentos contra gordofobia e contra o preconceito com as pessoas com deficiência estão bem fortes. Vai dar um burburinho", analisa Claudia.

Uma caminhada na escrita

A gente percebe que nem tendo vivido Maria de Nazaré, em "Jesus" (RecordTV), sua personagem anterior a Helena, salvou Claudia dos tipos carregados de pecados. Porém, foi de extrema importância para atravessar um momento difícil: o AVC de sua mãe, Yara. Inclusive, foi nela que a atriz se inspirou para escrever a peça "A Vida Passou Por Aqui", que completa cinco anos em cartaz (Teatro Petragold, no Leblon, Rio de Janeiro) e já lhe rendeu o prêmio "APTR 2017 de Melhor Texto".

Minha mãe era muito devota de Maria. Então, fazê-la teve um significado enorme para mim. Lembro que quando entrei no estúdio, fiquei toda arrepiada, porque senti que o papel era meu. Além de trazer toda essa força do feminino", acredita.

E foi com muita força que Claudia escreveu a peça e interpreta Silvia, inspirada em sua mãe. Personagem que, na sua visão, nunca deverá fazer outro parecido, tamanha a importância que foi para atriz. A montagem narra a amizade entre uma professora e artista plástica, que se recupera de um AVC, e um faxineiro de hábitos simples.

É uma mistura, tem minha mãe, meu pai, e esse amigo, que realmente existiu. A peça é uma catarse. Teve um homem que me disse que assistiu 54 vezes! As pessoas saem mexidas mesmo", constata.

O texto abriu a porteira para uma enxurrada de outros. Sabe aquela história dos reencontros que falamos lá no início? Claudia foi passou a ser procurada por velhos amigos, como Marcelo Serrado e Marcello Novaes, querendo que ela escrevesse para eles.

Escrevi junto com Serrado a peça 'Um Pai de Outro Mundo', em que ele fala sobre sua experiência de ser pai de uma menina e de gêmeos. Somos amigos desde meus 13 anos. O Depois, Novaes veio com um argumento pedindo que eu desenvolvesse um longa. Fiz com mais duas parceiras (Mirna Brasil e Portella, Isabelle Borges). Tem o título provisório 'Silenciado', será dirigido pelo Rogério Gomes, o Papinha, e trata-se de uma ficção científica. Novaes conheço desde os 14 anos e chegamos a dar uma namoradinha (risos)", conta.

Além disso, há a peça "Na Próxima Estação", que escreve para o marido, Paulo César Grande, e para Giuseppe Oristanio. E outra que tem Eduardo Galvão como homenageado. O ator era o melhor amigo de Claudia e morreu, ano passado, por complicações da covid-19. O que deixou a atriz e escritora no chão.

Foi uma perda que me dilacerou. Galvão era meu irmão, aquele amigo da vida. Perde-lo foi como levar mais uma rasteira da vida", emociona-se a atriz.

Então, durante uma videoconferência com outras amigas do ator, Claudia pensou em reunir todas em um tributo a Galvão. Nasceu o argumento da série "Ele Delas", que ela escreve com Mirna Brasil Portella, Isabelle Borges e Helena Lahis. A direção será de Luciano Sabino.

Foi uma choradeira danada na videoconferência. Estávamos arrasadas. Daí tive uma intuição: fazer a história do reencontro de seis amigas após a perda de um amigo em comum por covid. Elas voltam a estar juntas para jogarem as cinzas dele. A partir desse encontro, elas tem suas vidas transformadas", conta.

Além de Cláudia, as outras amigas em comum são as atrizes Helena Ranaldi, Helena Fernandes, Flávia Monteiro, Clara Garcia e Lúcia de Sá. O ator Eduardo Moscovis, também amigo de Claudia, fez a leitura dos textos como Galvão.

Mas brinco com elas que Galvão sempre dizia que amiga, amiga mesmo era eu. Eu era a única que podia passar pelada na frente dele que ele mandava vestir uma roupa (risos). Éramos mesmo irmãos", diz Claudia, que pensa em 10 episódios para série, já tem dois escritos, e já está em negociação com uma plataforma de streaming.

Uma coisa eu garanto: essa série sai de qualquer jeito esse ano. Pode esperar!", garante.