Rodrigo diz que foi vítima de racismo no BBB19 e explica por que não reagiu
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Um dos participantes mais marcantes do "BBB 19", o ator, diretor e cientista social Rodrigo França acaba de lançar um livro no qual reflete sobre a sua experiência de 78 dias confinado no reality show da Globo.
"Confinamentos & Afins", escrito em parceria com o jornalista Adalberto Neto, não cita em momento algum as palavras "BBB", "Globo", "Tiago Leifert", "Paula" ou "Hariany", mas fala exaustivamente sobre todos eles, com informações suficientes para entender as suas referências.
O livro, cujo subtítulo é "O olhar de um homem negro sobre resistência e representatividade", traz inúmeras reflexões de Rodrigo sobre o racismo estrutural impregnado na sociedade brasileira e como esta situação se refletiu no "BBB 19".
O ex-participante relembra várias situações vividas programa, diz que foi vítima de racismo e explica por que, apesar de sua militância contra a discriminação racial, não reagiu. Citando um texto que publiquei no UOL, no dia de sua eliminação, Saindo hoje, Rodrigo poderá esclarecer um mistério: o que foi fazer no BBB?, ele afirma que procurou ser verdadeiro, mas teve receio do impacto que causaria se contestasse os seus adversários.
Rodrigo reconhece que frustrou muitos espectadores ao não reagir. Mas explica: "Confesso que, aqui fora, já precisei erguer a voz algumas vezes, como recurso para ser respeitado, sim. Mas, no programa, eu sabia que, se fizesse isso, seria o 'preto raivoso', o 'cara perigoso', o 'bandido'."
Ele conta que, ao ser convidado por um "olheiro" para entrar no reality, foi informado que a Globo estava procurando alguém com as suas características: "Ele disse que eu tinha o perfil que eles procuravam - negro, professor e militante". A edição contou com cinco participantes negros, um recorde na história do programa.
Rodrigo conta que evitou conscientemente o conflito mesmo quando se sentiu ofendido por questões raciais. Ele menciona esta sua atitude em diferentes passagens do livro:
"Um dos participantes brancos teve a petulância de me chamar de 'negão'. Fiz uma cara de paisagem que foi uma das minhas marcas no programa para evitar falar o que muitos precisavam ouvir, e ele logo percebeu que eu não havia gostado."
A reclamação sobre o fato de roncar é lembrada no livro: "O ronco me transformou em uma espécie de ogro naquele programa. (...) O fato é que, logo na primeira noite naquele lugar, a minha presença incomodou até enquanto eu dormia. Durante a madrugada, fui atingido no rosto por um participante com um travesseiro. Ele reclamava do meu ronco."
"Tinha plena consciência de que não podia dizer, no horário nobre de um dos maiores canais de TV do mundo, que o criminoso não era eu, mas quem reclamava do meu ronco. Ninguém ia me entender, eu ia virar piada e, mais uma vez na vida, ouviria as palavras 'vitimismo' e 'mimimi' em uma mesma frase".
Numa boa síntese, ele observa: "Meu silêncio não foi covardia, foi economia de energia". E também observa: "Racismo não é entretenimento. Não dá para romantizar na televisão algo que exclui, diminui e mata diariamente".
A falsa acusação, provocada por um vídeo editado que circulou nas redes sociais, de que Rodrigo deu um beijo forçado em Rizia, marcou o participante. "Essa história toda me fez perder uma bolsa de doutorado", diz. E acrescenta que não desistiu de tomar medidas judiciais contra quem divulgou inicialmente o vídeo.
O ex-BBB dedica um bom espaço ao momento em que Paula, conversando com Hariany e Diego, disse ter medo de Rodrigo por ele ter contato "com esse negócio de Oxum" e disse: "Nosso Deus é mais forte".
"Eu poderia usar o termo intolerância religiosa, como muita gente opta em definir. Mas, para mim, quando uma pessoa é intolerante com uma religião de matriz africana, isso tem outro nome: racismo religioso", escreve.
Paula chegou a ser indiciada sob acusação de intolerância religiosa, mas a denúncia contra ela foi arquivada. "Mas irei até a última instância, por dever ancestral. Por compromisso com todo um povo de terreiro", escreve Rodrigo.
O ex-BBB compara a violência que sofreu por parte de Paula à violência que ela foi vítima por parte de Hariany: "Se por um lado a violência simbólica que sofri foi relativizada, por outro, a violência física contra uma participante que cometeu racismo contra mim foi totalmente levada em consideração e tratada com cautela. É regra do programa: quem agredir é expulso".
"Pode ser exagero meu, mas acredito que se eu chegasse ao ponto de empurrar alguém - o que nunca fiz na vida, nem bêbado, como foi o caso -, tenho certeza de que sairia de lá algemado e não teria uma segunda chance".
Rodrigo se ressente da postura do apresentador Tiago Leifert no dia em que foi eliminado, num paredão que contou também com Hariany e Carolina.
"O curioso, entretanto, foi ver que o apresentador, que agia como o juiz daquele debate, assumia a narrativa da dupla e me colocava em uma situação em que eu não tinha como me defender. E, mesmo que eu tentasse, seria em vão. A opinião do público já estava formada, graças à ajuda dele."
Sobre a forma como Leifert anunciou a vitória de Paula ("teve a audácia de ser imperfeita e a ousadia de ser real"), Rodrigo diz: "Com o cenário político do momento, achei que o resultado não poderia ser mais adequado. Mas daí a ser legitimado pelo condutor do reality ultrapassa todos os limites".
"Na casa, cheguei ao meu limite, mas não me alterei", diz. "O baixo nível ficou a cargo de outras pessoas. E uma delas foi campeã e exaltada no discurso final do programa, que destacou todas as atrocidades que ela proferiu como 'audácia' e 'ousadia'. Encarei isso como um desrespeito a mim e ao meu povo", escreve.
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