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Por que acordo entre Disney e Globo no streaming parece loucura, mas não é

Globo e Disney anunciaram acordo para coproduzir quatro filmes - Montagem sobre divulgação/Globo/Disney
Globo e Disney anunciaram acordo para coproduzir quatro filmes Imagem: Montagem sobre divulgação/Globo/Disney

Colunista do UOL

03/06/2023 04h00

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Disney e Globo anunciaram um acordo inédito e, para muitos, surpreendente: os dois grupos, que concorrem pela atenção do público brasileiro, vão se unir para coproduzir quatro filmes.

Em um primeiro momento, pode parecer que é a empresa dos Marinho que sairá ganhando da parceria. Só que, na prática, a Disney também tem muito a ganhar com a Globo — e essa união acontece em um momento crucial para os norte-americanos, no qual está em xeque o futuro do conglomerado no mercado de streaming de vídeo.

O que foi anunciado:

Disney e Globo vão produzir, juntas, quatro longas-metragens brasileiros. Os filmes serão lançados nos cinemas, um por ano. Depois, em uma segunda janela de exibição, serão disponibilizados simultaneamente no Globoplay e em uma das plataformas digitais dos norte-americanos (Disney+ ou Star+). Há a necessidade de o Cade, órgão que regula a livre concorrência, aprovar o acordo.

Os grupos vão compartilhar responsabilidades. Eles vão trabalhar juntos no marketing e na distribuição nos cinemas. Fora do Brasil, os títulos serão disponibilizados nos serviços de streaming da Disney. "Ganham o consumidor e os criadores", afirmou Erick Brêtas, diretor de Produtos Digitais e Canais Pagos da Globo, em comunicado.

Não foram divulgados mais detalhes. Não sabemos ainda quais são os produtores envolvidos, datas de lançamento, títulos, elencos, diretores e sinopses. Essas informações "serão anunciadas ao longo da vigência do contrato", afirmam as empresas.

Por que parceria com a Globo interessa para a Disney:

Em crise, a Disney cortou gastos sucessivamente e pisou no freio na sua produção para o streaming. Foram 7 mil funcionários demitidos, parte de um objetivo anunciado pelo CEO Bob Iger de economizar US$ 5,5 bilhões (R$ 27 bilhões), sendo US$ 3 bilhões (R$ 15 bilhões) apenas em conteúdo.

Disney já vê número de assinantes do streaming cair após as mudanças. O Disney+ perdeu 4 milhões de pagantes, sendo a maior parte decorrente da perda da transmissão do campeonato de críquete da Índia, mas não só - 300 mil assinaturas foram canceladas nos Estados Unidos e no Canadá, por exemplo.

Com menos conteúdo exclusivo, parceria com outros grupos vira estratégica. Buscando conteúdos para manter e reter assinantes, a Disney mira parceria com outros grupos, principalmente se eles forem de mercados isolados que não representem uma ameaça mundial. Se os parceiros operarem em lugares mais baratos, com uma moeda menos valorizada, é ainda melhor.

Disney+ e Star+ reforçarão o seu catálogo com produções exclusivas com o selo da Globo, famosa por sua excelência técnica. Há cada vez mais um apetite mundial por histórias que se passam fora dos Estados Unidos e, com a ajuda da Disney, o grupo brasileiro pode finalmente encontrar essa fórmula no formato longa-metragem.

Disney aproveitará conteúdo em 200 países diferentes. Já a Globo - por mais que receba por esses direitos internacionais - terá que dividir os filmes com a Disney no Brasil, o único lugar no qual a empresa dos Marinho é dominante.

Greve dos roteiristas e parcerias anteriores também pesaram

O sindicato dos roteiristas dos Estados Unidos está em greve e os efeitos da mobilização podem ser sentidos por anos. A paralisação adia o início de futuros projetos, além de atrapalhar muito o que já estava em andamento. Por isso, para contornar esses efeitos, os estúdios norte-americanos devem ampliar o volume de produções fora dos EUA. Ainda que os filmes com a Globo não sejam para agora, eles preenchem eventuais vácuos de programação no futuro.

O casamento dos dois grupos de mídia vem de longa data. Atualmente, a TV Globo possui os direitos de exibição dos longas da Disney na TV aberta, que são um grande trunfo na programação do canal. Além disso, essa exibição ajuda a Disney na promoção de eventuais continuações nos cinemas ou nas plataformas digitais.

É esse cenário todo que leva a uma situação inusitada: ainda que seja em benefício mutuo, é Mickey quem finalmente está se dando melhor em cima do Zé Carioca, e não o contrário. Quem diria!

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