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Streamings forçam reinvenção da TV a cabo, que mira em parcerias e pacotes

Enquanto streamings e gigantes de tecnologia se parecem cada vez mais com a velha TV a cabo, telecoms tentam se reinventar - Getty Images
Enquanto streamings e gigantes de tecnologia se parecem cada vez mais com a velha TV a cabo, telecoms tentam se reinventar Imagem: Getty Images

Colunista do UOL

07/06/2023 04h00

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Busca por uma reinvenção. Esse é o atual momento da TV paga, que há alguns anos passa por uma grande fuga de assinantes. Agora, empresas como Claro, Vivo e Sky buscam formas de remodelar seus negócios — seja por meio de parcerias com streamings, vendendo pacotes transmitidos pela internet ou até coproduzindo filmes.

Isso enquanto as empresas de tecnologia se aproximam cada vez mais do modelo das velhas telecoms.

O que acontece com a televisão por assinatura? O cenário é resultado não só do advento do vídeo sob demanda, mas também de pacotes vendidos por altos preços e de uma longa crise financeira. Nem o ápice da pandemia, com as pessoas em casa, mudou essa trajetória.

Se no auge desse mercado (em 2015) eram 19,8 milhões de assinantes, o número caiu para 13,4 milhões no mais recente levantamento, de março. Uma redução de 32,38%.

A Claro, líder do setor, vive uma sangria maior: perdeu 42,46% de sua base nesse período.

Quando olhamos para a audiência, o resultado é ainda mais desanimador. Só no último ano, o Kantar Ibope Media afirma que a retração foi de 20%. Ou seja, um em cada dez televisores parou de sintonizar os canais pagos.

A discussão não parece mais ser até onde "TV a cabo" pode ir, mas por quanto tempo ela permanecerá viável no atual molde. Pela primeira vez, surge no mercado um olhar pragmático para esse futuro.

"Nosso negócio principal não é TV por assinatura. O nosso principal é banda larga, móvel", minimiza Fernando Magalhães, diretor de Programação e Conteúdo da Claro, que segue com 43,8% do market share do setor.

A segunda colocada é a Sky, com 28,7%, seguida pela Oi (que está entrando em uma nova recuperação judicial), que tem 17,7%.

"A gente não está mais na estratégia do 'ah, acabou o mundo, a TV por assinatura acabou'. O que estamos fazendo é nos adaptar".

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Com Claro TV+, que tem transmissão via internet, televisão por assinatura se mistura com streaming
Imagem: reprodução/Claro

Caminhos para reinvenção

Entre as iniciativas dentro dessa nova realidade está a venda de TV pela internet, conhecida como IPTV. É por isso que a Vrio (dona da Sky) lançou o DGO - que é igualzinho à TV paga tradicional, mas é assinado e transmitido do mesmo jeito que a Netflix. Custa a partir de R$ 69,90 ao mês.

De forma tímida, a Vivo oferece algo semelhante, o Vivo Play. Sai por R$ 40 mensais no pacote básico.

A Claro também tem o seu, chamado Claro TV+. O serviço é acessado diretamente pelo navegador do computador, por um app ou por uma caixinha que conecta a televisão à internet. O preço é a partir de R$ 69,90 mensais.

Esse mercado não tem a mesma regulamentação que a televisão paga e não existe uma divulgação recorrente de seus números por parte da Anatel. Por isso, não temos como saber se ele cresce em ritmo o suficiente para conter a debandada do modelo tradicional.

Virando uma central de conteúdo

As companhias de telecomunicações também adotaram a estratégia de que se não pode vencê-los, junte-se a eles. Por meio delas, hoje é possível assinar Netflix, Globoplay, HBO Max e Paramount+, entre outras.

Ninguém precisa de uma operadora para ter uma plataforma de streaming. Há, no entanto, algumas comodidades ao ter o pacote, elas afirmam. Além de possíveis descontos, tudo passa a vir na mesma fatura.

É pouco para conquistar os consumidores, que podem buscar preços mais baratos e pacotes em outros lugares. Por isso, Fernando Magalhães afirma que a Claro tem outro atrativo.

"A gente chama de integração de metadados", conta. Por meio dela, todas as informações do conteúdo dos streamings ficam centralizadas na caixinha da empresa. Fica mais fácil buscar um filme, esteja onde ele estiver - seja Telecine, TNT, Netflix, ou Amazon Prime Video.

A questão é: será que a mudança de foco não veio tarde?

Empresas como Roku, Apple, Amazon e Google já oferecem alternativas do tipo. Elas também querem ser a porta de entrada para todos os streamings, facilitando a vida do usuário em um universo pulverizado.

Em vez de o usuário ter que navegar separadamente em cada plataforma, procurando o que assistir de forma independente, é oferecida uma espécie de janela inicial que reúne todos os serviços - que pode ou não ter curadoria humana ou de algoritmo. Em alguns casos, é possível assinar tudo em um só lugar, ou montar pacotes com descontos.

Na prática, as plataformas viraram canais e essas empresas fazem a mesma função das velhas operadoras. A diferença é que antes havia apenas três ou quatro concorrentes, já hoje as telecoms disputam espaço contra as gigantes do Vale do Silício.

"É óbvio que se você voltar dez anos atrás, há 15 anos, a TV por assinatura tinha o monopólio da entrega de conteúdo. Não tem mais, porque agora você tem essas plataformas", admite Magalhães.

Apple tv - reprodução/Apple - reprodução/Apple
App Apple TV é uma das iniciativas que quer ser a "porta de entrada" para todos os streamings
Imagem: reprodução/Apple

Produzindo filmes

Por enquanto, a estratégia vem dando certo para a Claro: a empresa saiu de um prejuízo bilionário em 2015 para ter, atualmente, lucro operacional. Parte desse dinheiro, por meio de incentivos fiscais, vem sendo reinvestido em coprodução de filmes no Brasil - tal qual faz a Netflix, por exemplo.

Hoje são 33 filmes de cinema que contam com recursos da operadora, em um investimento total de R$ 100 milhões. A lista inclui de tudo, mas há muitas cinebiografias em produção ou pré-produção - com nomes como Rita Lee, Mamonas Assassinas, Silvio Santos e Ayrton Senna.

Curiosamente, as operadoras de TV paga não podem financiar conteúdo exclusivo para as suas plataformas. É uma restrição imposta pela chamada Lei do Serviço de Acesso Condicionado, de 2011, que rege o setor.

A Netflix certamente conseguirá atrair assinantes com a próxima série sobre Senna, protagonizada por Gabriel Leone. Enquanto isso, a Claro, mesmo coproduzindo um outro longa-metragem sobre o tricampeão de Fórmula 1, não poderá alcançar o mesmo resultado.

Como vemos, até se reinventar é um desafio para quem veio de um mundo pré-streaming.

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