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Após anos de 'segredo', Netflix divulga dados para fugir de desconfiança

A Netflix foi por anos uma caixa opaca, ao menos em termos de audiência. A grande crítica da indústria do entretenimento, e de parte do público, sempre foi a falta de transparência do serviço de streaming. Agora, a empresa está se esforçando para encerrar com esse estigma - e lançou nesta semana um relatório semestral com seus filmes e séries mais vistos.

"Estamos nos tornando cada vez mais transparentes sobre o que as pessoas estão assistindo na Netflix", afirmou o co-CEO da companhia, Ted Sarandos, em coletiva de imprensa virtual que contou com a participação desta coluna de Splash.

O que mudou?

Além do top 10 semanal e das listas de conteúdos "mais populares", a Netflix passa a divulgar um ranking semestral com o que foi mais visto pelos usuários da plataforma, em âmbito global - chamado de "O que nós assistimos: um relatório de engajamento Netflix". O levantamento revelado neste mês de dezembro cobre o período entre janeiro e junho de 2023. "Leva tempo para compilar", defendeu-se Lauren Smith, vice-presidente de Estratégia e Análise.

Trata-se de um grande "planilhão", com mais de 18 mil títulos que foram vistos por no mínimo 50 mil horas - o que representa 99% das visualizações do serviço, de acordo com a empresa. No total, os dados compreendem 100 bilhões de horas assistidas. Não há uma auditoria externa. Para a imprensa, os executivos comentaram que essa é a métrica mais importante para eles, pois mede o engajamento (ou seja, o tempo que o assinante passa "grudado" na tela).

De acordo com o levantamento, "O Agente Noturno" foi a produção líder no primeiro semestre deste ano, com 821 milhões de horas. Em seguida ficaram a segunda temporada de "Ginny e Georgia", a coreana "A Lição" e "Wandinha".

O "planilhão" da Netflix: uma grande lista com o número de horas que cada temporada ou filme foram assistidos
O "planilhão" da Netflix: uma grande lista com o número de horas que cada temporada ou filme foram assistidos Imagem: Reprodução/Netflix

A lista mostra também a força do conteúdo em outras línguas: além de "A Lição", o top 10 da planilha traz "A Rainha do Tráfico", filmada em espanhol. Segundo a companhia, produções em língua não-inglesa geraram 30% das visualizações. Outra curiosidade é que 45% do que é produzido em inglês é acompanhado com legendas ou dublagem.

Os títulos licenciados - recentes ou antigos - continuam sendo uma importante fonte de audiência para a plataforma. Cerca de 45% das horas assistidas vêm de produções de outros grupos de mídia. A temporada de estreia de "Suits", lançada em 2011, foi vista por 129 milhões de horas, por exemplo. Já a primeira de "Manifest", de 2018 e na época produzida pela Universal, gerou outras 151 milhões.

"Em média, nossos usuários assistem a seis gêneros diferentes por mês. Neste relatório, os títulos mais assistidos são de mais de 12 gêneros diferentes", contou Lauren Smith.

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Sob pressão

A divulgação desta semana vem após duas grandes greves, a dos roteiristas e dos atores, que pararam Hollywood por cerca de seis meses. Entre as reivindicações dos sindicatos estava uma melhor divisão das receitas advindas do streaming, o que esbarra na caixa preta das plataformas. Há também uma desconfiança por parte de produtores e estúdios que licenciam conteúdo.

"No começo não era realmente do nosso interesse sermos transparentes, porque estávamos construindo um novo negócio, e também precisávamos de espaço para aprender. E nós não queríamos dar o caminho das pedras para os competidores", disse um sincero Ted Sarandos.

Seja como for, Sarandos defende que o novo relatório não veio de uma repentina crise de consciência, e que faz parte de um movimento que antecede às greves. "É um processo contínuo por vários anos, então não é motivado por nada diferente disso", garante. A empresa vinha testando outras formas de divulgar a audiência, principalmente por meio de rankings, que representam apenas recortes específicos.

Transparência total?

A resposta da Netflix - seja para as críticas, seja por uma busca interna - foi do 8 ao 80. A planilha divulgada agora é uma grande base de dados quase que crua, sem qualquer filtro.

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Por exemplo: uma série com muitos episódios tem tudo para ser mais assistida que um filme de duas horas, por motivos óbvios. O mesmo ocorre entre uma temporada regular de uma produção de TV aberta que foi licenciada, com seus 22 episódios, e uma minissérie de três capítulos. O levantamento também não leva em conta orçamentos, público-alvo, gênero, número de espectadores, país, região ou qualquer outra classificação pré-existente no mundo audiovisual.

Ted Sarandos, co-CEO da Netflix, durante evento em Cannes
Ted Sarandos, co-CEO da Netflix, durante evento em Cannes Imagem: Neilson Barnard/Getty Images

"Estes dados são os que usamos para conduzir o negócio. Esse é o exato conjunto de dados que estamos compartilhando com vocês", revelou o co-CEO.

É verdade: há alguns anos este colunista viu rankings internos da empresa com o engajamento dos assinantes, e eles se pareciam com o que está sendo revelado agora. No entanto, existem outras informações, que ainda não são públicas. "Nós divulgamos detalhes mais profundos para os nossos criadores", deixou escapar o executivo. Esse compartilhamento, vale lembrar, também é uma postura mais recente.

Resta saber se esse nível de transparência é o suficiente. Como visto, o tabelão da Netflix tem os seus problemas, e há uma dificuldade para comparar esses dados com a TV linear ou até mesmo com outros streamings. Fora que um relatório a cada seis meses parece pouco para saciar o interesse do resto do mercado.

No fim do dia, pode ser que a gigante do streaming tenha apenas instigado mais a nossa curiosidade.

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