Streaming com pé no Brasil desafia operadoras para ressuscitar a TV paga
Durante todo o ano de 2023, a TV por assinatura perdeu 16,8% de seus assinantes — uma queda de 2,3 milhões, chegando a 11,5 milhões de acessos. É bem menos que os quase 20 milhões que o modelo de distribuição alcançou no auge, em 2015. No entanto, esses números da Anatel contam apenas parte da história, e tem uma empresa chilena-brasileira que quer aproveitar esse momento de mudanças para desafiar as grandes Claro, Sky e Vivo.
"O número [da Anatel] é um pouco enganoso", esclarece Renato Svirsky, country manager da Zapping. "Não é que as pessoas não estão mais assistindo a TV: agora elas estão assistindo de outra forma".
É justamente nessa "outra forma" que a Zapping está apostando. Em termos técnicos, é o chamado vMVPD, sigla em inglês que quer dizer "distribuidor virtual de programação de vídeo multicanal". Na prática, é uma TV paga totalmente pela internet, via streaming, sem a necessidade de cabos e antenas. Para o usuário, basta abrir o app e mudar de canal para encontrar uma programação linear, como se fazia antigamente.
Operadoras tradicionais do setor estão incentivando essa migração, por meio dos produtos Sky+ e Claro TV+ — que já foram abordados nesta coluna. Ao mesmo tempo, muita gente deixou o formato para optar por plataformas sob demanda, como Netflix, Amazon Prime Video e Disney+. Ou foi para a pirataria das TV boxes.
"As pessoas não saíram [na TV paga] porque elas queriam tudo separadinho em diversos aplicativos, mas sim porque era muito caro", acredita Svirsky. Na visão da empresa, isso cria a oportunidade para um negócio menor, mais dinâmico, aproveitar o vácuo deixado pelas transformações.
A Zapping foi criada em setembro passado a partir da união entre a Guigo TV, cofundada há quatro anos por Renato Svirsky, e uma companhia chilena. De acordo com o executivo, a serviço está chegando aos 140 mil assinantes em toda a América Latina agora em março - e o objetivo é alcançar os 300 mil até o final de 2024. Desses, a meta é ter 100 mil no Brasil. Em termos de faturamento, o plano é pular dos R$ 100 milhões em 2023 para R$ 150 milhões neste ano.
Ainda que ambiciosa, a meta ainda coloca a empresa longe dos principais concorrentes do setor. Considerando apenas os dados do modelo tradicional, que são públicos, a Claro está em 5,3 milhões de lares, seguida pela Sky com 3,3 milhões e Oi com 1,5 milhão.
A favor da Zapping estão os novos tempos. A Claro, ainda sob os nomes NET e Multicanal, chegou no começo dos anos 1990 com o desafio de cabear todo o país — levando o Grupo Globo, então maior acionista, a contrair uma dívida milionária. O mesmo movimento causou muita dor de cabeça ao Grupo Abril, que era dono da TVA (hoje Vivo TV). Mesmo Sky e DirecTV, que não usavam cabos coaxiais, tiveram muitos gastos com satélites, antenas e transmissão.
Renato Svirsky informa que a startup investiu "apenas" R$ 2 milhões na operação brasileira — e, com isso, já está disponível em todo o território nacional, via internet.
'Zapeando'
Ao abrir o app do Zapping, o usuário se depara com um universo já conhecido. Sai de cena a tela cheia de opções do que assistir, formato introduzido pela Netflix, e entra em cena aquele formato tradicional, de mudar de canal e conferir uma programação linear e "ao vivo". "É a experiência que as pessoas já sabem. Quem nunca ficou perdido em carrosséis por horas e horas?", questiona Svirsky.
Isso não significa que seja apenas mais do mesmo. Uma das novidades exclusivas da plataforma, com potencial para impactar o setor, é o "Modo Turbo". Com essa opção ativada, o delay ("atraso") no sinal é reduzido, proporcionando uma experiência mais imediata. Ou seja, acaba com aquela história do seu vizinho comemorar o gol enquanto você está vendo a bola ainda no meio de campo.
O problema surge devido à divisão da transmissão em segmentos grandes, enviados aos dispositivos para prevenir travamentos e mensagens de "carregando" em conexões instáveis. Com o "Modo Turbo" ativado, a Zapping reduz esses segmentos, diminuindo o atraso, mas também sobrecarregando a infraestrutura - incluindo a do usuário. Assim, o resultado final depende da qualidade da conexão do assinante.
"A gente não controla a internet", esclarece o executivo. Porém, em condições ideais, o atraso pode ser reduzido de até um minuto para aproximadamente oito segundos. "Deixamos toda a infraestrutura preparada".
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Mais canais
Hoje, o Zapping tem uma grade de canais que fica atrás dos concorrentes. A plataforma conta com parcerias com as programadoras Disney, Globo, Band-Newco e Simba Content, trazendo emissoras como GloboNews, ESPN e Sportv. Falta, todavia, um grande nome: a Warner Bros. Discovery, de canais como Warner, HBO, TNT e Discovery Channel.
Questionado sobre a ausência, Renato Svirsky sorri. "Eu só posso anunciar as coisas quando tem o contrato assinado. Posso dizer que estamos bem próximos de novos canais nessa linha".
Para ter acesso ao pacote completo, com 90 emissoras e chamado Full, o assinante desembolsa R$ 109,90 ao mês. Telecine, Premiere, Combate e o BBB ao vivo custam ainda um adicional. As opções mais baratas, com 50 canais (quase todos eles abertos), valem R$ 14,90 (uma tela simultânea) ou R$ 19,90 (até cinco usuários ao mesmo tempo). "[É] Um preço mais barato para que as pessoas conheçam a experiência", afirma o executivo.
A estratégia difere bastante das opções de streaming de Claro e Sky. A primeira começa em R$ 69,90 mensais pelo app (incluindo 120 canais e a assinatura do Globoplay, além de milhares de conteúdos sob demanda), enquanto a segunda cobra R$ 89,90 (com 90 canais).
Todos os três, vale ressaltar, têm aplicativos para os principais celulares, tablets e smart TVs do mercado, além de serem acessados por navegadores de internet.
"Negociação de canais todo mundo faz, mas funcionalidades interativas não são todas que conseguem", garante Svirsky.
Uma coisa é certa: a maior diferença desta nova era da TV paga, via streaming, em comparação com a antiga é a facilidade de assinatura e cancelamento. Não são mais os contratos que nos prendem por 12 meses que garantem a sobrevivência, mas sim a fidelização através da qualidade do serviço oferecido. Melhor assim.
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