O 'apocalipse' da TV paga se aproxima? Entenda o que está acontecendo
Duas notícias deixaram Hollywood de cabelo em pé em agosto. A Warner Bros. Discovery, dona de um império histórico de canais pagos, aproveitou a divulgação de seu mais recente balanço financeiro para reduzir o valor de mercado de suas emissoras em US$ 9,1 bilhões (R$ 51,3 bilhões). Já a concorrente Paramount Global cortou US$ 6 bilhões (R$ 33,8 bilhões) da avaliação desse mesmo negócio.
Será esse o maior indício do "cabolipse", o tão comentado apocalipse da TV por assinatura? Sim e não.
A reavaliação das duas gigantes veio em um péssimo momento e ocorre também por conta de gestões ruins. A união entre Warner e Discovery, que reúne canais como CNN, Discovery Home and Health e Cartoon Network, afirma que cometeu um erro na precificação das propriedades. A perda de um dos pacotes da NBA, que era transmitida nos EUA em parte pela TNT, também pesou. Por conta dessa mudança, o balanço trimestral registrou um prejuízo de US$ 10 bilhões (R$ 56,3 bilhões). Wall Street esperava "apenas" US$ 542 milhões (R$ 3 bilhões).
A Paramount, que você reconhece por marcas como Nickelodeon e MTV, se aventurou no mesmo jogo perigoso. Curiosamente, a reavaliação ocorre logo depois do anúncio oficial da intenção de venda do grupo para a Skydance — e durante uma janela para ofertas de outros interessados, o que está gerando uma pequena guerra nos bastidores.
O fato é que as próprias programadoras esvaziaram o valor de seu produto. Nos EUA, principal mercado para a televisão por assinatura, preencheram a programação com os mesmos programas de sempre ou descaracterizaram alguns de seus canais. Por lá, a MTV chega a exibir 11 horas diárias da atração de comédia Ridiculousness, e outras nove do reality show Catfish.
Enquanto isso, aquele que na visão de muitos seria o substituto, o streaming, também patina entre a mídia tradicional. Disney+, Hulu e ESPN+ acumulam um prejuízo de US$ 7,1 milhões desde 2022.
"É difícil e caro para o programador produzir conteúdo novo constantemente, para manter essa fidelização do cliente", conta Ricardo Falcão, diretor da Claro. "Todo mundo achou que ia distribuir esse conteúdo diretamente e daria muito certo", afirma o executivo, que vê as operadoras em uma posição melhor para essa venda ao cliente final.
Ainda que o panorama financeiro não seja positivo, o Kantar Ibope, responsável pela mensuração da audiência em nosso país, não vê que a televisão por cabo ou satélite esteja minguando. "Os players estão se reinventando", afirmou Adriana Favaro, vice-presidente de Negócios da empresa, em entrevista à coluna em julho. A Anatel informou em abril que o modelo tradicional, seja por cabo ou satélite, representava apenas 13% dos acessos dos televisores no país.
Operadoras se movimentam
Se os grupos de mídia seguem encastelados, as operadoras estão modificando a sua forma de atuação para continuarem vivas.
Tanto Claro quanto Sky já possuem plataformas OTT: Claro TV+ e Sky+. O "over-the-top" é a transmissão diretamente pela internet, sem cabos, antenas e instalação de um técnico, diminuindo custos. E estão agregando a venda de streamings como Globoplay, Netflix e até Apple TV+ sem um custo adicional para o usuário final, ainda que esteja embutido na assinatura. O pagamento é feito a partir de uma distribuição de receitas, com parte do valor desembolsado pelo usuário indo para o grupo de mídia dono do serviço. Também é possível adicionar outras assinaturas, como do Paramount+, com descontos e na mesma fatura.
Na visão dessas empresas, está dando certo. Ainda que dados públicos no Brasil, divulgados pela Anatel, mostrem que a Claro perdeu cerca de 1,4 milhão de assinaturas "tradicionais" desde o lançamento do Claro TV+, a plataforma digital já alcançou um milhão de lares no mesmo período.
"O que perdemos hoje na TV paga tradicional, que é o número conhecido, a gente praticamente repõe no streaming", explica Falcão, da Claro. "Ainda não viramos a curva. A nossa expectativa é que isso aconteça no primeiro trimestre de 2025".
O Grupo Werthein, que atualmente é a dona da marca Sky no Brasil, informa que são mais de 2 milhões de assinantes quando somados o Sky+ e o DGO (disponível nos outros países latino-americanos). Recentemente, a companhia anunciou a entrada em um novo mercado, o do setor financeiro, com o Skx. "Não temos dúvidas que a agregação de valor à proposta que a Sky leva aos seus clientes é o caminho para aumentar a carteira. Facilitar a vida das famílias é um propósito concreto de negócio", diz Gustavo Fonseca, presidente da Sky no Brasil.
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SPLASH TV
Nossos colunistas comentam tudo o que acontece na TV. Aberta e fechada, no ar e nos bastidores. Sem moderação e com muita descontração.
Quero receberSeja como for, a visão do executivo é enfática: o televisor continuará sendo o principal meio de acesso à informação e entretenimento. Trata-se de uma questão de adaptação. "O futuro da TV paga está na convergência com as plataformas de streaming e na oferta de pacotes personalizados", complementa.
Como vimos, quem realmente está desaparecendo são os canais que marcaram época nos anos 1990 e 2000. O restante, sob novas siglas e nomes, encontra maneiras de se reinventar. Afinal, como aprendemos na geologia, nem tudo desapareceu com o fim dos dinossauros.
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