Com Trump, empresas de mídia perdem R$ 5,65 trilhões em valor de mercado
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Mark Zuckerberg (Meta), Jeff Bezos (Amazon), Elon Musk (X), Sundar Pichai (Google), Tim Cook (Apple), Shou Zi Chew (TikTok) e Sam Altman (OpenAI) estiveram presentes na posse do 47º presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, no fim de janeiro. Exatos dois meses depois, esses executivos têm menos motivos para sorrir.
De acordo com levantamento realizado pelo especialista Evan Shapiro, as grandes empresas de mídia e tecnologia perderam mais de 1,1 trilhão de dólares (cerca de R$ 5,65 trilhões) em valor de mercado desde que a gestão Trump iniciou uma série de medidas protecionistas para a economia norte-americana — ou "guerra comercial", como muitos preferem chamar. A soma total dessa correção é equivalente ao PIB (todos os bens e serviços produzidos em um país) da Holanda.
São taxações sobre importações de México, Canadá, China, União Europeia e até do Brasil em retaliação a países que, na visão do político, estariam "roubando" os americanos. Na percepção dos analistas, o atual governo busca um estímulo à produção local, o aumento das receitas por meio de impostos e, principalmente, o uso das taxas comerciais como instrumento de política internacional.
Independentemente dos motivos, as tarifas mais altas, aliadas a cortes no apoio fiscal e ao receio de uma reaceleração inflacionária, provocaram movimentações no mercado de ações. Os investidores dos EUA e do resto do mundo estão preocupados com o impacto da política nos conglomerados de mídia e tecnologia do país.
O recente levantamento de Evan Shapiro, ex-vice-presidente executivo da NBCUniversal e analista do setor que se intitula "cartógrafo do universo da mídia", compreende o período entre 3 de fevereiro e 16 de março — ou seja, após a "chacoalhada" causada pelo lançamento do DeepSeek, no final de janeiro.
Nesse ínterim, afirma o especialista, a guerra de impostos fez com que empresas como Netflix (-6%), Disney (-13%), Televisa (-10%) e Roku (-14%) perdessem valor na bolsa de valores, com uma queda de suas ações.
Grandes da tecnologia e redes sociais, como Alphabet (do Google, com 18% de perda), Meta (-13%) e Apple (-6%) também foram impactadas — exatamente aquelas dos CEOs na posse. Já o X, ex-Twitter, teve o capital fechado por Elon Musk, por isso não há números públicos. Considerando apenas as chamadas "big techs", as perdas foram de US$ 1,2 trilhão (R$ 6,8 trilhões).

Do outro lado da moeda, alguns conglomerados ficaram valorizados — reduzindo parcialmente as perdas gerais. Entre elas, as chinesas Alibaba (com valorização de 43%), Tencent (29%) e TCL (12%) e as japonesas Bandai (36%) e Nintendo (6%). Destoando, houve valorização das operadoras norte-americanas AT&T (10%), Verizon (9%) e a T-Mobile (que atua nos EUA e tem ações na bolsa local, mas é controlada por uma companhia alemã, com 7% de alta). Também sorriem o pessoal de Paramount (9%) e Lionsgate (20%), impulsionados por resultados trimestrais positivos.
Obviamente, o cenário particular de cada um desses grupos influência no valor de mercado, mas é inegável que o atual cenário mexeu com o humor de Wall Street — que está vendo novos riscos.
O caso da Netflix
A Netflix exemplifica muito desse atual momento. Em 2024, a companhia teve grandes resultados — muitos motivados pela cobrança no compartilhamento de senhas — e viu suas ações valorizarem 90% durante o ano. Nesse sentido, a queda de 6% no período da análise pode ser vista mais como uma rotineira correção de mercado dentro de um cenário macroeconômico desafiador.
Contudo, analistas de Wall Street se dividem. Dan Victor, da consultoria The Motley Fool, afirmou nesta semana que o ativo ainda é uma boa compra, considerando os resultados recentes e o catálogo que possui. A firma MoffettNathanson segue a mesma linha em nota ao seus clientes, acreditando que a gigante do streaming ainda tem espaço para crescer.
Já a concorrente Trefis Team publicou um artigo na Forbes afirmando que os papéis da Netflix podem cair entre 60% e 70% nos próximos meses. "Vemos vários riscos de curto prazo para a empresa devido às crescentes preocupações macroeconômicas nos EUA, após a imposição de tarifas do presidente Donald Trump sobre os principais parceiros comerciais e a possibilidade de menores adições de assinantes para a Netflix".
Os investidores devem se preocupar. Trefis Team, consultoria especializada em pesquisas de investimentos, em nota publicada na Forbes
Se a previsão se confirmar, será um tombo semelhante ao de 2022, quando um cenário de aumento de preços resultou em uma queda de 72,1% no valor de mercado da Netflix. A recuperação total ocorreu apenas em fevereiro de 2024.
Relação entre taxação e consumo
"Qual a relação entre impostos e os resultados da Netflix?", você deve estar se perguntando. Ela existe, sim, como explica a Trefis Team: "A incerteza econômica pode pesar sobre a Netflix, que é altamente dependente dos gastos do consumidor. As medidas tarifárias agressivas de Trump levantaram preocupações de que a inflação pode retornar. Tudo isso sugere que a economia dos EUA pode encontrar dificuldades significativas e até mesmo uma recessão".
O texto continua: "Na segunda-feira [11 de março], durante uma entrevista, o presidente não descartou a possibilidade de que novas tarifas possam desencadear uma recessão, fazendo com que o índice Nasdaq [que reúne papéis de alta tecnologia, telecomunicações, biotecnologia e outras áreas similares] caísse 4%".

A firma ainda menciona a guerra na Ucrânia e as tensões internacionais causadas justamente pela disputa tarifária. "Isso é claramente negativo para a Netflix, que depende de renda discricionária", disse a Trefis, fazendo referência ao dinheiro que sobra no orçamento das famílias após pagamento das despesas essenciais, como moradia e alimentação. Fora do cenário macroeconômico, o aumento nas despesas com conteúdo pela empresa também é visto com preocupação.
Nesse contexto, pesa a falta de diversificação da companhia. Há apenas dois grandes produtos: a venda de assinaturas e de espaço publicitário, ambos muito ligados a uma produção ou licenciamento constante e robusto de conteúdo.
Com suas particularidades, essa preocupação impacta outros conglomerados do entretenimento — explicando o panorama geral.
Um dos clichês da política é que governos são definidos pelos primeiros 100 dias de sua gestão. Faltando um pouco mais de um mês para Donald Trump completar esse prazo, o resultado para os bilionários e investidores da mídia e tecnologia é (até aqui) negativo — no bolso.
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