Precisamos das palavras certas: Paulo Guedes mente sobre leitores de livros
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Muitos setores da sociedade precisam fazer a tal autocrítica sobre a responsabilidade por este momento em que estamos metidos. Um desses setores é a imprensa. Parte considerável dos veículos jornalísticos passou anos tratando crimes e descalabros como meras declarações polêmicas. Depois, fizeram um esforço danado para fingir que todos os candidatos da última eleição à presidência compunham o espectro democrático, parecendo ignorar que um deles vivia de defender a ditadura e enaltecer torturadores, enquanto prometia dizimar adversários políticos. Agora, de novo, procuro e não encontro as palavras certas sendo utilizadas.
Paulo Guedes, ministro da Economia do governo Bolsonaro, mentiu (para ficar claro, esta é a palavra) sobre o perfil de quem lê livros no Brasil. Ao apresentar sua reforma tributária, Guedes defendeu que livro era produto consumido principalmente pela elite financeira do país e, por isso, deveria ser taxado. Encomendada pelo Itaú Cultural e o Instituto Pró-Livro, a 5ª edição pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, que acaba de ser divulgada, mostra o contrário.
Os dados, levantados pelo Ibope entre outubro de 2019 e janeiro deste ano, apontam: a maior parte dos leitores brasileiros se concentra na classe C, sendo que as classes D e E também apresentam números expressivos. Na comparação, 4% dos leitores de livros pertencem à classe A, 26% integram a classe B, 49% fazem parte da classe C e 21% estão nas classes D e E
Sigo o desfile com as informações que falam a língua de Paulo Guedes: o perfil de quem coloca a mão no bolso para comprar livros. A pesquisa apurou que 44,1 milhões de brasileiros têm o hábito de pagar por livros físicos e digitais. São eles os principais responsáveis por fazer girar a economia do setor. Desses 44,1 milhões de consumidores, 3 milhões pertencem à classe A, 14,3 milhões à classe B, 21,3 milhões à classe C e 5,6 milhões às classes D e E. Contrariando Guedes, a elite econômica talvez seja a fatia mais dispensável para que o mercado editorial volte a ter uma saúde minimamente razoável (classe B, apesar da sua SUV, você não é elite, tá!?)
Por conta do pretexto utilizado para meterem impostos sobre os livros, para este momento, esses são os dados mais relevantes apresentados pelo enorme e importante estudo. As informações, no entanto, trazem variações, não novidades. As pesquisas anteriores, publicadas em 2015 e 2011, já indicavam que a maior parte dos leitores brasileiros não se concentrava entre os mais abastados. Guedes não pode dizer que as novas estatísticas trouxeram uma reviravolta sobre o assunto, e até agora não o vi pedir desculpas ou apresentar justificativa razoável para o que afirmou.
Outros dados que têm a ver com o papo. Olhando para a renda familiar, a fatia que mais deixou de ler é a do povo que vive com mais de 10 salários mínimos, enquanto o pessoal que se vira com entre 2 a 5 salários mínimos foi o que menos largou mão da leitura. E o preço é fator decisivo para pelo menos 22% dos leitores brasileiros na hora de comprar um exemplar.
Seguirei com análises de outros pontos da pesquisa ao longo da semana. Por enquanto, pela recente falácia governista, é essa a primeira mensagem que precisa ser passada: livro não é coisa para rico, isso é uma mentira. E, para que as coisas fiquem claras, é importante utilizarmos as palavras corretas, elas estão aí para isso.
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