Racismo e brutalidade em Porto Alegre estão no centro de romances recentes
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A notícia chegou no final da noite de quinta e a indignação se espalhou pelo país na manhã desta sexta-feira: João Alberto Silveira Freitas, um homem negro de 40 anos, foi espancado até a morte por seguranças de uma unidade do Carrefour em Porto Alegre (mais uma brutalidade numa loja do Carrefour, diga-se).
Dois dos romances mais elogiados de nossa literatura recente retratam e problematizam o racismo brasileiro a partir de personagens profundamente ligados à capital gaúcha: "Marrom e Amarelo", de Paulo Scott (Alfaguara), lançado em 2019, e "O Avesso da Pele", de Jeferson Tenório (Companhia das Letras), publicado neste ano.
Já resenhei o de Scott. É mesmo um livraço que merece todos os elogios que vem recebendo - inclusive está na final do Prêmio Jabuti na categoria Romance. Nele acompanhamos a história de Federico e Lourenço, irmãos de mesmo pai e mãe que carregam na pele uma diferença que pode ser crucial neste país: um é negro, enquanto o outro é pardo. Levantar o debate sobre colorismo é um dos méritos da obra.
Numa narrativa que aborda a maneira como diferentes escalas de poder lidam (ou não) com o racismo, somos conduzidos por uma trama na qual o passado mal resolvido traz consequências drásticas para o presente. A sensação é que avanços significativos sempre são sucedidos por retrocessos lamentáveis provocados pelos monstros jamais combatidos de verdade.
É o autor de "Marrom e Amarelo" que oportunamente assina a orelha de "O Avesso da Pele". Destaco parte das palavras escritas por Scott sobre o romance de Tenório:
"Um narrador que investiga e refaz a trajetória dos pais, sobretudo do pai, num processo, um rito solitário, de tomada do protagonismo da sua própria vida - a vida de um homem inteligente e sensível, inquieto, abalado pelas fraturas existenciais da sua condição de negro em um país racista, um processo de dor, de acerto de contas, mas também de redenção e, dentro desta, de superação e liberdade".
O que motiva o protagonista nessa busca pelo passado da família é a morte do seu pai, assassinado por policiais numa "desastrosa abordagem" (sim, soa familiar). Se ainda não li a obra de Tenório para escrever sobre ela com mais profundidade, elogios de leitores confiáveis corroboram a posição do escritor como um dos nomes incontornáveis da literatura brasileira atual. O racismo, aliás, é um assunto que vem sendo muito bem discutido pelos nossos autores e autoras. [Atualização em 23/11: agora eu li, eis a resenha]
São referências para mais um dia em que tristeza e revolta se misturam.
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